Igualdade melhora a economia, defende presidente da Fundação João Pinheiro

Bruno Moreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
24/07/2016 às 22:17.
Atualizado em 15/11/2021 às 19:59
 (Wesley Rodrigues)

(Wesley Rodrigues)

Minas Gerais perdeu uma chance de ouro de ter diversificado a economia do Estado com o boom das commodities, em especial o minério de ferro, que representa praticamente um terço do Produto Interno Bruto (PIB). Para se ter uma ideia, a tonelada chegou a custar U$S 187, em fevereiro de 2011, e agora está próxima de U$S 50.

A avaliação de que a história poderia ter sido diferente é do presidente da Fundação João Pinheiro (FJP), Roberto do Nascimento Rodrigues, que tem direcionado estudos da instituição para tentar diversificar a economia do Estado. Para ele, a mudança na matriz econômica mineira passa, necessariamente, pela redução das desigualdades regionais. Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, Rodrigues falou ainda sobre o auxílio da Fundação na gestão dos municípios e no planejamento do Estado, e defendeu mudanças na lei Robin Hood.


Quais mudanças que o senhor implementou na Fundação João Pinheiro desde que assumiu o cargo, em janeiro de 2015?
A modificação mais importante é o fato de que a Fundação exerce um papel mais central no governo. Logo no início da gestão, o governo fez um balanço das atividades e a Fundação participou ativamente no que diz respeito ao seu capítulo socioeconômico. Fez também uma avaliação do impacto das políticas governamentais dos últimos 12 anos para ter uma ideia de como o Estado estava sendo recebido. A outra avaliação mostra uma participação mais central no governo, no planejamento, e no PMDI, que é o Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado. Nos governos anteriores, isso era feito com uma consultoria. Dessa vez, a Fundação participou da coordenação desse plano. Nós conversamos com todas as secretarias de Estado para discutir o que tinha sido feito, o que é preciso mudar e as perspectivas para os próximos 15 anos.

Já tem algum resultado do PMDI ou só veremos os resultados mais pra frente?
Já temos alguns resultados. Ele foi todo desenhado e está sendo implantado na perspectiva de uma metodologia participativa. O governo redividiu Minas Gerais em 17 territórios. A população pode se manifestar sobre as demandas como segurança, saúde, educação e cultura. Essas sugestões foram coletadas e sistematizadas pela Seplag (Secretaria de Planejamento), e os PPAGs, que são os Planos Plunianuais, já foram feitos com base no atendimento dessas demandas.

Em tempo de poucos recursos, como fazer para atender a todos?
Se você pensar em ações coletivas, vai desenhar programas e juntar esforços. Correremos menos riscos de ter ações isoladas na educação, que não combinam com as ações isoladas no transporte, que não combinam com as da saúde, da segurança.

Minas é produtora de produtos primários e não consegue diversificar a economia. Como resolver isso?
Não é uma tarefa simples. Eu acredito que não é algo que se resolva no curto prazo. Mas o que precisa é iniciar esse processo. Uma forma importante é pensar em uma outra vertente, que também é importante, de reduzir as desigualdades regionais. Quando você trabalha com o potencial da região, necessariamente, vai diversificar. Se a gente consegue pensar num projeto que tem como um dos fundamentos essa redução de desigualdades, essa distribuição maior dos investimentos, você começa a dar alguns passos no sentido da diversificação. Hoje é realmente dramática. Você vê o resultado do último PIB (Produto Interno Bruto), que teve uma queda de 0,6%. Tivemos a agroindústria com crescimento de 7%, 7,2%, e a queda de 5% na indústria extrativa mineral derrubou (o PIB). Houve um ligeiro crescimento na indústria de energia e saneamento, mas o fato de se ter concentrado, derrubou o PIB. Mas não é uma tarefa simples e não se trata de um processo de substituição. Você continua tendo que investir pesadamente na sua indústria competitiva. Não se pode concentrar esforços numa só direção. Acho que esse mote de reduzir desigualdades vai permitir isso.

Como seria isso?
Agora, por exemplo, nós estamos desenhando o planejamento para cada um dos 17 territórios, dentro dessa metodologia participativa, mas com uma primeira questão: qual o eixo para desenvolver esse território, pensando que o desenvolvimento dele passa pela inserção da população na atividade produtiva. A Fundação está fazendo o plano para os dois territórios do Vale do Jequitinhonha. Estamos levantando em que o Vale tem vantagem comparativa. Não adianta colocar uma indústria de automóvel lá. Até porque, se eu fizer isso, vou ter que importar mão de obra, porque a população não está preparada para ocupar os postos de maior salário. Para cada região, tenho que fazer isso, porque se eu não fizer isso, corro o risco de ter um plano igual para todas as regiões, porque todas têm os mesmo problemas.

