Cledorvino Belini: Fiat investirá R$ 7 bilhões em Minas até 2016

Bruno Poto - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
28/04/2014 às 07:20.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:19
 (Luiz Costa)

(Luiz Costa)

Cledorvino Belini é presidente da Fiat Automóveis desde 2004 e presidente do Grupo Fiat/Chrysler para a América Latina. Presidiu a Anfavea (Associação
Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) entre 2010 e abril de 2013. É formado em Administração de Empresas pela Universidade Mackenzie, com mestrado em Finanças pela USP. Integra o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o Conselho Superior Estratégico da Fiesp, o Conselho Estratégico da Fiemg e do International Advisory Board, da Fundação Dom Cabral.

É, também, presidente Conselho Deliberativo do Instituto Minas Pela Paz, organização da sociedade civil de interesse público criada a partir da
iniciativa da Fiemg e das maiores empresas do Estado com o objetivo de contribuir com o governo no combate à violência, redução da criminalidade e
promoção da inclusão social por meio da educação.

Na entrevista a seguir, o executivo, que hoje administra 14% do faturamento global do grupo Fiat e 24% da produção de veículos, analisa o mercado
automotivo, traça planos para o futuro e comenta sobre a polêmica gerada pela nova fábrica da Fiat no Brasil, que foi para Pernambuco.

Os engarrafamentos nas grandes cidades são um enorme problema. Como a Fiat encara o desafio da mobilidade urbana?
Indústria, governo e sociedade têm responsabilidade nisso. As montadoras devem produzir veículos mais seguros, mais amigáveis ambientalmente e antecipar anseios e desejos do consumidor. Conciliar tudo isso não é fácil, mas é o nosso desafio. De outro lado, tem a questão da movimentação propriamente dita dos veículos, e aí a responsabilidade é do Estado, de prover transporte de massa para que as ruas fiquem menos cheias. Vejo que há também um ponto de conscientização da sociedade. De todos os carros na rua, a maioria tem uma pessoa só, o motorista. Não dá. Se a gente conseguisse que tivessem duas pessoas em cada carro, reduziríamos a frota nas ruas pela metade. Aí entra a questão da carona solidária, horários flexíveis de trabalho, uma série de ações que a sociedade pode fazer para melhorar. O automóvel, que é de passeio, todo mundo usa a trabalho, porque não tem transporte de massa adequado. Isso vai desde BRT, metrô, monotrilho, e por aí. Há um atraso imenso em nosso país nessa
infraestrutura.

Qual sua sugestão para a falta de infraestrutura de transporte de massa?
Em infraestrutura, o Estado sozinho não consegue prover tudo. Precisa da iniciativa privada, e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) podem ser a solução
para rodovias, ferrovias e aeroportos em um caminho rápido e eficiente.

Qual experiência o senhor já viu nesse sentido de melhorar a mobilidade?
Tem uma coisa que funciona muito bem e existe na Europa. Lá, existe um automóvel para cada dois habitantes. Então, teoricamente, deveria ser um caos, pior do que aqui, mas não. Eles têm transporte de massa adequado e outra coisa: na Europa, de modo geral, o imposto da aquisição é baixo, para estimular todo mundo a ter carros novos, de última geração, amigáveis ambientalmente. Já os impostos do consumo são altos. O diesel e a gasolina têm preços muito altos, justamente para evitar que andem muito. E o imposto sobre a propriedade, que aqui vai caindo na medida em que o veículo vai ficando velho, lá, não. O imposto cai muito pouco, fica quase estável. Aqui se chega em uma situação em que um veículo de 10 anos quase não paga IPVA. Lá tem o imposto pesado, quase o mesmo do carro novo, o que estimula a renovação de frota. É um dos mecanismos que interfere na mobilidade, embora não seja ela em si.

A gestão pública da infraestrutura está jogando a indústria automotiva numa cilada?
Acho o seguinte: o Brasil tem um automóvel para cada cinco habitantes. Para se chegar ao nível europeu, de um para cada dois habitantes, faltam de 50 a 60
milhões de carros. Lógico que se colocar mais 60 milhões de automóveis no país com a falta de infraestrutura atual, para tudo. Por isso as coisas devem
caminhar em paralelo, com investimentos em metrô, BRT. Quando se olha as grandes metrópoles brasileiras, as coisas estão avançando, talvez não na velocidade que a gente gostaria, mas estamos dando alguns passos. Não vejo a mesma coisa nas estradas, por exemplo. Mas nas grandes cidades percebemos alguns movimentos.
 
Fábrica da Fiat em Betim (Foto: Leo Lara/Studio Cerri/Divulgação

Para a indústria, quais são os avanços?
O Brasil criou lei (Inovar Auto, novo regime automotivo) que incentiva a indústria automobilística a se instalar aqui, produzir aqui. Por isso, se vê
tantos novos players chegando. Há uma maior tributação se não se produzir aqui e, de outro lado, incentivos se fizer a engenharia aqui, com crédito presumido sobre os investimentos. Há alguns anos, estudos mostraram que vamos chegar a 2020 com um mercado interno entre 5 e 6 milhões de unidades (de vendas ao ano), mas ano passado não crescemos em relação a 2012, e neste ano acredito que vamos ficar igual ao ano passado. Vejo potencial na frente. Se temos 52% das famílias na classe C, se tem esse volume de pessoas que quer ter carro e casa. Vejo aí uma grande oportunidade. Não saberia precisar se em 2020 teremos 5 ou 6 milhões de veículos, mas os investimentos que fazemos é pensando nisso. Quatro e meio a 5 milhões é completamente factível.

