Na esteira da 'Lava Jato', projetos avançam no Congresso para legalizar Lobby

Felipe Motta
fmotta@hojeemdia.com.br
18/11/2016 às 23:01.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:43

Sem alarde, integrantes da base do governo federal querem regulamentar o lobby. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), começou a consultar parlamentares sobre o apoio na Câmara. No Senado, aliados do presidente Michel Temer (PMDB) também se movimentam para ver a prática tornar-se legal. A ideia é colocar o tema em pauta ainda neste ano.

A preocupação dos parlamentares tem nome: Operação “Lava Jato”. Vários lobistas foram presos e tornaram-se delatores. Nos Estados Unidos e parte da Europa, a prática de fazer a ponte entre governo e empresas é regulamentada.

No Brasil, além de um projeto de lei de 2007, na fila da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara – que pode ser votado até o fim do ano– , uma nova proposta de emenda constitucional, no Senado, tenta regulamentar o lobby. Há ainda um grupo de trabalho no Ministério da Transparência discutindo o tema.

A tentativa de regulamentar o setor é bem vista por especialistas e por uma parcela dos profissionais, ainda que permeada por divergências. Desde 1984, de acordo com dados do Ipea, 15 propostas sobre atividade do lobby tramitaram ou estavam em tramitação no Congresso. Nenhuma delas avançou, em boa parte, pelo interesse de alguns lobistas se manterem invisíveis, assim como assegurarem o sigilo dos nomes que representam. Regulamentar o setor significa cadastrar e dar transparência, com acesso público a esses nomes.

Hoje, cerca de 3 mil pessoas trabalham no país atuando na defesa do interesse de grupos como mineradoras, farmacêuticas, indústrias de armas, do agronegócio, ou, em menor número, de ONGs ambientais, de direitos de idosos, crianças, minorias sociais. Só em Brasília, são cerca de 2 mil profissionais, de acordo com a Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), que representa parte do setor.

Outra cara
O jogo da regulamentação, no entanto, começou a virar, a partir do momento em que a Operação “Lava-Jato” jogou luz sobre relações entre políticos e empresas. “É comum que uma empresa procure um deputado para apresentar as suas demandas, mas hoje tudo está criminalizado. A ‘Lava Jato’ considera que todas as relações são criminosas”, critica um deputado federal, que preferiu manter o anonimato.

A regulamentação aparece, assim, como uma forma de proteger parlamentares, empresários e os próprios lobistas, delimitando as práticas permitidas nessas delicadas relações.

“A proposta do projeto é mostrar a diferença entre agente de relações governamentais e operador de propina. Você vai entrar no site da Câmara e saber quem está cadastrado como profissional, para quem ele trabalha e quais os interesses representa”, explica a deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ), relatora do projeto de lei 1202 na Câmara dos Deputados.

A cientista política Denilde Holzhacker, professora do curso de Relações Internacionais da ESPM, em São Paulo, complementa. “No caso das empresas, elas têm mecanismos de complience (controle) cada vez mais restritos, principalmente as multinacionais. E as medidas anticorrupção do poder público passam pela regulamentação da representação de interesses”, diz.

Falta de conexão entre as propostas ainda gera muita dúvida

Várias controvérsias cercam as discussões no Congresso, como as distorções de representação em benefício de grupos econômicos mais favorecidos e o limite para as intervenções dos lobistas.

O ponto de partida das divergências é a própria definição da atividade. Para parcela dos lobistas e parlamentares, o lobby já estaria previsto no artigo 5º da Constituição que, dentre muitos pontos, assegura o direito de petição do cidadão aos poderes públicos. Nessa avaliação, a PEC 47, de autoria de Romero Jucá (PMDB-RR), em tramitação do Senado, não seria necessário, já que ela foca justamente em delimitar a atividade.

Uma questão adicional é a ausência de conexão entre a PEC do Senado e o PL da Câmara sobre o assunto. “Já há um debate grande no Brasil, com outros projetos, e a PEC não cita isso. Outro ponto que chama a atenção na PEC é a falta de mecanismos de enforcement, de punições, para quem foge às regras”, aponta o cientista político Lucas Cunha, co-autor de dois estudos sobre a regulamentação do lobby no Brasil, elaborados para o Ipea em 2015.

Ele também vê o texto da PEC como pouco específico. “Na forma como está a PEC é só o começo de uma regulamentação, porque abre espaço para que cada órgão do governo faça a sua. Além disso, grupos que têm mais expertise vão se beneficiar dessa regulamentação mais frouxa”, critica.

Autor do PL 1202, em tramitação na Câmara, o deputado federal Carlos Zarratini (PT-SP) pontua a necessidade de se pensar nos diferentes atores que atuam fazendo lobby. “É preciso separar um pouco. Há movimentos sociais envolvidos e os sindicatos também fazem lobby. Não é a mesma coisa que demandar uma lei a pedido de empresários, para mudar a tributação de um setor específico”, pondera.Editoria de Arte 

  

  

  

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