Carlos Bittencourt: atuação do MP será marcada pela independência e celeridade

Patrícia Scofield - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
08/12/2014 às 08:13.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:18
 (Flávio Tavares/Hoje em Dia)

(Flávio Tavares/Hoje em Dia)

Eleito como o novo procurador-geral de Justiça, Carlos André Mariani Bittencourt assume o comando do Ministério Público de Minas nesta terça (9). A recondução ao cargo será para uma gestão de dois anos. Ao Hoje em Dia ele disse que, com a vitória do PT nas urnas e diante do anúncio do deputado Bernardo Santana para a Secretaria de Defesa Social, o MP vai manter a “relação institucional independente”. “Eu acho que nós temos sempre que olhar para a frente”, resumiu. Bittencourt ressaltou a organização interna da instituição, conquistada, segundo ele, na sua primeira gestão, a aprovação da Lei Orgânica do MP, as ações em apoio aos promotores do interior do Estado e da área de defesa do Patrimônio Público. Uma das metas do próximo biênio será dar celeridade aos inquéritos para evitar o arquivamento dos casos sem solução e a ampliação dos Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) para evitar a judicialização dos casos.

Com a troca de gestão do Estado, do PSDB para o PT, o Ministério Público vai priorizar a independência na condução dos trabalhos?

O MP é independente, autônomo em relação ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário. Então, a nossa vida aqui segue normalmente. Nós temos uma relação institucional independente e cada instituição deve cumprir sua função, dentro do seu perfil constitucional. As mudanças que ocorrem são naturais, decorrem do exercício da nossa democracia. E o nosso MP, assim como em todos os estados, vai manter a linha, dada essa autonomia e essa independência.

Na última semana, o governador eleito, Fernando Pimentel, anunciou o deputado federal Bernardo Santana como secretário de Estado de Segurança Pública. Ele foi ligado ao caso da “máfia do carvão”, defendeu a PEC 37 (que limita o poder de investigação dos promotores). E sabemos que nas operações o MP, muitas vezes, pede ajuda da Polícia Militar. Fica algum mal-estar com a indicação desse nome para a pasta?

Eu acho que nós temos sempre que olhar para frente. O que ficou, o que ocorreu no passado com relação ao secretário indicado não deve ser objeto de comprometimento do nosso trabalho, pois, volto a dizer, é uma relação institucional, em que todas as partes, seja o Executivo, MP, Judiciário, precisam cumprir a sua missão. Cada qual no seu contexto.

Hoje, não se pode pensar, dada a gravidade da questão da segurança pública, em uma divergência que vai prejudicar o enfrentamento dessa questão. O contexto é o início de um novo trabalho e esse trabalho vai ter que ser feito com cooperação e com interlocução, para que os resultados venham. A questão da segurança pública é muito grave e precisa ser enfrentada através de uma atuação cooperativa de todos os envolvidos nesse processo. Qualquer espécie de divergência que houver, e tenho certeza de que não haverá a ponto de prejudicar esse enfrentamento, seria prejudicial à própria população mineira. Então, nós aqui no MPMG contamos que tudo transcorra dentro de um contexto favorável à evolução dos serviços de combate à criminalidade e de combate ao crime organizado.


O senhor acredita que essa discussão do poder de investigação dos promotores está encerrada ou pode haver alguma ação nesse sentido?

A manifestação de toda a população brasileira foi muito eloquente, no sentido de não aceitar esse retrocesso. Me parece que isso não voltaria mais a ocorrer, mesmo porque a rejeição popular seria muito forte. Uma iniciativa nesse sentido seria extremamente prejudicial, volto a dizer, à nossa sociedade. Teria que vir por meio de uma emenda à nossa Constituição Federal e trazendo apenas prejuízo. A questão da segurança pública é muito grave. Não podemos nos dar ao luxo de segmentar, com apenas uma instituição podendo investigar. A gravidade da situação não comporta esse tipo de coisa. Comporta uma união de esforços, no sentido de combate à criminalidade. Isso é o razoável. A segmentação, a divergência são prejudiciais ao que a sociedade pretende: poder ter uma sensação de segurança ao sair às ruas. E isso certamente não virá, se houver divergências.


Qual o balanço que o senhor faz do primeiro biênio em que esteve à frente do MPMG, prestes a assumir como procurador-geral novamente?

Eu dei início ao primeiro mandato, dois anos atrás, com determinadas metas. E nós tínhamos aqui uma necessidade de avançar em áreas definidas, porque o MP é uma instituição que lida com uma diversidade grande de assuntos. Por exemplo, a criação do Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaecos). É uma realidade em outros estados da federação e ainda não havia sido criada essa estrutura em Minas Gerais. Tínhamos também a necessidade de criar promotorias regionais na área de saúde. Curiosamente, é uma área que não existia no MP há dez anos, mas quando foi criada, virou uma das maiores demandas, por ser uma matéria muito sensível ao cidadão. E tínhamos uma necessidade de alinhar a atuação do MP, para que a instituição tivesse uma linha mais uniforme diante de uma série de atividades. Então fomos tomando uma várias providências para que isso se tornasse realidade. Nós já tínhamos uma área ambiental muito fortalecida, desenvolvida ao longo de dez anos, através de regionais criadas por bacias hidrográficas. Muito fortalecidas também regionais na área de infância e juventude, de combate à sonegação fiscal. Com isso, começamos a elaborar o nosso planejamento para o desenvolvimento das atividades nos dois anos.


