Trump e o Brasil

10/11/2016 às 11:59.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:36

Já li boas análises sobre o que o Brasil deve esperar com Trump. Mas um ponto passou despercebido por todos os analistas. Com Trump, a maior ameaça à economia brasileira virá da China e não dos EUA. Como o discurso protecionista do republicano é direcionado principalmente para a China e o México, são esses dois países que deverão perder a maior fatia do mercado americano. A China, que trata as exportações como política de estado, irá buscar novos mercados para seus produtos. E serão os emergentes os primeiros na linha de tiro, já que na Europa existe um teto natural que já foi atingido para os produtos de baixa qualidade vindos da China. Então, preparem-se para a nova onda da invasão chinesa. E nesse caso, ao contrário do que acontece com o aço brasileiro nos EUA, a imposição de barreiras seriam mais do que justificadas.

Com Trump, a maior ameaça à economia brasileira virá da China e não dos EUA

Barreiras dos EUA
Em conversa com um diretor de uma grande siderúrgica, uma mais afetadas pelas barreiras americanas ao aço brasileiro, ouvi a seguinte reclamação: “Falta ao Brasil mais de malandragem e jogo de cintura na área diplomática. É preciso fazer pressão por outras vias para se conseguir derrubar essas barreiras”.
Para ilustrar sua tese, ele lembrou uma pequena história que teria se passado na gestão de Francisco Dornelles no Ministério das Relações Exteriores do governo Fernando Henrique. Naquela época, as siderúrgicas brasileiras enfrentavam problema semelhante ao de hoje, com injustificadas barreiras tarifárias impostas pelos EUA ao aço.

Como forma de pressão, o governo brasileiro aumentou de uma tacada os impostos pagos na importação de produtos audiovisuais americanos. E fez chegar aos grandes estúdios de Hollywood a informação extra-oficial de que se tratava de uma retaliação às barreiras contra o aço. Por força da ligação estreita entre os executivos da indústria do cinema e Washington, as sobretarifas foram retiradas em menos de uma semana.

Independentemente do questionamento ético que a história possa gerar, o ocorrido mostra que não se pode ficar parado quando se trata de barreiras, principalmente as americanas. Os julgamentos no âmbito da OMC são sabidamente demorados e não preveem ressarcimento de perdas, mesmo se a acusação de dumping for julgada improcedente. Então, acusar é um excelente negócio para as siderúrgicas americanas. Mesmo que percam no tribunal da OMC, já ganharam durante o período em que vigoraram as barreiras preventivas.

Espertos
Nesse jogo de espertos, a acusação que criou as barreiras atuais veio das empresas AK Steel, Nucor, Steel Dynamics, United States Steel e ArcelorMittal. Contra o Brasil, pesa a acusação de que o “Reintegra”, o programa que recuperação de impostos indiretos incidentes na cadeia de produtos exportados, é um subsídio oferecido pelo governo federal às siderúrgicas, o que configuraria a prática de dumping. Mas não é verdade. Nenhum país do mundo exporta impostos e o Reintegra apenas devolve o que já foi pago pelas empresas exportadoras. Além disso, por conta da sanha tributária do atual governo, ele está limitado a apenas 2% da receita de exportação.

As barreiras vigoram desde março e não apenas para o Brasil. O aço brasileiro (aços planos, laminados a frio e a quente) pagam hoje uma sobretaxa de 38,9%. Já a China, um país pratica dumping da forma mais deslavada, foi penalizada com tarifa de 265,8%. Os demais países são Índia (6,8%), Japão (71,3%), Coreia do Sul (4,5%), Rússia (14,8%) e Reino Unido (28,0%).

Para sair dessa turma, uma pressão diplomática do governo brasileiro muitíssimo bem vinda. Até porque, depois da posse de Trump tudo pode ficar mais difícil.

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