Indústria instala 1,5 mil robôs por ano e profissões deixam de existir

Estadão Conteúdo
14/08/2017 às 09:03.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:04
 (Fiat/Divulgação)

(Fiat/Divulgação)

Embora liderado pela indústria automobilística, o processo de robotização no País se espalha por outros setores, com destaque para as indústrias de alimentos e bebidas, eletroeletrônica e química. O uso de robôs em diversas etapas da produção é um importante passo para fazer parte da chamada Indústria 4.0, ou fábricas inteligentes, totalmente automatizadas, dizem executivos do setor.

"Até recentemente a robótica era considerada só pelas grandes multinacionais, mas agora começa a ser adotada também por médias e até pequenas empresas", diz José Rizzo, presidente da Associação Brasileira de Internet Industrial e da empresa de automação Pollux. "É o segmento tecnológico que mais cresce no mundo."

No Brasil, segundo ele, são instalados em média 1,5 mil robôs por ano, mas, embora seja um avanço em relação a períodos recentes, é um volume considerado ainda muito baixo em relação aos países mais desenvolvidos. "A instabilidade econômica inviabiliza investimentos e o custo de capital é elevado", justifica Rizzo.

Para Marcelo Cioffi, diretor da consultoria PricewaterhouseCoopers (PwC), o movimento que ocorre nas montadoras está relacionado a lançamentos dos chamados veículos globais (o mesmo produto em todos os países) e novas tecnologias que exigem a robotização.

"Com o mercado pressionado, a grande ociosidade em fábricas que receberam investimentos recentes e a situação econômica atual, acho difícil que ocorra neste momento uma nova onda de investimentos que leve a indústria brasileira a níveis mundiais", avalia Cioffi.

Atraso

Dados da Federação Internacional de Robótica (IFR, na sigla em inglês) mostram que na Coreia do Sul, país que lidera o processo de automação, há 531 robôs para cada grupo de 10 mil trabalhadores na indústria como um todo.

Em Cingapura, no Japão e na Alemanha, a proporção é superior a 300. Na China está em 49, mas com previsão de chegar a 150 até 2025. No Brasil, empresários do setor de automação avaliam que há apenas 10 robôs para cada 10 mil trabalhadores na indústria (ver quadro).
Na opinião de Rafael Paniagua, presidente da ABB, empresa de robótica com quatro unidades no Brasil, a baixa "densidade" de robôs no País "aponta diretamente para o crescimento desses equipamentos nos próximos anos".

A ABB importa robôs e faz adaptações, instalação e presta serviços de manutenção. A produção de robôs está concentrada basicamente no Japão, na Alemanha e na Suíça. A China entrou no ramo recentemente.

"É uma questão de custo-benefício", afirma Roberto Cortes, presidente da MAN Latin America, fabricante de caminhões e ônibus. "Depende da relação robô versus mão de obra."
A MAN, explica ele, produz caminhões "sob medida", ou seja, o cliente define boa parte das características do modelo que vai comprar. Não é uma linha contínua, onde a robotização é mais eficaz, afirma.

Atração turística

Segundo Cortes, quando a fábrica de Resende (RJ) foi inaugurada, em 1996, com o inovador sistema modular de produção (com fornecedores ao lado da linha de produção dos veículos), havia apenas dois robôs na área de pintura. "Era uma atração turística, todo mundo queria ver."

Só dez anos depois foram instalados mais 10 robôs na montagem de cabines e na própria pintura. "Nos próximos meses vamos dar um salto tecnológico com 40 novos robôs, elevando o número total para 52", informa Cortes. O investimento soma R$ 200 milhões.

A modernização será necessária para a produção de uma nova linha de caminhões globais que, diz o executivo, será chave para o processo de internacionalização da operação brasileira. "O novo processo produtivo será mais eficiente, mais produtivo, com mais rapidez e praticamente erro zero", diz Cortes, sem dar detalhes do novo produto.

