TCE amplia transparência e esforços em prol da educação pública no Estado

Evaldo Magalhães
efonseca@hojeemdia.com.br
06/04/2018 às 16:31.
Atualizado em 03/11/2021 às 02:12
 (Lucas Prates)

(Lucas Prates)

Primeiro servidor concursado a ocupar a presidência do Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCEMG), o conselheiro Cláudio Terrão, de 49 anos, tem procurado mudar o foco de atuação do órgão.

Da prática apenas fiscalizadora e muitas vezes punitiva do órgão, ele tem enfatizado em sua gestão no tribunal, que começou em fevereiro do ano passado e vai até 2019, três pilares: o reforço na transparência das contas públicas, o auxílio aos gestores municipais, para que obtenham melhores índices de eficiência fiscal, e os esforços em prol da educação pública no Estado. 

Nesta entrevista, Terrão fala ainda, entre outros temas, de sua trajetória pessoal e das relações entre o TCEMG e a ALMG, em razão do projeto do governo estadual de vender parte das ações da Codemig. 

O senhor é o primeiro concursado a se tornar presidente do TCEMG. Como foi sua trajetória?
Estou no tribunal desde 2008. Entrei por concurso, preenchendo cargo destinado ao Ministério Público, e, em 2010, surgiu a oportunidade e me tornei conselheiro, por meio da lista tríplice submetida ao governador, que na época era o Anastasia. Mas comecei minha formação na área de tecnologia, como técnico em eletrônica, especialista em aviões pela Aeronáutica, onde fui sargento. Depois, formado em Direito, os meus cargos foram sempre via concurso publico. Trabalhei como técnico do Tesouro Nacional, auditor fiscal, procurador federal e, finalmente, como membro do MP junto ao Tribunal de Contas, primeiro em Goiás e, em 2008, em Minas Gerais.

Sua gestão tem sido marcada por algumas mudanças de orientação na atuação do órgão. Quais são as bases desse trabalho?
Pautamos nossa gestão sobre três pilares. O primeiro é o da transparência, interna e externa. Utilizando a tecnologia, lançamos alguns produtos para a sociedade mineira, entre eles a disponibilização em dados abertos de boa parte das informações fiscais e financeiras dos municípios mineiros, algo que está sendo, inclusive, muito bem utilizado. E pretendemos avançar nesse sentido, dando também uma roupagem nova aos nossos portais para que possamos divulgar informações relevantes e compreensíveis à sociedade.

Nessa linha, o tribunal está prestes a lançar um cadastro digitalizado de agentes públicos do Estado. Como será a plataforma?
O cadastro estará disponível até o final de abril. É um produto muito importante porque teremos ali, concentrados na base de dados, todos os agentes públicos do Estado e dos municípios mineiros. Isso possibilitará consultas à remuneração dos servidores, à possibilidade de acúmulo de cargos, a uma aferições bastante significativa referente ao universo de agentes públicos que atuam em Minas, inclusive para efeito de cálculos na previdência social dessas pessoas.

E o que será o Banco de Preços?
Espero lançar esse produto até o final do ano, ainda na lógica da transparência. Estamos extraindo as informações de todas as notas fiscais eletrônicas emitidas pelos agentes públicos no Estado, por meio de parceria com o governo estadual. São todos os valores pagos pelos nossos jurisdicionados por serviços e produtos. Com esse banco de preços, compradores públicos passarão a ter uma ferramenta útil para fazer análises comparativas. Sempre que fizerem compras, terão à disposição esse referencial do próprio mercado.

O programa “Receitas Públicas” tem feito ampla coleta de informações fiscais dos municípios. Quais os objetivos?
Trata-se do nosso segundo pilar. Atuando em parceria com as prefeituras de Minas, nosso objetivo é sair daquele modelo tradicional de atuação do tribunal, de controle sansionatório e formalista, para buscar auxiliar o gestor, especialmente o municipal, de médias e pequenas cidades, que não têm, muitas vezes, a qualificação e o conhecimento para produzir serviços de qualidade para os munícipes. Isso fica muito claro na questão da captação da receita pública. O que verificamos é que boa parte dos municípios é dependente do Estado e da União. Eles não conseguem promover política fiscal adequada para obter as receitas próprias e ser, portanto, autossuficientes na prestação dos serviços públicos com qualidade maior para o cidadão.

Como se dá o programa, na prática?
A lógica é fazer um grande levantamento, um diagnóstico de todo o quadro fiscal dos municípios em Minas. Buscamos identificar os que tenham boas práticas, que sejam referência dentro, claro, de um padrão geopolítico semelhante, e, a partir dessa referência, fazer com que municípios que não têm o mesmo desenvolvimento de política fiscal possam se mirar neles, com auxílio do Tribunal de Contas. Dessa forma, podem se preparar e modificar suas estruturas e, a partir daí, estabelecer políticas fiscais mais adequadas.

