Minas: o reencontro com o crescimento

27/05/2016 às 16:44.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:37

A economia de Minas tem perdido o seu dinamismo ao longo dos últimos anos. Minas Gerais ainda não pode ser considerado um Estado desenvolvido no cenário nacional. Em 1985, a participação relativa do PIB do Estado em relação ao PIB do Brasil, a preços correntes, era de 9,61%. Sem ultrapassar a marca dos 10,0% nos anos seguintes, essa participação chega a apenas 9,2% atualmente. Da mesma forma, o PIB per capita de Minas, que representava 91,6% do PIB per capita do Brasil, chega a 90,9% em 2011. Ou seja, Minas Gerais está perdendo posição relativa nos indicadores do PIB da economia brasileira. Em 2015, já é o terceiro ano seguido que a economia de Minas cresce a taxas inferiores às do Brasil. O que fazer?

 No final dos anos 1960, a economia de Minas se encontrava relativamente estagnada. Cerca de 17% da população estadual migraram para outras regiões naquela década por falta de oportunidades econômicas para gerar renda e emprego. O Estado não era carente de potencialidades de crescimento. JK, quando Governador, melhorou sensivelmente a infraestrutura de energia elétrica e transporte do Estado. O nosso sistema educacional nos três níveis de ensino se destacava como um dos melhores do país. E a nossa base de recursos naturais renováveis e não renováveis era ampla e diversificada.

 Mas como dizia Celso Furtado, o desenvolvimento sustentável de uma região depende, fundamentalmente, da sua capacidade de organização social e política que se associa ao aumento da autonomia local para a tomada de decisões, ao aumento da capacidade para reter e reinvestir o excedente gerado pelo processo de crescimento local, a um processo de crescente inclusão social e a um processo permanente de conservação e preservação do ecossistema regional. Essa capacidade de organização social da região é o fator endógeno por excelência para transformar o crescimento econômico em desenvolvimento sustentável por meio de uma complexa malha de instituições e de agentes de desenvolvimento articulados por uma cultura regional e por um projeto político local.

 Ou seja, não bastava que Minas tivesse adequada infraestrutura econômica e destacadas potencialidades, pois esses fatores constituíam tão somente as condições necessárias, mas não suficientes para a arrancada (take-off) de um processo de crescimento. As condições suficientes se baseiam na ativação e na canalização das forças sociais e na melhoria da capacidade associativa e do exercício da iniciativa inovadora. Elas se manifestam quando, endogenamente, aflora uma energia capaz de estruturar recursos tangíveis (capital físico, capital natural) e intangíveis (capital social, capital humano e intelectual) que se encontravam latentes ou dispersos. Todas essas ideias e conceitos se estruturam operacionalmente num modelo de desenvolvimento endógeno tal como ocorreu em Minas no final dos anos 1960 e nos anos 1970.

 Um processo de desenvolvimento endógeno regional é concebido e implementado a partir da capacidade que dispõe determinada comunidade para a mobilização social e política de recursos humanos, materiais e institucionais. Passa, normalmente, por diversas etapas. Não é um processo que brota no terreno do conformismo, da apatia, da inércia ou da passividade dos habitantes de uma região onde uma dinâmica de organização social ainda não se faz presente. Não há desenvolvimento onde não há inconformismo com relação ao mau desempenho dos indicadores econômicos, sociais e de sustentabilidade ambiental. Assim, numa primeira etapa, é importante organizar a estruturação desse inconformismo.

 A etapa seguinte tem sido procurar diagnosticar, técnica e politicamente, as razões e as causas do mau desempenho desses indicadores. Não se trata apenas de preparar documentos elaborados por especialistas, mas, principalmente, de conscientizar as lideranças políticas e comunitárias sobre o que deve ser feito para transformar as condições atuais, visando a obter melhores índices de desenvolvimento humano, de competividade econômica, etc.
A terceira etapa envolve a transformação de uma agenda de mudanças em um plano de ação. Um plano que seja não somente tecnicamente consistente, mas essencialmente gerado a partir de uma intensa mobilização dos segmentos da sociedade civil, em regime de pacto e parceria com as autoridades e instituições locais e supralocais.

 Pode-se observar que, em geral, os projetos bem sucedidos de reformas e de mudanças nas cidades e nas regiões mais prósperas do país ocorreram em contextos que envolveram uma situação de expressiva endogenia no seu processo de desenvolvimento econômico e social. Ou seja, a forte presença de atores sociais (líderes políticos, empresariais, comunitários) na concepção e na condução das experiências de promoção do desenvolvimento, e não apenas o movimento de instituições e de agências externas à região que atuam de forma excludente quanto à relativa autonomia decisória local. 

