Cracolândia - cena de terror em BH

11/10/2017 às 16:26.
Atualizado em 02/11/2021 às 23:11

Belo Horizonte convive hoje com ao menos quatro cracolândias já estabelecidas.

O crack se alastrou pelas grandes cidades nos últimos dez anos e tem feito vítimas cotidianamente. Na última semana, realizei uma reunião aberta de mandato e fiquei chocado com as informações oficiais: 17% dos usuários iniciaram o uso das drogas entre 5 e 11 anos de idade e mais de 70% antes dos 17.

Não se trata mais de discutir o problema do vício e uso do crack como algo que diz respeito ao outro – ele é um problema nosso e que se aproxima de cada uma das nossas famílias, em velocidade crescente. A incidência em ambientes familiares desestruturados é maior, realmente, mas o avanço vai atingir cada um de nós, em Belo Horizonte, nos próximos anos, se não for rompida esta situação de imobilismo.

De tudo o que me foi dito – e tenho de reconhecer que meu conhecimento do tema é ainda pouco profundo –, uma disputa irracional entre as correntes terapêuticas, que se propõem a auxiliar os viciados, tem colaborado para que recursos e esforços se percam antes de conseguirem atuar diretamente sobre o problema. E o envolvimento das famílias, da sociedade e do governo parece ser a única saída – mas quase obra de ficção científica a essa altura.

Se entidades, na lógica da caridade, distribuem comida, os usuários se instalam no seu entorno e o tráfico se organiza ali, desestruturando toda a região. Se não há essa ação, as pessoas passam fome e a violência tende inclusive a aumentar. Se o poder público atua com as forças de segurança, a acusação de truculência está sempre presente. Se apenas as equipes de saúde são acionadas, elas acabam não agindo com eficiência onde o tráfico impera... O problema parece não apenas ser insolúvel, como se realimenta da própria incapacidade do sistema de apresentar as soluções.

Ao final da reunião, fiz um compromisso com os presentes de chamar uma Audiência Pública com as autoridades envolvidas e entidades, a fim de tentar romper com essa paralisia. Mas fui bruscamente interrompido por um dos presentes: “Estou cansado dessas conversas de que vamos fazer reuniões... Não aguento mais gente engravatada, debaixo de ar condicionado, dizendo que vai resolver o problema que eles nem conhecem. Eu não acredito em político e desisti de esperar uma solução”.

Ele tem toda razão: eu também não acredito em políticos e estou cansado de esperar soluções. Bem fez ele, ex-usuário, que conhecendo o sofrimento por dentro, organizou sua clínica, sobrevivendo de colaboração de particulares, enquanto o Poder Público continua fingindo que não existem cracolândias em BH.

Vou fazer a audiência pública, mas a verdade é que as coisas só mudam quando tomamos a solução nas nossas mãos.

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