Inadimplência em condomínios de BH rompe barreira dos 10% e acende alerta

Fábio Corrêa e Felipe Boutros
primeiroplano@hojeemdia.com.br
29/08/2017 às 20:18.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:19
 (Maurício Vieira )

(Maurício Vieira )

 A taxa de inadimplência dos condomínios em Belo Horizonte no primeiro semestre deste ano oscilou entre 12,2% e 10,9%, de acordo com levantamento da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG). O número é considerado alto e impacta diretamente na vida dos vizinhos, já que o débito acaba sendo rateado entre eles.

“Quando a taxa de inadimplência está abaixo de 10%, ainda é possível contornar a situação utilizando o fundo de reserva. Mas quando ultrapassa esse limite, não tem jeito. E a situação acaba provocando uma bola de neve, pois o condomínio mais caro pode criar outros devedores”, diz o vice-presidente da CMI/Secovi/MG, Leonardo Matos.

De acordo com o artigo 1348 do Código Civil, o síndico tem o dever de fazer a cobrança. Mas antes de uma ação na Justiça, há alternativas que podem agilizar o processo. O Tribunal de Justiça, por exemplo, promove audiências de conciliação. De acordo com Matos, a resolução do problema chega a 70%.

“Hoje também existem alternativas como parcelar a dívida em até 10 vezes no cartão de crédito”, explica o dirigente, que oferece essa possibilidade em sua administradora de condomínio.

Para o presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG, Kênio de Souza Pereira, o grande problema é a multa cobrada por atraso, considerada por ele muito baixa: 2% do valor da taxa. Mas ele adverte que o novo Código Civil prevê a possibilidade de a assembleia do condomínio alterar a convenção e colocar juros de até 10% ao mês.

“Juros muito altos pesam bastante contra o devedor e fazem ele revisar a prática. Acaba que há resultados quando há penalidades mais expressivas. Já existe jurisprudência do Superior Tribunal da Justiça (STJ) consagrando esse juros de até 10%”, diz ele. O STJ também decidiu que, quando há inadimplência contumaz, ou seja, quando ela é frequente e reiterada, desequilibrando o condomínio, há previsão de multas de até cinco vezes o valor da taxa condominial.

“Além disso, sobre o débito do devedor incide a correção monetária e, desde que a convenção seja atualizada, juros mensais entre 3% a 10%”, afirma Pereira. Tanto o advogado quanto o dirigente da CMI alertam que a cobrança de condomínios atrasados é sempre contra o proprietário, mesmo quando o inquilino é o responsável pelo débito.

“O locador que foi acionado pelo condomínio e compelido a pagar seus débitos e demais taxas do imóvel pode entrar com uma ação de cobrança contra o inquilino e seus fiadores para receber a dívida”, explica.


Penalidades vão de nome no SPC até a perda do imóvel

As penalidades para quem não paga as taxas de condomínio podem chegar até mesmo à perda do próprio imóvel. “Se o devedor for condenado em juízo e não pagar o condomínio, a Justiça penhora o imóvel dele, mesmo que seja o único que ele possua”, explica o advogado Kênio Pereira.

Além disso, os condomínios também têm a opção de cortar o fornecimento de água e gás, caso estas estejam incluídas na taxa condominial. “Já tem várias decisões nesse sentido, desde que haja uma hidrometria em cada apartamento. A mesma coisa acontece com o gás. São mecanismos que a lei permite”, afirma.

Outra penalidade com a falta de pagamento é o impedimento do devedor em participar e votar nas assembleias de condomínio. “Há também a possibilidade de se denunciar no SPC e Serasa, ou de se protestar em cartório a dívida”, diz.

No entanto, os síndicos não podem constranger diretamente os devedores, expondo, por exemplo, o nome deles em quadros de avisos coletivos ou proibindo-os de utilizar as áreas de lazer dos prédios. “O Código Civil já possibilita aumento do juros. É uma maneira de se constranger dentro da lei”, diz Pereira. Por isso, segundo ele, a convenção do condomínio, por ser um documento complexo, deve ser atualizada com auxílio de um técnico jurídico.

Situação

As dificuldades de fazer valer a lei, no entanto, podem dar muita dor de cabeça. Síndica de um prédio na região da Praça da Liberdade com 37 imóveis, dos quais um é comercial, Valdete Henrique já está na segunda ação judicial contra um proprietário que se recusa a pagar a taxa condominial.

“É um prejuízo de cerca de R$ 1.200 por mês, que acaba sendo dividido entre os outros 36 condôminos”, conta. De acordo com Valdete, o condômino, que ocupa a sala comercial do edifício, justifica a inadimplência dizendo que não utiliza a portaria, o elevador, nem as duas garagens duplas – o que, segundo a síndica, não condiz com a realidade.

“Ele também dá como justificativa o fato de que em outros prédios parecidos há uma prática de não se cobrar condomínio da sala comercial e isso não é verdade”, diz ela, que afirma que o morador já perdeu uma ação anterior.
“Gera enorme constrangimento, porque ele coopta os moradores a se virarem contra mim. Tem gente que nem me cumprimenta mais”, reclama Valdete, que relata que ambos quase chegaram “às vias de fato”.


Além Disso

A garantia condominial, serviço oferecido por algumas empresas que cobram taxas para antecipar o valor total pago por todos os condôminos, impedindo assim que o condomínio tenha prejuízo com possíveis inadimplentes, é, na visão do advogado Kênio Pereira, ilegal.

“Como esses problemas de inadimplência têm sido cada vez maiores, alguns condomínios têm cedido a propostas de empresas que vendem serviços para garantir a receita da taxa condominial”, afirma.

No caso, esse serviço cobra uma taxa de 7% sobre a receita do condomínio. Se a receita total é de R$ 15 mil, por exemplo, a empresa cobra R$ 1.050 para antecipar os valores e garantir o funcionamento geral do edifício. “Isso é ilegal porque cria uma situação de cobrar dos condôminos um valor que não faz parte do próprio condomínio e que gera lucro para terceiros”, observa o advogado.

“Além dessa empresa ganhar os 7%, ela entra com as ações por conta dela, ganhando os honorários na Justiça. É um mecanismo que gera comodidade, mas acarreta ônus porque os problemas são pontuais”, alerta o especialista em Direito Imobiliário.

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