Produtividade

Celso Placeres, diretor da Volkswagen, ressalta as vantagens da robotização, como flexibilidade para fazer diferentes modelos em uma mesma linha sem riscos de troca de peças, garantia de qualidade e eficiência. O robô, por exemplo, "avisa" se há algum defeito no ponto de solda. O que opera na armação identifica se alguma medida da carroceria está fora da tolerância.

Placeres lembra que o avanço tecnológico não ocorre só com a robotização, mas também com um processo contínuo de digitalização. Um sistema simples, criado na própria fábrica, acende uma luz vermelha de alerta se o trabalhador colocar a mão na caixa errada para pegar peças indicadas pelo sistema digital para o carro que passa na linha.

As empresas não revelam os ganhos de produtividade com a robotização. A Pollux, criada no Brasil há 20 anos, comercializou 200 robôs nos últimos 2,5 anos, a maioria para atividades leves. No período, dobrou seu faturamento para R$ 60 milhões e passou a atuar com a locação de robôs.

"Em vez de gastar R$ 400 mil na compra, é possível locar um robô por R$ 8 mil a R$ 9 mil por mês e garantia de assistência", informa Rizzo.

'Profissões deixam de existir, mas surgem outras', diz consultor

O efeito real sobre o impacto da robotização no número de empregos é incerto. Defensores do processo, visto como irreversível, afirmam que diversas profissões vão desaparecer, mas outras surgirão, a exemplo do que ocorreu nas revoluções industriais anteriores.

"Em países com maior índice de robotização, como Coreia, Cingapura, Japão e Alemanha, a taxa de desemprego é baixa", diz o presidente da ABB no Brasil, Rafael Paniagua. De acordo com dados de 2015 e 2016, nesses países o desemprego varia de 2,2% a 6,1% da população economicamente ativa (ver quadro acima). O Brasil, apesar do baixo índice de robotização, registrou taxa de desemprego de 11,6% em 2016, decorrente em boa parte da crise econômica.

"Estamos vivendo o desemprego conjuntural, mas a reorganização do processo produtivo também terá impacto no desemprego estrutural", afirma o secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Aroaldo Oliveira da Silva. Ele reconhece, porém, que se o Brasil não acompanhar a transformação industrial muitas empresas podem levar a produção para outro local. "Na Alemanha, onde nasceu a Indústria 4.0, sindicatos e governo buscam intensificar a qualificação dos trabalhadores; no Brasil ainda não vemos essa preocupação por parte do governo."

Para Marcelo Cioffi, da PwC, é certo que o mercado de trabalho será impactado, mas ao longo dos anos haverá uma acomodação. "Novas tecnologias promovem mudanças no mundo todo e profissões deixam de existir, mas outras surgem." O Brasil levará um bom tempo até essa etapa. Para ele, uma onda consistente de robotização pressupõe altos investimentos e, no momento, a maioria das empresas não está preparada para essa mudança radical. "Além disso, embora alto, o custo da mão de obra brasileira ainda é menor do que em muitos países e, por isso, vários processos de automação devem ser postergados."

José Rizzo, presidente da Associação Brasileira de Internet Industrial, defende uma mobilização entre empresas, governo e sociedade para qualificar as pessoas e facilitar o empreendedorismo. "É preciso repensar a forma de ensino e facilitar a criação de empresas de tecnologia".

Para Rizzo, ainda que parte dos funcionários perca o emprego, a automação vai salvar as vagas de quem ficar. "As empresas hoje avaliam quão viável é manter a operação em um país; se não for, levam para outro e todas as vagas são perdidas."

Novos postos

Na MAN, fabricante de caminhões da marca Volkswagen e onde o uso de robôs será quadruplicado, não haverá cortes. "Pode até haver contratação", diz o presidente da empresa, Roberto Cortes. Para ele, o novo processo produtivo e a nova linha de produtos ajudarão nas exportações, o que pode exigir mais mão de obra. A meta é ampliar de 15% para 30% a produção para o mercado externo. 
 

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