O fechamento do STF

16/11/2016 às 20:21.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:41

Da importância da Justiça para as sociedades civilizadas se pode tirar ideia positiva pelos momentos ásperos pelos quais passa o Brasil, sem se perder a visão do que acontece em outras nações. Na voz dos deserdados da sorte, dos que sofrem com os reveses cotidianos, vítimas de tragédias em todos os minutos, há sempre um grito: “Queremos Justiça”. 

Os tempos mudaram, como observou o desembargador Rogério Medeiros Garcia de Lima, orador oficial na solenidade de posse de seu colega Herbert Carneiro como presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em julho último. “A função de julgar, lembrou ele, é tão antiga quanto a própria sociedade. Por mais primitivo que seja um aglomerado humano, o choque de paixões e interesses gera desavenças, cuja solução é submetida a um juiz. No princípio ‘dizer o direito’ era obrigação do rei, ao qual cumpria editar, executar e declarar o direito. Esse quadro atingiu o Brasil colonial, até a elaboração do princípio da separação dos poderes”. 

No entanto, interesses múltiplos, nem sempre lícitos, levam à não obediência do princípio. A plena autonomia do Judiciário permanece como objetivo maior de uma nação que se preza. Rogério Medeiros lembra Floriano Peixoto, presidente da República. Em 1893, ao saber que o Supremo Tribunal Federal concedera habeas corpus a um opositor, o marechal de ferro comentou: “Eles concedem a ordem, mas depois procuram saber quem dará habeas corpus aos ministros do Supremo”. Uma ameaça não muito velada, como se vê, mas a que Corte não se curvou.

No momento que atravessamos, o Brasil se tem mantido harmônico em grande parte em função e por força do Judiciário, a despeito de equívocos amplamente divulgados pela Imprensa, fiscal do estado democrático de Direito.

Temos recente e forte a memória do regime militar implantado em 1964, cuja vigência ainda provoca discussão e embates e deve servir de advertência para os cidadãos na rigorosa observância de princípios de liberdade, aos quais não podemos abdicar, mas respeitar. Naqueles dias, houve arestas e atritos entre o Executivo e o Judiciário. Quando Castelo Branco – presidente, militar e democrata – visitou o Supremo Tribunal Federal (ocupantes do poder, então, se sentiam no dever de ir ao STF) ouviu-se o discurso do presidente da Corte, ministro Álvaro Ribeiro da Costa, uma peça digna e corajosa naquele instante. Disse: “A Justiça, quaisquer que sejam as circunstâncias políticas, não toma partido, não é a favor nem contra, não aplaude nem censura. Mantém-se equidistante, ininfluenciável pelos extremos da paixão política. Permanece estranha aos interesses que ditam os atos excepcionais do governo. Nosso poder de independência há de manter-se impermeável às injunções do momento, e acima de seus objetivos, quaisquer que se apresentem suas possibilidades de desafio às nossas resistências morais”.

Os tempos passaram, veio a Constituição de 1988, consagrou-se a autonomia do Poder Judiciário, essencial no período que a República vive. Nestas horas, a flama jurídica tem de manter-se altiva, movida pela ética, sem a qual a sociedade se arruína e o homem se avilta.

Volto aos fatos. Ainda no período militar, quando corriam notícias e boatos sobre ameaças ao Supremo Tribunal Federal, o próprio ministro Ribeiro da Costa afirmou: “Se mexerem no Supremo, fechá-lo-ei e entregarei sua chave ao presidente Castelo Branco”. 

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