De moto, na banheira de casa

20/04/2018 às 17:00.
Atualizado em 03/11/2021 às 02:27

O acidente registrado na madrugada de segunda-feira no bairro Santa Lúcia, em Belo Horizonte – se você não ficou sabendo, um motorista perdeu o controle de uma Porsche 911 GT2 RS, supermáquina com quase 700cv e que custa algo em torno de R$ 1,5 milhão e, sob suspeita de estar embriagado, abandonou o carro aberto e danificado –, me fez pensar sobre um aspecto curioso.

Nada tenho contra (muito antes pelo contrário) o fato de alguém gastar tamanha quantia em um objeto de desejo sobre quatro ou duas rodas, desde que, é claro, tenha obtido o dinheiro de modo honesto. Mas me parece cada vez mais uma loucura tal tipo de extravagância se o proprietário tem por objetivo aproveitar toda a cavalaria e o desempenho disponíveis. 

Nesse tipo de veículo, engatar a segunda marcha normalmente é sinônimo de já estar além da velocidade máxima permitida em qualquer rodovia, tanto mais que a cada dia elas se tornam mais povoadas de radares e fiscalização, como, aliás, deve ser o caso. Andar em nossas ruas remendadas, esburacadas e cheias de quebra-molas capazes de causar estragos no assoalho de esportivos que estão a poucos centímetros do chão, então, nem se fala.

É bem verdade que tem quem goste de simplesmente passear, no melhor sentido ostentação, como que mostrando aos pobres mortais como se está diante de algo inatingível e exclusivo. Ou tem quem prefira simplesmente manter seu bólido impecável na garagem de casa, tal qual obra de arte (e realmente são).

Mas como apaixonado por tudo que tem rodas e motor, ainda acho que o grande barato de ter tanto à disposição é poder aproveitar como se deve e chegar, se não aos limites do equipamento, cada vez mais inalcançáveis, ao menos aos próprios. Ou não faz sentido gastar fortunas – não sei se o leitor já atentou para o fato de que apenas o IPVA de um modelo do tipo é mais caro do que um carro popular.

O que nos traz a uma realidade que não é apenas brasileira, mas se repete em boa parte do mundo. Não por acaso as próprias fábricas (Ferrari e Porsche, principalmente) estimulam e organizam eventos em autódromos, onde há toda a estrutura e condição de acelerar com segurança sem riscos exagerados. Há ainda os track days e competições de aceleração em locais fechados (pistas de aeroportos, por exemplo). Neles é possível esmerilhar, espremer cada cavalo de um verdadeiro haras. Bem mais inteligente do que tentar fazer graça onde não se deve, pondo em perigo não só a própria integridade como também a de quem nada tem a ver com a história. O que me faz lembrar de uma frase de Nelson Piquet sobre andar nas ruas de Mônaco com um F-1. “É como andar numa moto esportiva na banheira de casa”. Lá até se justifica. Em outros lugares, eu diria que não...

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