Lista de Janot e multidão nas ruas podem comprometer reforma da Previdência

Tatiana Moraes
tmoraes@hojeemdia.com.br
15/03/2017 às 22:09.
Atualizado em 15/11/2021 às 13:45


Protestos em todo o país, como o que reuniu 150 mil pessoas em Belo Horizonte, e o impacto da lista de Janot, que pede a abertura de inquérito contra 83 políticos no Supremo Tribunal Federal, podem se traduzir num balde de água fria em quem dava como certa a aprovação, com folga e ainda no primeiro semestre, da reforma da Previdência no Congresso. Na avaliação de deputados, a instabilidade política atual atrapalha as negociações do governo para mudar as regras da aposentadoria.

Ontem o Planalto já sofreu um revés ao ter o comercial em que defendia a nova Previdência suspenso. A Justiça de Porto Alegre atendeu a um pedido de nove sindicatos trabalhistas para proibir a veiculação do material em todo o país. Como a decisão é liminar, cabe recurso.
Na avaliação do cientista político Malco Camargos, as manifestações são o primeiro sinal claro de descontentamento enviado pela população ao presidente Michel Temer.

“Ele não tem autonomia ou liberdade para fazer o que quiser sem consultar o povo. O recado foi dado. Os protestos, somados à lista (de Janot), colocam em xeque a possibilidade de o governo manter as discussões da reforma no ritmo atual”, alerta.

Vice-líder do PT na Câmara dos Deputados, Paulo Pimenta (PT-CE) não acredita que a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287, que trata do assunto, chegue a ser adiada, mas diz que a pressão nas ruas tem potencial para barrar a aprovação do texto na Câmara.

“O governo não vai negociar algumas questões da reforma e não vai tirá-la da pauta porque a proposta atende justamente às empresas que financiaram o impeachment”, diz o parlamentar. A bancada do PT tem 58 dos 513 parlamentares da Casa.

Já para o vice-presidente da Câmara, deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), a tramitação do texto seguirá normalmente. “São processos independentes”.

Fato é que as paralisações em pelo menos 22 estados brasileiros fizeram barulho suficiente para mostrar aos deputados que o tema é mais do que polêmico.

“É uma vitória do povo. A crescente oposição das ruas impacta fortemente não só a reforma da Previdência, como a trabalhista”, avalia a deputada Jô Moraes (PCdoB-MG).

Líder do bloco formado por PTB, Pros, PSL e PRP, com 25 deputados, o mineiro Eros Biondini (Pros) acha inclusive que a votação do texto possa ser adiada. “Mesmo assim, mantenho as conversas e negociações para que a proposta não seja aprovada”, afirma.

Na tv
Durante o dia, deputados da base aliada pediram que Temer gravasse um pronunciamento na TV. O objetivo era convencer a população de que a reforma é necessária. Os parlamentares têm sido pressionados por organizações contrárias à medida.

Por enquanto, porém, Temer manterá a estratégia de divulgar vídeos que defendem a proposta nas redes sociais, como o exibido na terça-feira (14) no Facebook do Palácio do Planalto. A postagem rebatia, ponto a ponto, um vídeo do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) narrado pelo ator Wagner Moura.

Em evento do Sebrae, realizado ontem, o presidente disse que se a reforma não for aprovada, o INSS entrará em colapso. De acordo com Temer, quem tem direito adquirido, ainda que esteja trabalhando, não irá perdê-lo. Ele disse ainda que a reforma é “necessária para garantir os benefícios dos aposentados de hoje e dos jovens que irão se aposentar”.

Segundo os organizadores dos protestos, BH e São Paulo tiveram ontem as maiores mobilizações contra a reforma, que pretende passar para 65 anos a idade mínima para aposentadoria de homens e mulheres. Cerca de 150 mil pessoas, nas contas da Central Única dos Trabalhadores (CUT), saíram às ruas da capital mineira. A Polícia Militar não estimou o número de participantes na cidade.

