O debate sobre juros e inflação

03/03/2017 às 15:20.
Atualizado em 16/11/2021 às 00:48

Quem se interessa por teoria econômica, mesmo não sendo economista, não pode deixar de acompanhar o interessantíssimo debate que está se desenrolando no jornal Valor Econômico. A questão central são os juros. E a coisa toda começou com um texto de André Lara Resende sobre a tese do americano John Cochrane, da universidade de Stanford, de que, no longo prazo, juro alto contribui para manter a inflação elevada. Na sequência, o próprio Cochrane foi entrevistado pelo jornal, e a partir de então uma série de economistas entraram na discussão, defendendo e rebatendo a tese, em artigos publicados no Valor e em outros jornais.

Vou resumir grosseiramente o que está sendo discutido só para despertar o interesse dos leitores dessa coluna. E também para eu poder dar um pequeno pitaco. Todos os artigos estão abertos no site do Valor também para não assinantes, com um link na home.

Não há lógica em tirar liquidez do mercado pelo simples fato de não haver liquidez no mercado

Como disse, a questão central são os juros. Cochrane desafia a máxima de que juro alto reduz inflação e defende que o efeito é justamente o oposto: a incerteza quanto ao equilíbrio fiscal gerada pelo juro alto faz a inflação permanecer alta no longo prazo. Municiados pela tese inovadora, vieram inicialmente os textos dos economistas críticos do conservadorismo radical do Banco Central brasileiro, que ainda mantém a mais alta taxa de juro do mundo. Na sequência vieram artigos em defesa da ortodoxia, justificada pela falta de solidez fiscal do governo brasileiro. Dizem estes últimos que a tese de Cochrane foi desenvolvida tomando por objeto de estudo apenas as economias avançadas da Europa e o combate à crise financeira mundial de 2008 com juro próximo de zero. Não seria aplicável a uma economia turbulenta e frágil como a brasileira.

Cito um destes, Armínio Fraga, que publicou em O Globo artigo no qual afirma que as incertezas e as fragilidades das contas públicas não permitem abandonar “um certo conservadorismo na prática da política monetária”. Escolhi citar o de Fraga porque ele reflete o pensamento conservador que domina o atual governo, com Ilan Goldfajn no BC e Henrique Meirelles na Fazenda. Antes desse artigo, Fraga publicou outro, também em O Globo, defendendo o arrocho fiscal e a política monetária contracionista.

Agora o meu pitaco. Conforme já afirmei, considero suicídio manter o maior juro do mundo no momento que enfrentamos a pior recessão e o maior rombo fiscal da história. Não há lógica em tirar liquidez do mercado pelo simples fato de não haver liquidez no mercado. Se temos ainda alguma inflação, ela está descolada de qualquer impacto dos juros por conta da inanição da economia.

Além disso, os preços estão sob controle. Se a inflação acumulada em 12 meses até janeiro ainda é de 5,35%, o índice de janeiro, de 0,38%, foi o mais baixo para o mês de toda a série histórica que teve início em 1979. E quando a inflação de janeiro é projetada para 2017, prevemos uma inflação para este ano de 4,6%, quase no centro da meta, que é de 4,5%. Mas, como a tendência é de queda continuada, muito provavelmente a inflação fechará o ano abaixo da meta.

A doença da nossa economia, hoje, não é inflação. É recessão. E o receituário neste caso é o contrário do que o que vem sendo aplicado. Injeção de liquidez, corte radical dos juros (da Selic e, principalmente, das taxas na ponta para empresas e consumidores) e retomada dos investimentos públicos.

O problema é que Temer e sua equipe não farão isso. Então...

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