Como foi desenvolvido esse planejamento? Foram ouvidos todos os promotores e servidores?

Adotamos um planejamento estratégico que foi desenvolvido através de uma empresa profissional. Ela definiu muito bem as prioridades do MP, depois de um levantamento em que foram ouvidos todos os promotores de Justiça. No planejamento estratégico ficou bem claro que o próprio MP queria priorizar, nos próximos anos, o combate à criminalidade, notadamente a criminalidade organizada, a defesa da infância e da juventude, defesa da educação, o combate à corrupção, a defesa da saúde e do meio ambiente. E nós seguimos esse planejamento. Foi quando surgiu a PEC 37, logo no início do meu primeiro mandato. Foi objeto da nossa atenção por praticamente seis meses. Fomos obrigados a investir uma grande energia em torno desse assunto. Fomos bem-sucedidos, graças ao apoio popular nessa luta. Vencido isso, criamos regionais do MP na área da saúde e temos um projeto de continuar criando essas regionais. São estruturas de apoio, para que a instituição trate a questão da saúde de forma regionalizada. Existe uma necessidade em cada comarca, mas o sistema de saúde é todo regionalizado. Tem que atacar no macro. Abordamos as questões dos serviços disponibilizados à população através de um sistema pioneiro no Brasil, desenvolvido pelo nosso centro de apoio na área de saúde. É a chamada Mediação Sanitária. É um interessantíssimo processo de chamar todos os atores do sistema de saúde: o MP, as secretarias de Estado e Municipal de Saúde. Portanto, não se trata o problema na comarca, na pequena cidade, você tenta atacar a questão, que é gravíssima, importantíssima para a população, em torno de uma região inteira.


E na área da defesa do patrimônio público e combate à corrupção?

Nós criamos um programa de apoio às promotorias de defesa do patrimônio público do Estado inteiro. É um programa pioneiro: um grupo passou a receber, em apoio aos promotores do Estado, todos os inquéritos civis públicos, por ano. Começamos a atacar os inquéritos mais antigos e traçamos periodicamente a possibilidade de dar mais apoio aos mais recentes e avançamos ano a ano. Isso para que o MP possa ter mais em suas mãos uma série de casos, de investigações, que não se resolvem com o tempo. O promotor da pequena comarca é o clínico-geral. Ele está lá sozinho, com um pequeno grupo de apoio, de servidores, e precisa dar conta de todas as áreas. Fazer os júris, as audiências criminais com o único juiz da comarca. Criando esse tipo de apoio, damos condições a ele de também conseguir se desincumbir dessas questões mais complexas, que são as que envolvem a defesa do patrimônio público e o combate à corrupção. Conseguimos avançar e pretendemos continuar avançando com o nosso planejamento estratégico em prioridades que foram escolhidas pelo próprio MP, não pelo procurador-geral. Há comarcas com um grande acúmulo de processos criminais. Nós não queremos que o MP seja responsável por prescrição.


E os planos para o biênio 2015/2016, quais são?

Avançaremos com a criação de outras regionais das promotorias de saúde, porque o modelo da Mediação Sanitária é muito inovador e brilhante nos resultados. Vale a pena avançar porque já foi testado nas três regionais que foram criadas nesse biênio e mostrou resultado positivo. Foram necessários também, ao longo desse período, tomar iniciativas junto à Assembleia Legislativa do Estado (ALMG) para alterar a nossa Lei Orgânica. É a lei que regulamenta a vida do MPMG, que tinha 20 anos (foi criada em 1994) e estava precisando de atualizações. Remetemos esse projeto de lei para a ALMG e tivemos que acompanhar. É um processo longo, que tem que ser feito com todo o cuidado. Com isso, nós transformamos as ações da nossa corregedoria-geral, que hoje abraça todos os promotores e servidores da instituição. Antes, não era assim. Atualizamos tudo o que foi necessário para ter um processo de movimentação na carreira, as promoções, remoções, e para ter promotorias com nomes atualizados. Enfim, modernizar a lei, ao passo que a vida se moderniza ao longo de 20 anos. Eu quero crer que vencido tudo isso, hoje o MPMG está muito organizado administrativamente. Estamos muito adequados a todas as exigências do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que faz o controle administrativo e financeiro da instituição. Eu sinto que, nesse momento, já tendo sido feita a reforma da lei, feitas todas as adaptações administrativas que foram necessárias ao longo desse período, estamos com a casa muito bem organizada para que a gente possa avançar na estruturação do que já foi iniciado. E também tocar a nossa vida no sentido de modernizar também os sistemas de controle interno. Hoje, cada procedimento que é instaurado no MP é registrado em um sistema chamado Sistema de Registro Único. Para que o MP tenha transparência naquilo que faz. Então, se quiser consultar hoje, ele está lá. A pessoa do investigado, o cidadão, ele pode verificar e se certificar da existência daquilo e do estágio de avanço de determinada investigação. Isso consome um tempo muito grande do servidor que está em apoio ao promotor. Queremos modernizar esse tipo de sistema para que haja mais tempo disponível em cada promotoria para o cumprimento do que é efetivamente importante, que é dar a resposta para a sociedade de milhões de casos que acontecem todo dia.

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