Empreendedores mudam estratégias para tentar segurar clientela seleta

Tatiana Lagôa
tlagoa@hojeemdia.com.br
04/09/2016 às 07:42.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:41
 (LUCAS PRATES)

(LUCAS PRATES)

Que os pobres estão mais pobres é um fato conhecido e facilmente explicável pela conjunção do alto nível de desemprego com o aumento do custo de vida. Mas agora, com a longa crise, até os mais abastados tiveram redução no poder aquisitivo. E começaram a mudar os hábitos de consumo para tristeza do mercado de artigos mais seletos, que vivia tempos de glória até então.

Os maus ventos afetaram costumes como a troca constante de veículos, a substituição da casa por outra mais confortável, além da compra de joias, roupas e cervejas artesanais. 

“O que fez com que a classe A começasse a sentir a crise não é apenas a intensidade, mas a duração da recessão. É isso que tem feito com que os ricos reduzam ou posterguem aquisições”, afirma o professor de finanças da Fundação Dom Cabral, Breno de Campos.

Milionários
Não há um consenso entre a classificação de classes no país. Nem mesmo o IBGE possui uma definição exata sobre a renda mínima para alguém ser considerado “rico”. Mas dá para saber que a crise chegou ao topo da pirâmide observando a realidade dos milionários.

Uma pesquisa divulgada pela Capgemini, consultoria multinacional francesa, mostrou que o número de ricos e “ultra ricos” caiu 7,5% no Brasil em 2015 frente a 2014, ao passar de 161 mil para 149 mil. Os ricos aqui são aqueles com fortuna acima de US$ 1 milhão, sem contar propriedades, carros e obras de artes. Os ultra ricos têm mais de US$ 30 milhões.
Com a queda, o Brasil caiu da 16ª para 17ª posição no ranking dos países com mais milionários do mundo feito pela consultoria.

“Os milionários acabam sofrendo com a crise porque, muitos são empresários, e estão com resultados negativos neste ano, até mesmo demitindo”Breno de CamposProfessor de finanças FDC

Veículos
Diante desse cenário, a substituição do carro, marca registrada entre a classe A, tem se tornado menos frequente para alguns. 

Se em julho de 2015 foram emplacados 5.307 veículos importados no país, no mesmo mês deste ano, passou a ser apenas 3.337. Uma queda de 37% em apenas um ano, segundo dados da Associação Brasileira das Empresas Importadoras e Fabricantes de Veículos Automotores (Abeiva). 

Só os carros da marca BMW apresentaram sozinhos uma queda de vendas da ordem de 45,35% entre janeiro e julho de 2016 e o mesmo período de 2015, saindo de 3.510 para 1.918. A Land Rover também teve um desempenho bem negativo no país, com retração de 13,66% nos emplacamentos. A comercialização de veículos da marca caiu de 4.779 para 4.126 no mesmo período. 

“Como se não bastasse o segmento premium já estar afetado com a economia geral, as montadoras internacionais pararam de dar descontos nos veículos de entrada para atrair clientes como elas faziam no ano passado. Com os preços mais altos é que as vendas caíram mesmo”, afirma o consultor do setor, Milad Kalume Neto. 

“Antes a gente fazia só peças com diamantes, esmeraldas, safiras, enfim com pedras preciosas. Agora temos joias mais simples, que são cerca de 40% mais baratas. E sempre temos novidades para atrair clientes”Cláudia Kechichian

 
Segmento de moda intensifica contatos para bater metas

No segmento de modas, atrair clientes da classe A se tornou uma arte. Agora é preciso muito mais criatividade para vender do que quando a economia estava em franco crescimento. 

Na loja Mares (M&Guia), tradicional em Belo Horizonte, as vendedoras têm se ocupado mais em ligar para as clientes, mandar mensagens com fotos das coleções, e enviando peças para as residências. “Não deixamos de fazer estoques, de comprar peças no exterior e manter o atendimento exclusivo. Mas, com certeza, nós estamos trabalhando mais para bater as metas”, afirma a gerente geral da loja, Lelete dos Mares Guia. 

Na joalheria Manoel Bernardes, o esforço tem sido na criação de peças mais simples e, por isso, mais baratas. “Essa coleção de menor tamanho é voltada para o público mais jovem”, explica o proprietário, Manoel Bernardes. Até o momento, as vendas da loja caíram cerca de 5% frente ao ano passado.

As vendas de bebidas premium não chegaram a apresentar uma retração ainda. Mas seguem em um ritmo de crescimento menor do que nos anos anteriores. Segundo o presidente do Sindicato das Indústrias de Cerveja e Bebidas em Geral do Estado de Minas Gerais (Sindbebidas), Cristiano Lamêgo, a média de crescimento saiu dos 21% dos últimos cinco anos e segue na casa de 13% em 2016. “Em época de crise as pessoas procuram as cervejas mais baratas”, afirma. 

Construtoras têm oferecido descontos que chegam a até 15%

Diante de uma menor demanda de casas de luxo e super luxo, as construtoras que atuam em Minas Gerais estão fazendo até ações promocionais para vender. Muito conhecidas no mercado imobiliário que atende a baixa renda, as promoções agora chegam na ponta mais alta da pirâmide. 

“Houve uma paralisia no país por causa das questões políticas. A classe A teve a confiança afetada, além do bolso. São pessoas que não precisam mudar porque já moram bem. Como é mercado de reposição sempre dá para esperar”, afirma o vice-presidente da área imobiliária do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), José Francisco Couto de Araújo Cançado.

A dificuldade de vender imóveis de super luxo é tão grande que não houve nenhum lançamento com esse perfil em 2016, segundo dados do sindicato. Existe, inclusive, um estoque de imóveis lançados em 2011 que ainda não foi vendido. 

É o que abre mais espaço para negociações. Conforme Cançado, aumentou o número de pessoas que pedem descontos e que recorrem ao financiamento de imóveis de alto padrão. 

Levando em conta essa mudança de mercado, a Patrimar tem oferecido descontos entre 5% e 15% nos empreendimentos milionários. Um desconto considerável. “É melhor vender hoje a preços mais baixos do que pagar a manutenção dos apartamentos parados e sem garantia de que venderemos mais caro no futuro”, afirma o diretor comercial e de marketing da Patrimar, Lucas Couto.

Também para desovar o estoque, a RKM Engenharia está dando o projeto de decoração, que custaria algo em torno de R$ 20 mil, para as compras de apartamentos em um dos empreendimentos. O cliente tem ainda a chance de escolher o arquiteto, em uma lista de quatro renomados, desde que a aquisição seja feita até o dia 13 de setembro. A coordenadora de Marketing da empresa, Joana Prates, explica que o objetivo é apresentar um diferencial em um mercado cada vez mais concorrido. 

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