Câmbio prejudica exportações e empresas domésticas ainda patinam com a crise

Raul Mariano e Tatiana Moraes
primeiroplano@hojeemdia.com.br
19/10/2016 às 07:27.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:17
 (Yasuyoshi Chiba/ AFP)

(Yasuyoshi Chiba/ AFP)

A moeda brasileira é a que mais tem se fortalecido em um grupo de economias emergentes de mais de 20 países. O real valorizado, no entanto, bate de frente com as exportações, que acabam sendo menos (ou nada) rentáveis. Como o mercado interno está na corda bamba devido à crise econômica, sem opção, as indústrias patinam. Muitas demitem e, até mesmo, fecham as portas, como é o caso do setor de máquinas e equipamentos.

Desde abril, mês em que a Câmara dos Deputados autorizou a instauração do processo que destituiu a ex-presidente Dilma Rousseff, o real já cresceu 11,2% frente à moeda americana. Ou seja, ficou mais difícil exportar.

O fenômeno de valorização do real está ligado à percepção do mercado de que o país caminha para uma recuperação econômica. Há uma expectativa de que estrangeiros invistam no país, fator que impulsiona a cotação da moeda local.

Medidas como a aprovação em primeiro turno da PEC 241, que define o teto de gastos do governo nos próximos 20 anos, animam investidores que voltam a comprar reais, valorizando ainda mais a moeda brasileira. Além disso, projetos como a reforma da previdência, que sinalizam o esforço governamental para equacionar as contas públicas, são vistos com bons olhos pelo mercado.

O analista de mercado da Clear Investimentos Raphael Figueredo explica que o fortalecimento é mais evidente porque o real começou o ano enfraquecido em um contexto de economia completamente fragilizada.

“No início de 2016 havíamos perdido o grau de investimento de todas as agências internacionais. Por termos começado o ano em um nível tão baixo, esse crescimento fica mais expressivo agora”, explica.

Balança comercial
A alta do real, no entanto, pode prejudicar a balança comercial brasileira uma vez que torna os produtos fabricado no país mais caros para os compradores estrangeiros. A cotação de ontem, que fechou o dia na casa dos R$ 3,18, já pode ser negativa para empresas que exportam.

“Se (o real) continuar a se valorizar, possivelmente teríamos um primeiro trimestre ruim em 2017. Hoje a taxa de câmbio está no limite e não há como prever como isso vai se desenhar daqui pra frente, até porque esse limite varia de empresa para empresa. Mas um dólar na casa dos R$ 3,30 permitiria um equilíbrio para as empresas exportadoras”, avalia o consultor de negócios internacionais da Fiemg, Alexandre Brito.

No acumulado de janeiro a setembro, o Brasil registrou queda nas principais exportações. Soja, minério de ferro, carnes e café tiveram perda de participação, apesar de o saldo da balança no período ter sido superavitário em US$ 36 bilhões.

Segmento de bens de capital projeta retração de dois dígitos
A depreciação da moeda norte-americana frente ao real é cíclica, conforme afirma o vice-presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon-MG), Pedro Paulo Pettersen. Ele destaca que o fato de o Brasil ser um grande exportador de commodities, como minério, milho e café, acelera o processo de valorização do real. Somado a isto, o Brasil está aberto a receber investimentos externos, outro fator impulsiona a moeda local.

“No começo é uma sensação de aumento de poder de compra. A classe média começa a viajar, os produtos importados ficam mais baratos. Porém, é apenas uma sensação. Quando há alta do real sobre o dólar, as empresas não conseguem se manter e muitas fecham as portas”, afirma.

Ineficiência
Outro problema destacado pelo representante do Corecon-MG é o aumento do setor de serviços e o encolhimento da indústria. “Como o setor de serviços é menos produtivo no que diz respeito à prática, a economia fica menos eficiente”, diz.

Há, ainda, uma forte retração nas exportações. Afinal, ao embarcar produtos fica menor. Em contrapartida, as importações crescem a passos largos, impactando drasticamente a economia local. Como o mercado interno está comprometido devido à crise econômica, as vendas despencam. E a economia sofre.

“Tudo isso tem um custo alto. O Brasil é um país com mercado consumidor enorme. Temos que exportar mais minério para importar Iphones. Isso causa um desequilíbrio na balança comercial”, afirma Pettersen.

Bens de Capital
Um dos setores que mais teme a valorização do real é o de bens de capital. Conforme afirma o presidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos em Minas Gerais (Abimaq-MG), Marcelo Veneroso, a previsão para 2016 é de uma queda de dois dígitos no faturamento. A projeção tem como base o ano passado, que já foi ruim.

“Mais de 90% dos fabricantes nacionais têm concorrentes internacionais no Brasil. É uma concorrência desleal”, diz Veneroso.

Uma saída adotada por alguns fabricantes é interromper a produção e focar na revenda. Neste caso, o dano, conforme o vice-presidente do Corecon-MG é ainda maior. “O risco é levar o país a um cenário grave de desin-dustrialização”, alerta.

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