Temer, o otimista

04/04/2017 às 20:28.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:00

O personagem encarnado ultimamente por Michel Temer é o do presidente otimista. Ele participou ontem da abertura do pomposo 4TH Bradesco’s Brazil Investment Forum, em São Paulo, um seminário para banqueiros. Desta vez, sua frase de efeito foi “O Brasil está de volta”. Para dar um pouco de substância ao discurso motivacional, citou quatro indicadores que confirmariam a reação econômica: venda de veículos, produção industrial, emprego e inflação. Vamos a eles para verificar se há, de fato, motivo para otimismo.

Mais realista seria apostar na desaceleração do ritmo da queda. Mas, ainda assim, queda

1 – Venda de veículos
Dados da Fenabrave (entidade que representa os concessionários das montadoras) divulgados na segunda-feira apontaram crescimento de 5,5% no emplacamento de veículos novos em março contra março de 2016, algo que não acontecia há 26 meses. O bom crescimento parece corroborar o fim da recessão, mas não é bem assim. O crescimento só foi possível porque as montadoras rifaram seus estoques num enorme saldão para clientes pessoa jurídica, como locadoras e frotistas em geral. A demanda do consumidor pessoa física continua em queda livre, com recuo de 7,1%, para 118 mil unidades. Enquanto isso, as vendas para empresas subiram 36,2%, para 71,2 mil unidades. O crescimento de março, portanto, foi artificialmente criado pelas montadoras. O setor continua mergulhado na crise e afundando.

2 – Produção industrial
Temer também mencionou o avanço de 1,4% da produção industrial de janeiro na comparação com janeiro de 2016, depois de 34 meses de queda continuada. Mas deixou de citar o recuo de 0,8% em fevereiro, conforme divulgado ontem pelo IBGE, e que frustrou o mercado. No acumulado em 12 meses, a produção da indústria acumula recuo de 4,8%. No vai e volta da produção industrial, ainda não se sabe para onde ela apontará. Mas, levando-se em consideração o desemprego, a perda de renda da população e o fechamento de todas as torneiras de crédito, não há motivos para se acreditar numa reação consistente. Mais realista seria apostar na desaceleração do ritmo de queda. Mas, ainda assim, queda.

3 – Emprego
Temer fez questão de ressaltar os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), de fevereiro, que apontam que as contratações superaram as demissões em 35.612 vagas. E destacou que foi a primeira vez em 22 meses que o país registrou abertura de postos de trabalho. Mas escondeu que no acumulado do primeiro bimestre o país ainda registra fechamento de 5.475 postos de trabalho. E que tanto o saldo positivo de fevereiro quanto o negativo do bimestre são gotas d’água no oceano do desemprego do país, que está em 13,2% e congrega um exército de 6,6 milhões de pessoas. Na Grande São Paulo, que reflete o drama do desemprego na indústria, a taxa de desocupação já atinge 17,9%.

4 – Inflação
E, por fim, Temer voltou a reforçar que inflação caminha para terminar o ano abaixo da meta de 4,5% e que a Selic deverá cair para um dígito. Nesse ponto Temer tem razão. Como reflexo da inanição da economia, a inflação está em queda livre e já se aproxima do perigoso limite da deflação. A desaceleração drástica da inflação e a deflação são fenômenos que quase sempre acompanham períodos de depressão, como o atual. Portanto, não devem ser utilizados como indicador de sustentação de qualquer raciocínio otimista para a economia. Além disso, a perspectiva de queda da taxa Selic para um dígito não significa nada para o consumidor final e para as empresas. No varejo, o custo do crédito continua subindo apesar dos recentes cortes da Selic, como mostram as pesquisas de juros da Anefac.

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