E qual é o terceiro pilar da gestão? 
É a educação. E essa área é um tema pelo qual tenho muito carinho, até por ter nascido em família pobre, no Rio de Janeiro, ter estudado sempre em escolas públicas e ter chegado onde cheguei. Como nosso universo de atuação é muito grande, escolhemos um serviço público relevante do ponto de vista social e constitucional, porque movimenta um volume de gastos muito grande. Afinal, 25% das receitas correntes líquidas dos municípios devem ser aplicados em educação. Acredito que, mais que isso, a educação é um serviço que funciona como elemento fomentador de uma nova cidadania. Com o investimento em educação, podemos obter economia em questões elementares como a saúde pública. Muitas vezes, as pessoas contraem doenças porque simplesmente não têm educação básica de higiene que seria suficiente para evitar essas doenças. E também em áreas como a da segurança pública, porque melhorando a qualificação das pessoas aumenta-se a empregabilidade na sociedade e reduzem-se os crimes contra o patrimônio.

Como se dá exatamente a atuação do tribunal nesse setor? 
A perspectiva é sair daquela atuação de simples verificação se o município, por exemplo, aplicou 25% da receita na educação, ou se o Estado aplicou valores mínimos constitucionais. Queremos avaliar os produtos desse serviço. Ou seja, os alunos estão de fato aprendendo? As escolas públicas têm as condições mínimas para que os professores possam prestar serviços de forma adequada? Esses professores recebem salários condizentes com essa nobre missão? 

De que maneira as informações estão sendo colhidas?
Tudo isso está sendo levantado por um grande diagnóstico do tribunal, com questionários e até com um aplicativo criado para celulares e já à disposição para download gratuito em iOs e Android, o “Na Ponta do Lápis”. Os dados serão tabulados, produziremos informações gerenciais importantes e, a partir de 2018, teremos parâmetros para verificar a atuação dos municípios nessa área, na prestação de contas, juntamente com outros dados, como o Ideb.

Esses dados poderão interferir na aprovação das contas das prefeituras?
Vamos traçar para os municípios um perfil de suas políticas educacionais, e sobretudo da aderência deles ao Plano Nacional de Educação. E é assim que, de fato, poderemos dizer se a política de educação de cada um está adequada ou não e se as contas devem ou não ser aprovadas. O que surpreende negativamente, até o momento, é que o aplicativo que lançamos em setembro de 2017, desenvolvido inteiramente pelos técnicos do tribunal e destinado a gestores, professores, servidores, pais de alunos e a qualquer cidadão, para que nos enviem suas impressões sobre o funcionamento das escolas, ainda está com poucos downloads. São cerca 1,8 mil, sendo que há mais de 12 mil escolas estaduais e municipais em Minas Gerais.


Mudando de assunto, o TCEMG analisa a venda de parte do controle da Codemig, pertencente ao Estado. Isso tem gerado discussões. O líder do governo na ALMG, Durval Ângelo, disse recentemente que o TCE é apenas um órgão auxiliar do Legislativo e não tem de dizer o que a Assembleia deve ou não fazer. Como o senhor vê essa questão?
Temos uma excelente relação com a Assembleia. Considero natural esse tipo de reação do líder do governo, porque é de natureza política. Claro que sob a perspectiva jurídica, a visão dele é equivocada: o TCE não é apenas um órgão auxiliar da Assembleia. Ele tem competências privativas. 

Mas a relação não fica abalada entre as instituições?
Não acho que tenhamos uma relação ruim neste momento. A relação é boa. Mas precisamos separar as coisas. A decisão política de modificar a estrutura de uma empresa pública ou de passar uma atividade econômica em parte ou totalmente para a iniciativa privada cabe ao governo e ao Legislativo. É um o que chamo de um ato político complexo. Isso é uma coisa. Outra coisa diz respeito à analise econômica disso. Em uma venda de ações ou na alienação de patrimônio, é preciso verificar se ele está ou não adequadamente avaliado em relação ao mercado. Nesse aspecto, o papel do TCE é crucial. Não estamos aqui para defender o governo A, C ou D, mas sim para defender o patrimônio da sociedade.

Como agir no caso de verificar-se que não é um bom negócio para a sociedade?
Se o tribunal percebe que, diante de um quadro técnico apontado, os valores podem não ser correspondentes aos de mercado, ou que isso possa trazer algum tipo de prejuízo à sociedade mineira, então o papel dele é de esclarecer essa questão. E foi isso que o tribunal fez, numa decisão cautelar, não de mérito, dizendo apenas que essas questões precisam ter melhor esclarecimentos. Tão logo isso ocorra, o tribunal vai tomar uma decisão: se o que está sendo pretendido é favorável ou não à sociedade, sob o ponto de vista da economicidade. 

 

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