 Usuários do metrô e de postos de saúde foram surpreendidos

Usuários do metrô de BH foram surpreendidos na manhã de ontem com a paralisação total dos metroviários, que descumpriram a determinação do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de garantir escala mínima de 80% dos trens nos horários de pico. Na Estação Central, na Praça da Estação, muitas pessoas deram com a cara nas grades e o atraso para chegar ao serviço foi inevitável.

Na capital mineira, também pararam os serviços de saúde, instituições federais de ensino, servidores da Justiça de primeira instância, petroleiros, empregados da Copasa e da Cemig, de escolas públicas e particulares, entre outros. O trânsito ficou congestionado durante todo o dia.
Sem saber da paralisação dos metroviários, o barbeiro Júnior Nunes, de 24 anos, veio de Nova Lima para se encontrar com um cliente na porta do metrô no Centro de BH. “A pessoa que estou esperando mora em Ibirité e só tinha como vir de metrô. Não sei o que fazer”.

Segundo o vice-presidente do Sindimetro/MG, Romeu José Machado Neto, a notificação do TRT só chegou à sede do sindicato após as 19h de terça-feira, o que impossibilitou a comunicação à categoria da exigência da escala mínima. Com o descumprimento, o sindicato está sujeito à multa de R$ 250 mil.

Quem precisou ir a um posto de saúde em BH também pode ter ficado sem atendimento, já que os servidores aderiram à paralisação contra a reforma da Previdência. As unidades ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) funcionaram com capacidade reduzida, recebendo somente os casos de emergência.

No Centro de Saúde Santos Anjos, no Carlos Prates, cartazes informavam sobre a paralisação. Já no posto do Padre Eustáquio estavam sendo atendidos somente pacientes graves ou com agendamento prévio de consulta, como foi o caso do aposentado Marco Antônio Brunelli, de 52 anos, com pneumonia pela segunda vez. “Estou muito mal e me colocaram na fila. Mas muita gente não foi atendida”, disse. (Repórteres Malú Damásio e Paula Coura)

 Congestionamento atingiu estradas e principais vias da capital

Em algumas rodovias que cortam o Estado, a retenção de veículos chegou durar até 5 horas com os protestos de manifestantes contrários à Reforma da Previdência. No entanto, no final da tarde de ontem, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) informou que o fluxo de veículos já havia voltado ao normal.

O trânsito chegou a ser interrompido, na manhã de ontem, nos dois sentidos da BR-381, no município de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Na BR-262, também foram registrados três pontos de retenção: no Km 578, próximo a Campos Altos, no Alto Paranaíba; no 116, em Manhuaçu, na Zona da Mata, e próximo à cidade de Santa Bárbara, no Km 552. Ainda de acordo com a corporação, as mobilizações ocorreram de forma pacífica.

As manifestações no centro da capital também chegaram a congestionar o trânsito nas principais vias da cidade.

Os manifestantes percorreram várias avenidas de BH e se concentraram no fim da tarde de ontem na Praça da Assembleia Legislativa, onde participaram de ato público, com a presença do ex-ministro da Previdência Social dos Governos Lula e Dilma, Carlos Gabas.

O ex-ministro da Previdência garantiu que não há rombo no sistema. “Esse argumento é falho. O Governo Temer teve uma queda brutal de arrecadação, fruto da instabilidade. Retirar benefícios sociais não é o caminho”, enfatizou Gabas.

Durante a audiência pública, o deputado estadual Rogério Corrêa (PT) convocou as bancadas mineiras a resistirem à Reforma da Previdência como está sendo proposta e marcou um novo encontro para segunda-feira para debater o tema.

Ontem também várias categorias cruzaram os braços e algumas escolas da rede estadual entraram em greve por tempo indeterminado. (Repórteres Malú Damásio e Paula Coura)
 

  

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