Aplicativo de pagamentos PicPay é 'transformado' em pirâmide financeira

Liziane Lopes
llopes@hojeemdia.com.br
27/07/2017 às 13:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:44
 (Maurício Vieira)

(Maurício Vieira)

Clique para ampliar

 
Se você ainda não recebeu um convite para ganhar dinheiro "divulgando" um aplicativo, prepare-se. Você pode ser o próximo a ser envolvido em um esquema de captação que parece inofensivo, mas que segue os mesmos princípios da pirâmide financeira. Nos últimos dias, têm surgido dezenas de grupos no Facebook, além de vídeos explicativos no YouTube, para atrair participantes mediante pequenas doações, que variam de R$ 1 até R$ 20, e a promessa de multiplicação de ganhos.

O esquema funciona da seguinte maneira. Primeiro o usuário é convidado a utilizar um aplicativo de pagamentos chamado PicPay, que permite ao usuário receber dinheiro ou transferir a qualquer pessoa que tenha uma conta no aplicativo, além de pagar a qualquer usuário ou estabelecimento conveniado. 

A empresa oferece um bônus de R$10 para quem baixa o app. Mas é preciso um código de acesso, geralmente cedido por um amigo.

Na formação da pirâmide, que usa o PicPay como ponto de partida, quem cede o código  "pede" para o amigo beneficiado o crédito desse bônus, uma retribuição ao código de acesso. E assim, o captador faz do app uma fonte de arrecadação.  "Dá pra ganhar de R$100 a R$150 reais por dia", afirma uma usuária em uma rede social.

A corrente começa a girar quando a pessoa que repassa o crédito recebido também se torna um divulgador e convida amigos para participarem, recomeçando o processo. Mas há versões mais sofisticadas e perigosas da pirâmide, em que captadores se utilizam das redes sociais para arregimentar novos usuários pedindo pequenas doações, R$ 5, R$ 10 ou R$ 20 em troca da promessa de ensinar a fazer dinheiro extra e fácil. 

 Reprodução/Facebook

 Nas redes sociais

).

).

No YouTube, os convites também se multiplicam, incluindo o passo a passo para fazer a transferência. "Quando você clicar no meu nome, você vai ter que pagar os dez reais pra poder ativar o seu código. Quanto mais amigos entrarem, mais dinheiro você vai ganhar."

Procurado pela reportagem, o PicPay informou que o usuário não precisa pagar R$10 pelo código de acesso e que os R$10 de bônus podem ser usados pela pessoa da forma que ela quiser, como é explicado na página do app na internet. O pedido de transferência de dinheiro ao captador nada tem a ver com a estratégia de divulgação do app.

O PicPay informou que é contra o uso da divulgação do aplicativo como uma pirâmide e que já tomou providências para evitar as doações. "Detectamos que alguns usuários estavam fazendo uso indevido desse método e, como essa campanha e os nossos serviços nunca tiveram como objetivo se tornar uma fonte de ganho de dinheiro fácil, adotamos algumas medidas para combater essas práticas como notificação e bloqueio dos perfis, limitação de compartilhamento do código promocional para até 03 amigos e sistema de monitoramento automático das conversas que identifica e apaga qualquer atividade que seja ilícita ou que, de alguma forma, prejudique a experiência dos usuários", informou.Reprodução/Facebook

Jeitinho para achar brechas

Apesar da recém-criada limitação do aplicativo para repasse do bônus de R$ 10 a apenas três amigos, muitos captadores ainda encontram brechas. "Eu combino com a pessoa que pode indicar três amigos de ela me emprestar o código (indicar) uma vez. Assim ela ganha R$20 e eu R$10", conta Guilherme Oliveira. 

Para os órgãos de defesa do consumidor, não há dúvida de que trata-se de fraude financeira. "Em cada era, elas (as pirâmides) mudam de nome, mas o esquema organizacional é o mesmo, chegar ao topo da pirâmide com o depósito de uma certa quantia para conseguir mais dinheiro em um curto espaço de tempo", afirma o coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa.

Já o advogado Bruno Lewer, membro da Comissão de Direito do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais, deixa claro que não há ilegalidade no uso do aplicativo ou em sua estratégia de divulgação, em si. "Nesse caso, o aplicativo não responde de forma nenhuma, caso alguém se sinta lesado e queira acionar a Justiça. A relação de consumo com aplicativo serve enquanto você usa o app dentro das regras que ele recomenda. Isso tem ficar muito claro para o consumidor, para que ele siga as regras do aplicativo", explica.

Ainda segundo o advogado, o problema é a forma como o aplicativo vem sendo utilizado. "Se há uma ilegalidade, uma pirâmide, ela está paralela à funcionalidade do aplicativo, as pessoas têm que ficar espertas com isso", conclui.

Como denunciar

Assim como acontece em toda pirâmide financeira, em algum momento não haverá novos participantes em volume suficiente para sustentar o esquema e os útlimos a entrar ficam no prejuízo. Situações que começam a ser relatadas nas redes sociais. "Deixa eu posta pq to sem dinheiro agr tou esperando meus patrocínios me doarem, aí quando eles doarem í as pessoas entrarem no meu grupo eu te pago 5" (sic), relata um usuário, que estaria justificando uma demora no pagamento.

O advogado Bruno Lewer esclarece que quem induz o outro a entrar em uma pirâmide ou mente para levar vantagem pode responder pelo crime de estelionato. E, no âmbito cível, pode ser condenado a reparar a vítima. Para denunciar esse tipo de fraude é preciso reunir documentos, que vão desde o número da conta do depósito até mensagens no celular. "Mas tudo deve estar registrado, e.mails, conversas de WhatsApp, a pessoa prometendo vantagem no anúncio no Face, os Tribunais já vêm aceitando isso. A pessoa deve fazer "print" de tudo, levar ao cartório e fazer uma ata notarial para que a documentação seja validada", esclarece.

Além dos órgãos de Defesa do Consumidor, as denúncias podem ser feitas ao Ministério Público Federal, Ministérios Públicos Estaduais, Polícias Civil e Federal. (Colaborou Nayara Soares)

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por