Tudo certo, mas está esquisito

08/12/2016 às 14:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:59

O afastamento dos três promotores do Ministério Público, na última segunda-feira, responsáveis pela investigação do acidente da Samarco em Mariana, ocorrido em novembro do ano passado, seria entendido como um processo absolutamente normal, não fosse a conjunção de interesses para dar velocidade ao retorno das operações da empresa. Vamos por partes, já que os detalhes são importantes.

Os três afastados são o coordenador de Meio Ambiente do MPMG, Carlos Eduardo Ferreira Pinto, e os promotores na área ambiental Mauro Ellovitch e Marcos Paulo de Souza Miranda. Eles retornam para suas comarcas de origem, que são respectivamente Ribeirão das Neves, Igarapé e Santa Luzia. Eram reconhecidos pelo rigor com que conduziam as investigações.

O afastamento foi decidido pelo novo procurador-geral do Ministério Público, Antônio Sérgio Tonet, que também tomou posse na última segunda-feira. Tonet foi escolhido pelo governador Fernando Pimentel na lista tríplice de nomes indicados pelos membros MP. Ele ficou em segundo lugar na votação entre seus pares. É prerrogativa do novo procurador-geral escolher sua equipe de coordenadores, mas...

...mas Pimentel enfrenta uma situação de caixa dificílima, que ficou evidente com a decretação do estado de calamidade financeira, coincidentemente também na segunda-feira. Aumentar as receitas, hoje, é palavra de ordem. E a Samarco, mesmo com todas as isenções e benefícios fiscais previstos para a mineração, é uma importantíssima fonte de recursos para o Estado. O retorno da operação traria uma lufada de ar fresco para um governo sufocado financeiramente.

Já a Samarco está caminhando célere para o retorno das operações. A empresa está em processo de licenciamento de uma estrutura alternativa de deposição de rejeitos em substituição à barragem de Fundão, que se rompeu. Será usada a cava de uma mina, a Alegria Sul, com capacidade para receber materiais por dois anos e meio. Nos próximos dias 14 e 15, o projeto será apresentado em audiência pública nas cidades de Ouro Preto e Mariana, respectivamente. O licenciamento do uso da mina como depósito de rejeitos tramita na Secretaria de Meio Ambiente, juntamente com o chamado “licenciamento corretivo” de todas as outras estruturas operacionais da Samarco. A empresa acredita que poderá conseguir as licenças e voltar a operar no final do primeiro semestre do próximo ano ou início do segundo.

O MP não tem ingerência sobre esses licenciamentos, mas poderia, em tese, interferir e atrasar o processo. Um exemplo: os promotores afastados, são os mesmos que contestaram a eficiência do dique S4, em construção pela empresa para impedir que os rejeitos que cobriram o vale do Fundão continuassem sendo carreados para os rios da região. 

Ontem, em encontro com um pequeno grupo de jornalistas de economia, o diretor-presidente da Samarco, Roberto Carvalho, disse que o afastamento dos procuradores não interfere no relacionamento da empresa com o Ministério Público. Perguntado se os licenciamentos poderiam ser agilizados ou facilitados por conta das mudanças no MP, ele disse que não. “Existe um trâmite que não se consegue agilizar. Além disso, mudanças normalmente vem para pior, já que se perde o diálogo. Tem que construir de novo”, afirmou.

Ok, mas que três pedras foram tiradas do sapato da Samarco, isso não há dúvida. Foram também os promotores da área ambiental os responsáveis pelo relatório que acabou na denúncia das 22 pessoas (entre presidente, executivos, técnicos e representantes das empresas Vale, BHP Billiton no Conselho de Administração da Samarco) por homicídio qualificado com dolo eventual (quando se assume o risco de matar).

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