Eleições americanas: o que o Brasil ganha ou perde com a disputa entre Hillary e Trump

Bruno Moreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
08/11/2016 às 08:01.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:34

Especialistas ouvidos pelo Hoje em Dia sobre as eleições presidenciais americanas, que acontecem hoje, não são unânimes em apontar qual dos dois candidatos seria o melhor para as relações econômicas e diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos – se a democrata Hillary Clinton ou o republicano Donald Trump. Afirmam, porém, que Trump traz mais incertezas, enquanto Hillary representa continuidade do que se viu nos dois governos de Barack Obama.

Apesar de as relações diplomáticas entre os dois países terem se dado em nível alto, o que ficou evidenciado quando Barack Obama se referiu a Lula como “o cara”, a participação dos EUA na balança comercial brasileira diminuiu significativamente na última década.

Em 2015, o Brasil exportou US$ 26,47 bilhões para os EUA, o que representou 15,4% de tudo o que o país vendeu para fora. Em 2002 o valor era menor, de US$ 15,37 bilhões, mas a proporção para o total das exportações era bem maior, de 25,4%.

Os especialistas ouvidos avaliam que é possível aumentar o comércio bilateral, principalmente se Hillary Clinton vencer. Confira mais detalhes nos boxes abaixo.


Em relação ao Banco Central estadunidense (o Federal Reserve), que determina a taxa básica de juros, o economista do Santander, Luciano Sobral, avalia que o cenário não deve mudar caso a democrata seja eleita. Segundo Sobral, a candidata democrata deve, inclusive, manter Janet Yellen na presidência do banco até o final do mandato, em 2018. 

“Não teria nenhuma ruptura na política econômica. O cenário é mais do mesmo”, avalia.

No entanto, se Trump for eleito, a presidência do Fed deverá ser trocada, apesar de o mandato de Yellen estar previsto para até 2018. “Como o Trump já manifestou que queria trocar a presidência do FED, ela pediria para sair”, avalia Sobral.

Para ele, qualquer que seja o vencedor, o Fed deverá aumentar os juros para atrair mais capital, o que é ruim para todos os países emergentes, incluindo o Brasil.

Mas, como a economia depende de previsibilidade de cenários, a vitória do republicado poderia abalar as bolsas no curto prazo.

“No curto prazo, a reação do mercado é sempre de aversão ao risco. Trocar um cenário mais previsível (Hillary), de continuidade, por um presidente totalmente fora do sistema, que tem ideias pouco convencionais (Trump), acabaria por depreciar o câmbio por aqui”, avalia.

Comércio exterior
No entanto, o economista não arrisca em dizer o que poderia acontecer no médio e longo prazos, já que há muitos fatores em questão. Ele ressalta que não há garantias de que Trump faria tudo o que ele está falando como candidato.

“Se ele assume, uma das possíveis mudanças seria os Estados Unidos fechando para comércio exterior. A consequência disso para o Brasil é incerta. O Brasil já é um país muito fechado. Por um lado é ruim. As coisas aqui ficariam muito caras, com a pouca competição. Mas quando o comércio mundial retrai, o Brasil é mais resiliente que os outros países. O mundo sofrendo com essa retração do comércio global, para o Brasil pode não ser tão ruim”, avalia.

Ele ressalta que, para o Brasil, o impacto de os EUA fecharem a economia seria menor do que para o México, por exemplo. Enquanto o vizinho de fronteira dos americanos tem 69% do PIB atrelado ao comércio exterior com os EUA, no Brasil esse percentual é de apenas 21% do PIB.

A projeção do Santander é a de que o dólar feche 2016 em R$ 3,45, independentemente de quem vencer as eleições. “Não acho que revisaríamos a projeção se Trump ganhasse. Só se tiver alguma uma mudança nos fundamentos”, argumenta.

Política externa
“De maneira geral, não tem muita diferença. O que vai mudar, na verdade, é maneira como eles fazem as coisas. Mas, no fundo, eles compartilham das mesmas coisas”.
Onofre dos Santos Filho, professor do departamento de Relações Internacionais da PUC Minas

“Hillary tende a seguir a política do Obama porque foi a Secretária de Estado no governo Obama. A gente tem ideia do que ela vai fazer. Já o Trump tende mais ao enfrentamento e à retórica. A política extrema americana, com o Trump, vai fazer os EUA se isolar. A América Latina está em segundo plano para eles. O primeiro foco deles é a Ásia, a Europa. Para o Brasil, não faz a menor diferença (quem vencer). Os dois não vão ser bons para o Brasil porque são candidatos que defendem um protecionismo da indústria norte americana”.
Márcio Coimbra
Coordenador do MBA Relações Institucionais do Ibmec/DF