Quando esses planos devem estar prontos?
Em abril (2017) esse plano já estará pronto. Estamos desenhando esse planejamento, que é transversal, visitando a região e trabalhando com dados produzidos pela Fundação e pelo IBGE. A gente vai agora aumentar o escopo. Tornar a ação dentro de um processo para a região, e que seja inclusivo. No Vale do Jequitinhonha, por exemplo, tem a agricultura familiar. Eu não consigo resolver essa questão sem atacar a questão da posse da terra. Senão, esse pessoal vai continuar sem acesso aos programas federais que estão disponíveis. E eu não consigo resolver isso sem atacar um problema sério que é a questão de gestão. Aí entra a Fundação João Pinheiro. A gente tem uma Escola de Governo e precisamos resolver a questão da administração pública em nível municipal.

Como?
Os alunos recebem uma bolsa de um salário mínimo, durante os quatro anos. Toda vez que converso com eles, digo que entram aqui (na FJP) devendo para a população. E a gente quer que comecem a saldar essa dívida enquanto estão aqui. Já desenhamos um projeto de internato rural. Neste mês, já teremos três municípios visitados. Os alunos ficarão lá nas férias, fazendo esse diagnóstico, treinando esse pessoal. Uma vez formados, eles são servidores da Seplag. A ideia é que a Fundação chegue mais perto, atue mais perto da administração municipal. Uma crítica que a gente recebe é que estamos fazendo mais um plano. Agora é um plano de ação. Mas não estamos desenhando um plano de saúde, sem combinar com a Secretaria de Saúde.

Começa pelo Jequitinhonha. E depois?
O Jequitinhonha vai ser a matriz. Agora, para as outras regiões, a gente não tem fôlego. Então, a Sedru (Secretaria de Desenvolvimento Regional e Urbano) vai fazer alguns, vai ser distribuído.

Um dos indicadores que forma o IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) é a renda. Com a queda na renda do mineiro, o IDHM dos municípios deve cair?
É preciso ver se isso vai reduzir o impacto positivo dos outros indicadores do índice. A saúde, por exemplo, certamente vai continuar a melhorar: a expectativa de vida, a redução da mortalidade infantil. O que pode acontecer é não crescer o tanto que poderia crescer.

Em relação à lei Robin Hood, é necessário uma mudança?
A lei certamente precisa ser modificada, tanto para simplificar os processos, como também para ser alvo de uma análise de impacto de cada uma das áreas. Por exemplo, na educação, a gente já praticamente universalizou o acesso. Então, poderemos colocar como meta, por exemplo, o transporte escolar. É preciso ver em que medidas aquelas metas foram cumpridas e podem ser substituídas. A lei oferece uma oportunidade de induzir o município a implantar políticas públicas. Não é uma negociação fácil, mas ela certamente precisa ser modificada e algumas induções precisam ser modificadas por outras.

Quais políticas públicas seriam interessantes de serem induzidas?
O importante é pensar no movimento, como os municípios atingem determinadas metas e em qual velocidade. Algumas já foram atingidas e outras são tão universais que não vão diferenciar. Mas acho que o que ainda precisa ser trabalhado na lei Robin Hood é em que medida o Estado pode assessorar os municípios no cumprimento de determinadas metas. Os municípios de grande porte conseguem desenhar programas e cumprir os critérios. Os menores têm que contratar uma consultaria externa, que vai desenhar o seu programa. O Estado poderia pensar alguma forma para assessorar os municípios. A Fundação pode exercer um papel importante aí.

Em relação ao PIB de Minas, quando deveremos ter uma melhora?
O processo de recuperação é mais lento do que a gente gostaria que fosse. Ele pode melhorar com a conjuntura internacional, com a valorização das commodities. Mas, ainda assim, a gente continua tendo que fazer o dever de casa de ter que diversificar. Mudar a estrutura é um processo de mais longo prazo.

A gente perdeu uma chance de fazer essa mudança na estrutura da economia mineira, nos últimos anos, quando as commodities estavam com os preços nas alturas?
Certamente. A gente surfou nessa onda, poderia continuar surfando, mas já de olho em ações que tornassem a economia menos dependente de um setor só. Poderíamos ter potencializado isso, continuar a nos beneficiar com as commodities, mas com outros setores crescendo. Primeiro, você teria, pontualmente, crescimentos maiores e, segundo, quando cai você tem uma queda menos abrupta. O que acontece com Minas Gerais é que a queda é mais abrupta do que acontece com o Brasil. E a recuperação é mais rápida.

Quais foram as providências que a Fundação tomou em relação ao caso de abuso sexual, sofrido por uma aluna? Como isso é tratado?
O caso envolveu uma aluna da Fundação, que é vítima. Os outros atores não são alunos. Do ponto de vista do abuso que houve, isso é uma investigação que foge da nossa competência. O que a gente pode fazer é do ponto de vista administrativo. Nesse caso, demos todo o suporte à aluna. Agora, se a gente tiver um caso de assédio sexual aqui, é aberto um processo de sindicância e a nossa competência vai até aí.

Já houve algum caso?
Já. No ano passado, nós tivemos uma denúncia de assédio sexual, que foi apurada. Esse aluno recebeu a pena máxima, que foi uma suspensão por um semestre. Esse processo também tem a fase criminal, que ainda não tem o resultado.

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