Existe uma disparidade do preço do veículo no Brasil em comparação com outro países. A razão disso é só a tributação, ou margem de lucro também?
Margem de lucro, não. Em todos os países é preciso ter retorno do investimento, se não, o investimento vai para outro lugar. Temos o custo Brasil, o volume de impostos em cascata, o câmbio. E tem outro ponto muito importante, que é a produtividade. Uma empresa precisa, no Brasil, de 200 pessoas para cuidar da parte tributária e burocrática, enquanto nos estados Unidos precisa de uma. Sem contar que somos um país de dimensão continental, e temos que mandar produtos para o Nordeste, o Norte, até Manaus. Imagina o número de dias para chegar lá, com as condições das nossas estradas. Mando de caminhão porque não temos sistema de cabotagem eficiente. Caminhão vai cheio e volta vazio. Não temos malha ferroviária porque optamos pela rodoviária, o que é um custo a mais. E só o imposto responde por 37% do preço final de um carro popular.

Os carros brasileiros hoje estão preparados para reciclagem. Por que isso ainda não é realidade no país?
Começo pelos caminhões. É onde estão os maiores problemas de emissões. Caminhões de mais de 30 anos de uso, temos 800 mil no Brasil, e eles têm valor residual muito alto. Então, nenhum programa consegue dar estímulos para tirá-lo de circulação. No automóvel, é mais eficiente um programa de inspeção veícular do que formatar programas de incentivo à renovação de frota. A renovação se faz através da inspeção. Se está tudo em dia, você anda. Se não está, não anda. Este é o melhor sistema que tem. Isso já existe, está acontecendo. Principalmente a inspeção ambiental.

O Inovar Auto tem peso importante nessa demanda global por inovação?
Sim. Nós temos hoje mil engenheiros. Antes do programa, não tínhamos esse número. Foi um estimulo a desenvolver novos produtos, crescendo o setor de
engenharia com novos laboratórios e grupos dedicados à inovação para maximizar oportunidades dentro do Inovar Auto.

O que a Fiat planeja para Minas Gerais nos próximos anos?
Estamos com investimentos de R$ 7 bilhões (2012-2016). Fundamentalmente em modernização tecnológica e dos processos produtivos, além de investimento nas pessoas e novos produtos. Estamos construindo uma nova área de pintura que será a mais moderna da América Latina e também estamos investindo em robotização de várias áreas. Estamos dando um salto grande nesse sentido e também ampliando a capacidade produtiva, de 850 mil para 950 mil veículos em 2016. Só esse aumento de capacidade é maior do que a maioria das fábricas que estão se instalando no Brasil e do que a maioria que já estava aí. E quem faz 950 mil, faz 1 milhão. À medida que melhorar a renda per capita, sem dúvida, teremos maior mercado. E, como líderes de mercado, temos que estar preparados para isso.

Na direção oposta desse crescimento temos a lentidão do poder público de prover infraestrutura básica. A indústria pensa em viabilizar essas reformas em parceria para acelerar essas melhorias?
Não, a indústria faz sua parte, investe muito. Não entendemos que seja nossa missão esse trabalho. Entretanto, vejo que a sociedade demanda maior celeridade nesses processos. Veja Belo Horizonte: a Copa pode não ter trazido muita coisa, mas só o BRT já é um grande avanço para a mobilidade. Não tínhamos hotéis, agora toda esquina tem um. Tem muita coisa acontecendo que no dia a dia a gente não percebe. Entendo que esse processo é natural, de cobrança da sociedade, e poder público agindo com maior celeridade para prover essa infraestrutura.

Qual a reforma mais urgente para o Brasil?
Eu começaria pela educação. Demos um grande passo ao colocar todo mundo na escola. Agora temos que dar o salto da qualidade na educação, que permitirá aumento de produtividade, com pessoas melhor preparadas. Educação é infraestrutura. Mas também precisamos de reforma política, tributária, previdenciária e trabalhista.

Um assunto que gerou muita polêmica foi a ida da nova fábrica da Fiat para Pernambuco. Por que o investimento não foi feito em Minas Gerais?
Nós chegamos aqui a um limite máximo de capacidade. Não existe fábrica no mundo do tamanho da nossa, hoje, e ainda vamos para 950 mil veículos. Então, não tem como crescer mais. Há 35 anos, aqui era estratégico, mas hoje tem que ser ao lado do porto, para movimento de recebimento de materiais e expedição de veículos. Então, dois aspectos nos levaram a Pernambuco: primeiro, a questão logística, e segundo, os incentivos fiscais que existem lá. O mercado independe, porque os produtos de lá sairão daqui. O primeiro produto que vamos fazer lá é o Renegade, que é um brand jeep, que é uma outra realidade. Lá, é uma fábrica com um nível diferente daqui, porque nasce tecnologicamente atualizada. Por aqui, estamos fazendo a atualização.
 

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