“A política da Hillary seria semelhante à do Obama, com mais negociações, menos belicosa do que a do Trump. O Trump não tem noção de nada. Tem uma visão simplória e reducionista das relações internacionais. A tendência do Trump é fazer com que os EUA se voltem mais para dentro. Tende a negligenciar as relações com os parceiros tradicionais – Japão, Canadá, México. Existe o risco de o Trump se cercar da extrema direita, aliados radicais, fazendo com que os EUA batam de frente no mundo com uma série de países. Pensando em como afetaria o Brasil, o Trump iria dar as coisas para a América do Sul. E quando se tem um presidente incompetente e muito agressivo, como foi o Bush, afeta o mundo inteiro, no sentido de gerar uma instabilidade na política internacional. As guerras são inimigas dos negócios”.
Ricardo Ghizi Corniglion
Doutor em geografia e professor de política internacional da PUC Minas

Migração
“O Trump é mais retórica do que qualquer coisa. Nunca ninguém expulsou e deportou tanto como Obama. Uma política do Trump não seria diferente. Só que o Trump vai para a TV e fala que faz. A Hillary promete, nos primeiros 100 dias de governo, mandar reforma da imigração para o Congresso. Quem é melhora para imigração é a Hillary”.
Márcio Coimbra
Coordenador do MBA Relações Institucionais do Ibmec/DF

“Hillary, quando se trata de migração, não tem perspectiva muito favorável. O que acontece com ela é que grande parte dos votos vem de negros, latinos, hispânicos. Consequentemente, ela não pode tocar nesse ponto. Ela não chega a ser muito radical, como Trump, mas não tem nenhuma proposta para resolver. Já o Trump, ao falar que vai mandar embora os árabes, fazer um muro na fronteira com o México, é jogo de cena para o eleitorado dele, conservador. A retórica dele é mais xenofóbica porque ele parte do princípio que os EUA fazem muito para o mundo, e o mundo não faz para eles. Em relação a brasileiros, é claro que se tiver uma política restritiva consequentemente eles vão ser atingidos, mas o grande problema são haitianos, dominicanos, panamenhos e mexicanos”.
Onofre dos Santos Filho
Professor do dpto. de Rel. Internacionais da PUC-MG

“Trump provavelmente vai adotar linha muito mais dura. A tendência é de política de extrema direita, deportação de ilegais, dificultar a vida de quem é imigrante e está mais ou menos legalmente, recusar refugiado. Hillary seria o oposto. Talvez abra a porta com mais força. Ela tem boa parte do eleitorado hispânico, de negros, das minorias”.
Ricardo Ghizi Corniglion
Doutor em geografia, professor de política internacional da PUC Minas

Economia
“Para a economia, Hillary é a melhor. Ela representa uma continuação do governo Obama, que é muito voltado para o diálogo e cooperações. Do ponto de vista econômico, o Brasil deveria fazer uma aliança estratégica com os EUA. Eles importam aproximadamente US$ 2 trilhões de dólares por ano. A China superou os EUA como o maior parceiro do Brasil, mas só quer soja e minério. Os EUA compram produtos industrializados que o Brasil precisa vender. O Trump – embora seja republicano e os republicamos sejam mais liberais – , diz que adotará uma política mais protecionista e tende, eventualmente, a criar dificuldades para a entrada de produtos brasileiros nos EUA - açúcar, álcool, algodão, aço, suco de laranja, celulose. Do ponto de vista econômico em geral, a eleição do Trump é um perigo, porque representa a incerteza”
Ricardo Ghizi Corniglion
Professor de política internacional da PUC Minas (doutor em Geografia)

“A grande ameaça em relação à economia dos EUA e o problema central é o acordo transpacífico. Isso sim seria uma ameaça em termos de reduzir mercado exportador. Isso tudo é resultado da disputa com a China, e pode sim afetar o Brasil negativamente. Aí existem duas situações: Trump é contrário ao acordo. Para ele, as empresas têm que voltar a produzir nos EUA, porque está muito dependente do comércio exterior. Se esse acordo se concretiza, nós teremos muito problema em relação à exportação dos nossos produtos. Se o Trump ganha, vai adotar essa política de repatriar empresas. Os dois candidatos são ruins, mas a Hillary é menos pior. A economia americana está patinando. Não se recupera desde a crise de 2008. Ela é pouco atrativa do ponto de vista de produto. O que acontece é que a China é muito mais atrativa do ponto de vista econômico do que os EUA. 
Onofre dos Santos Filho
Professor do departamento de Relações Internacionais da PUC Minas

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