Automóveis abaixo dos R$ 40 mil praticamente desapareceram do mercado

Marcelo Ramos
miramos@hojeemdia.com.br
23/12/2016 às 18:23.
Atualizado em 15/11/2021 às 22:12

Carro novo se tornou artigo de luxo no Brasil. Com preços cada vez mais salgados e custos de financiamento mais pesados, comprar um carro zero é uma realidade para apenas 1% dos brasileiros. E mesmo que o ufanismo da indústria nos últimos meses, apregoado devido à nova presidência da República, emane boas vibrações em declarações de que tudo vai melhorar, 2016 está à beira de terminar como o pior ano para a indústria desde 2006. Os licenciamentos podem ficar abaixo da marca de 2 milhões de unidades. E nessa sangria de vendas, o segmento de populares entrou em risco de extinção, com apenas um lançamento este ano. 

Quem manteve o fio de esperança no segmento foi o Fiat Mobi, lançado em abril. O pequenino italiano se tornou modelo mais barato da marca, partindo de R$ 32.380 (na versão Easy), ficando abaixo até mesmo do cretáceo Palio Fire, que não sai por menos de R$ 33.110. E mesmo sendo o barato do catálogo betinense, o Mobi emplacou até novembro 24.178 unidades, de acordo com a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). 

Atualmente há pouquíssimos modelos abaixo dos R$ 40 mil (que não significa um valor barato para modelos de acabamento pobre e escassez de conteúdos). Além de Mobi e do Palio Fire, ainda figuram o Volkswagen Up (R$ 35.190), Gol (R$ 35.960), Nissan March (R$ 38.990) e Chevrolet Onix (R$ 39.590) que contam com versões simplificadas, abaixo da faixa dos R$ 40 mil. Ainda entra na conta o Renault Clio, que já deixou de ser produzido na Argentina, mas ainda restam unidades para distribuição a partir de R$ 34..985.

Encolhimento
Vale lembrar que o nicho de entrada, segundo a Fenabrave, emplacou de janeiro a novembro 313 mil carros, segundo a média de vendas de 28 mil unidades mensais, e é provável que o segmento termine o ano com 340 mil licenciamentos. Em 2015 foram 496 mil e em 2014, o segmento anotou 697 mil. No ano de 2012, quando o mercado brasileiro registrou seu recorde histórico de licenciamentos (3,6 milhões), os populares correspondiam a 980 mil unidades.

Ou seja, se considerarmos a retração entre os anos de 2012 e 2016, a queda de emplacamentos no mercado de automóveis de passeio e comerciais leves foi de aproximadamente 45%. No entanto, os carros de entrada encolheram 65%.

Ação e reação
No entanto, há uma razão lógica e de ordem de mercado. Em qualquer conversa com um executivo de montadora toda decisão tomada tem relação direta com custo de produção. Nada é aprovado para elevar o custo e, sim, para gerar economia. 

E com o acesso ao crédito mais difícil, o custo do financiamento mais alto, o endividamento das camadas populares da população e aumento do desemprego, o segmento de popular deixou de ser um bom negócio para as fabricantes. 

Daí elas passaram a focar suas ações de lançamento em segmentos mais qualificados e até mesmo elevar o conteúdos de modelos que um dia tiveram versões populares como Uno, Onix, HB20, Ka, Sandero e Etios, que, atualmente, estão todos posicionados acima dos R$ 40 mil. 

Selos de grande participação passaram a adotar estratégias de grupos como a PSA Peugeot Citroën, que enxugou seu negócio e posicionou suas marcas numa faixa de preços inicial acima dos R$ 45 mil. 

As marcas passaram a mirar numa fatia menor de consumidores - que em contrapartida possuem maior poder de compra - que em tese é capaz de manter a rentabilidade com menores volumes e maior valor agregado.

Ou seja, o segmento de populares que foi responsável pela elevação da indústria nos últimos anos, deixou de ser rentável e quem ficou na mão foi o consumidor de baixa renda, que não pode mais pagar por um zero km. 

 Populares deixaram de ser estratégicos para indústria

A míngua dos “pé-de-boi” tem sua lógica e, de certa forma, era esperada. Desde janeiro de 2014, quando a legislação proibiu a produção de automóveis que não fossem equipados com air bag duplo e freios ABS, muitos populares foram descontinuados. Gol (G4) e Mille, por exemplo, impactaram na queda de participação da Fiat e da Volks. 

Equipar os veteranos não era a solução mais inteligente tanto para VW quanto para Fiat. Ambos eram projetos antigos e investir em ambos era o mesmo que salgar carne podre. Daí, o correto foi substituí-los. No lugar do G4 chegou o Up, ainda em 2014. Em Betim, o Palio Fire e o Uno Vivace se encarregaram de ocupar a lacuna deixada pelo Mille até a chegada do Mobi. 

Nos últimos três anos, Chevrolet, Hyundai, Ford e Toyota trouxeram novidades no segmento de hatches pequenos com Onix, HB20, Ka e Etios, que nunca ficaram na base do mercado.

Claro que é preciso reconhecer que esses automóveis oferecem itens de série como ar-condicionado, direção assistida e vidros elétricos, que eram ficção no início da década, e esse preço foi repassado ao consumidor. 

O Onix cumpriu com a missão de matar o Corsa e o Agile. E este ano, com a reestilização que o elevou para um patamar superior de preço e conteúdo, a GM manteve o visual antigo e lançou a versão Joy como opção de entrada, para preencher a lacuna do Celta, morto no ano passado, mas com preço inicial bem acima do finado popular. 

Já a Ford abandonou o segmento desde o lançamento da nova geração do Ka, em 2014, que também matou o Fiesta (Rocam) e se posicionou num patamar de preço acima.

A Renault se prepara para lançar o Kwid no início do ano. Apesar de a marca francesa fazer alvoroço em defender o carrinho como um utilitário-esportivo (SUV) de pequeno porte, trata-se de um popular para substituir o Clio. E se considerarmos que o Sandero, em sua versão mais barata, não sai por menos de R$ 42 mil, é possível que o Kwid tenha versão abaixo dos R$ 40 mil.
 

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