É preciso democratizar o Judiciário brasileiro

21/03/2018 às 21:02.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:58

Finalmente, a presidenta do Supremo Tribunal Federal, Carmem Lúcia, pautou para esta quinta-feira o julgamento do habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Lula. Após muita pressão, interna no STF principalmente, Carmem Lúcia chegou a um nível de desgaste que, mesmo contrariada, acabou pautando. Só o fez, diante de uma quase rebelião de ministros, que chegaram a marcar uma reunião informal, convocada pelo decano Celso de Mello, para discutir o tema da prisão após decisão em segunda instância.

A decisão de Carmem Lúcia em pautar o HC de Lula, divulgada numa sessão do Supremo marcada pelo bate-boca entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, foi uma forma de impedir a já anunciada questão de ordem que seria suscitada pelo ministro Marco Aurélio de Mello, para que fossem pautadas as ADCs 43 e 44 (Ações Declaratórias de Constitucionalidade) que tratam da prisão depois da condenação em segunda instância. Elas estão prontas para votação desde dezembro e o próprio Marco Aurélio é o relator. Ou seja, ao invés de um caso específico, seria discutida a interpretação do STF para o tema. Ao pautar o HC, a presidenta do STF tenta constranger seus colegas, que preferiam decidir o assunto em tese, e não corporificado no ex-presidente.

As atitudes de Carmem Lúcia são a expressão da crise em que se encontra o Judiciário brasileiro, principalmente seu órgão máximo, o STF. Participou ativamente do golpe de Estado de 2016, como pode-se comprovar com uma grave denúncia apresentada na semana passada pela defesa do ex-presidente Lula. Ela demonstrou a interferência direta dos Estados Unidos na operação “Lava Jato”, feita à margem da lei e dos protocolos de cooperação internacional. Um vídeo exibe Kenneth Blanco, do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, falando sobre a cooperação baseada em “confiança” e por vezes fora dos “procedimentos oficiais”, realizada entre as autoridades norte-americanas e os procuradores da República da “Lava Jato”. Foi à partir desta relação que foram forjadas as “provas” que levaram à injusta condenação de Lula no caso do tríplex do Guarujá.

Mas não são apenas as instâncias superiores que levaram nosso Judiciário à esta situação de descrédito. Também na semana passada, o Brasil assistiu perplexo à uma paralisação de juízes em defesa do “auxílio moradia”. Juízes que têm salários que variam entre R$ 27 mil a R$ 33,7 mil, fora os inúmeros penduricalhos que fazem ultrapassar os 50 mil, querem incorporar mais de R$ 4.377 por mês para pagar aluguel, mesmo os que possuem vários imóveis próprios. Sozinho, esse valor é superior à renda de 90% da população.

Para reforçar a falta de credibilidade do Judiciário, ganhou notoriedade a postura da desembargadora de Justiça do Rio de Janeiro, Marília Castro Neves, que levantou calúnias contra a vereadora Marielle Franco, executada na última quarta. Ela já havia debochado da professora Débora Seabra, pelo fato dela ser a primeira portadora de síndrome de down a lecionar no país e postado comentários ofensivos em relação ao deputado federal Jean Wyllys.

Tais acontecimentos reforçam a convicção de que a estrutura e composição do Judiciário são conservadoras, autoritárias e antidemocráticas. O poder que deveria exercer protagonismo na defesa da democracia e dos direitos humanos, tem, de modo geral, agido decisivamente para o crescimento do Estado Policial. Precisamos resgatar a credibilidade do Judiciário e aproximá-lo de uma prática cidadã, com a introdução de cotas raciais, ouvidorias externas, controle social e eleições para os tribunais. O Brasil precisa de uma justiça que enxergue as injustiças sociais e contribua para a sua superação.
 

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