 Nesse sentido, a etapa de desenho e de execução de uma agenda de mudanças econômicas e sociais em uma área fica na dependência da qualidade de suas lideranças políticas e comunitárias: o seu nível de consciência social, de conhecimento sistêmico, de capacidade de gestão administrativa, de negociação em situações de conflitos e de tensões; a sua capacidade de atrair recursos de instituições e agências localizadas em seu entorno externo de decisão; etc.

 O processo de desenvolvimento endógeno de Minas implementado a partir de 1968 até o final dos anos 1970 percorreu todas essas etapas. Foi elaborado o Diagnóstico da Economia Mineira em cinco volumes através de um tripé dos melhores talentos intelectuais e técnicos situados em Universidades, Burocracias e Associações Empresariais. Esse diagnóstico teve como escopo central identificar as potencialidades de crescimento da economia de Minas, delimitar os pontos de estrangulamento a serem superados para a sua mobilização e, principalmente, as reformas econômicas e institucionais indispensáveis para a sua implementação.

 Algumas realizações merecem destaque. Em primeiro lugar, foram criadas ou consolidadas as instituições que fizeram o desenvolvimento do Estado (BDMG, INDI, FJP, CDI, CETEC, EPAMIG, EMATER, etc.) as quais foram responsáveis para alavancar os capitais intangíveis que permitiram identificar as potencialidades da economia de Minas e ativá-las num contexto de competitividade dinâmica. O PIB de Minas passou a crescer em um ritmo invejável semelhante ao crescimento da China no século XXI e o Estado passou a ser a segunda economia mais dinâmica do país.

 Em segundo lugar, estruturou-se um sistema de planejamento com a assessoria de técnicos do ILPES/CEPAL da ONU e da empresa de consultoria ADL que foi responsável por muitos resultados relevantes para o nosso desenvolvimento, incluindo um sistema de incentivos fiscais e financeiros que atraiu mais de 400 projetos industriais para Minas (inclusive a FIAT), um sistema de pesquisas tecnológicas que viabilizou a exploração econômica dos cerrados e das várzeas irrigáveis, um sistema de promoção industrial das oportunidades de investimentos setoriais.

 Em terceiro lugar, o sistema de planejamento induziu as novas instituições a conceber e a implementar diversos projetos estruturantes de desenvolvimento de médio e de longo prazo: a adoção pioneira das primeiras experiências de planejamento participativo no Brasil a partir de 1975, a formulação e a execução do programa estadual de cidades de porte médio, o programa estadual de promoção da agricultura de baixa renda (um programa completo de reforma agrária para a agricultura familiar), projetos de urbanização de áreas periféricas de submoradias na RMBH, etc.

 O quadro atual da economia de Minas é desalentador. A situação do desemprego nas principais cidades do Estado  já começa a ficar crítica. O desemprego não pode ser visto apenas como uma questão dramática da perda de renda e das condições de vida que o poder aquisitivo favorece. O desemprego produz graves problemas de desequilíbrio emocional e psicológico entre os desempregados, com seus impactos na autoestima, na estrutura familiar e na esperança sobre o futuro do país e do Estado. Ocorre, porém, que a questão do desemprego vem crescendo em Minas nos últimos anos por falta de dinamismo de sua economia. É preciso, pois, conceber e implementar um novo ciclo de expansão para melhorar os nossos indicadores de emprego, de renda, de condições de vida da população.

 Um ciclo de expansão se caracteriza, em geral, por um período relativamente longo (em torno de uma década) de crescimento sustentado, com elevadas e generalizadas taxas de expansão global e setorial, o qual é precedido de um conjunto de reformas econômicas e institucionais, que viabilizam a eliminação dos pontos de estrangulamento e de outros óbices à mobilização das potencialidades de desenvolvimento econômico e social.

 Assim, um novo ciclo de expansão da economia de Minas deve ser concebido e implementado a partir da capacidade que dispõem nossas instituições para a mobilização das imensas potencialidades de desenvolvimento do Estado. Um ciclo que começa, pois, pela atualização, revitalização e dinamização de nossas instituições econômicas que, ultimamente, andaram perdendo status políticos, centralidade administrativa e capacidade de planejamento. Não bastam as medidas incrementais de ajustes que vêm sendo tomadas pelo governo estadual nos últimos anos. São necessárias políticas públicas, programas e projetos que gerem uma grande transformação econômica, social e institucional.

 Não basta atribuir os problemas de baixo crescimento e de desemprego em Minas à recessão econômica brasileira. É preciso endogenamente arquitetar o novo modelo de desenvolvimento sustentável tendo como fundamentos ideias renovadas, instituições revitalizadas e instrumentos e mecanismos reconstruídos do velho modelo que se exauriu.

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