(LUCAS PRATES)
A decisão dos caminhoneiros de descumprir o acordo firmado entre o governo e parte dos representantes dos profissionais, na noite da última quinta-feira, levou ontem o presidente Michel Temer a endurecer o “jogo” e acionar as forças federais de segurança para desbloquear as rodovias no país e enfrentar desabastecimento.
Ele solicitou também a ajuda dos governadores e ingressou com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal (STF), com o mesmo objetivo, alegando que a categoria descumpre direitos constitucionais. Após a decisão de Temer, a Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam) pediu aos motoristas que liberem as estradas. Em Minas Gerais, houve confrontos em alguns dos 60 pontos de bloqueio.
O pronunciamento de Temer ocorreu na tarde de ontem, no Palácio do Planalto. “Não vamos permitir que a população fique sem os gêneros de primeira necessidade, que os hospitais fiquem sem insumos para salvar vidas e crianças fiquem sem escolas. Quem bloqueia estradas de maneira radical será responsabilizado. O governo tem, como tem sempre, a coragem de dialogar; agora terá coragem de usar sua autoridade em defesa do povo brasileiro”.
Temer disse ainda que uma “minoria radical” está impedindo que muitos caminhoneiros cumpram o acordo e voltem a transportar mercadorias. O presidente enfatizou que o governo atendeu às principais demandas da categoria. “O acordo está assinado e cumpri-lo é naturalmente a melhor alternativa. O governo espera e confia que cada caminhoneiro cumpra seu papel”.
A decisão de suspender a paralisação não foi unânime. Das 11 entidades do setor de transporte, na maioria caminhoneiros, que participaram do encontro, duas – a União Nacional dos Caminhoneiros (Unicam) e a Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), que representa 700 mil trabalhadores – recusaram a proposta.
No acordo fechado na quinta-feira ficou acertado que a Petrobras manteria reduzido os preços do diesel pelos próximos 30 dias. O governo estudaria também formas de baratear o preço dos combustíveis. As lideranças sindicais que assinaram o acordo prometeram suspender o movimento por 15 dias.
Ontem, a Abcam divulgou nota na qual afirma que, ao contrário de outras entidades “que se dizem representantes da categoria”, “não trairá os caminhoneiros”. “Continuaremos firmes com o pedido inicial: isenção da alíquota PIS/Cofins sobre o diesel, publicada no Diário Oficial da União”, diz o texto.
Na tarde de ontem, ministros e representantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) afirmaram que 45%dos pontos interditados já haviam sido liberados e que a situação da Refinaria Duque de Caxias (Reduq), no Rio de Janeiro, já havia sido normalizada.
Bloqueios
No inicio da noite de ontem, existiam ainda 519 bloqueios parciais, segundo o governo. Um deles, na BR-040, em Ribeirão das Neves, gerou conflitos entre manifestantes e a Polícia Militar.
De acordo com a PM, um grupo impedia a circulação de veículos nos dois lados da pista e passou a cobrar “pedágio” dos motoristas que pediam passagem. Além disso, pequenos furtos foram identificados no local. Cinco pessoas foram presas.
Ontem, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, informou que a Polícia Federal investiga se há a prática de locaute no país.
A medida estaria sendo adotada pelas empresas para impedir funcionários de trabalhar por conta dos interesses próprios e não de reivindicações da classe
Mesmo com decisão de Temer, caminhoneiros afirmam que vão resistir e manter paralisação
Nem o anúncio do presidente Michel Temer, que convocou a Força Nacional para conter a manifestação, conseguiu reduzir a determinação dos caminhoneiros, que lutam pela redução do preço do combustível. Entre os manifestantes, na tarde de ontem, era unânime o posicionamento de que o protesto só terminará quando as reivindicações forem atendidas.
Um dos autônomos que participavam do movimento na BR-381, em Betim, Lucas Lemos, de 32 anos, é de Agudo, no Rio Grande do Sul, mas passava por Minas Gerais e decidiu aderir à greve. Transportador de arroz e bobinas de aço, ele afirmou que os sindicatos que negociaram quinta-feira com o presidente Michel Temer não representam a categoria e que, ao contrário do que foi dito, os caminhoneiros autônomos não vão recuar até que as reivindicações sejam atendidas. “Se eles não têm dinheiro, que tirem dos seus próprios salários e benefícios. Quem aceitar menos que isso não nos representa”, disse.
Sobre o anúncio do governo de que usará as Forças Armadas para conter a manifestação, o caminhoneiro afirma que não há motivos para ter medo e que a intervenção não colocará fim aos protestos.
“Os militares vão dirigir os nossos caminhões? Porque vamos deixá-los desligados no meio da BR. Podem chamar os guinchos”, provocou.
Ailton Condé da Silva, de 53 anos, também engrossa o movimento. Além de caminhoneiro, ele é comerciante e produtor e já registrou um prejuízo de pelo menos R$ 6 mil por causa da paralisação.
“Eu vinha de Rodeiro, na Zona da Mata, e trazia 400 caixas de mexericas que seriam vendidas a R$ 15. Perdi toda a mercadoria”, relatou. Mesmo assim, Ailton achou melhor acompanhar os grevistas e lutar pela redução do preço do diesel. “Os caminhoneiros estão lutando por todos. Eu também não consigo pagar os altos preços cobrados pelo combustível. O trabalho se torna quase inviável”. (Repórter Rafaela Matias)