Tudo combinado: TCE aponta direcionamento de obra do Independência

Amália Goulart
amaliagoulart@hojeemdia.com.br
14/06/2016 às 07:18.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:53
 (Flávio Tavares)

(Flávio Tavares)

O Tribunal de Contas do Estado (TCE) aponta direcionamento da obra do estádio Independência para que a construtora Andrade Valladares ganhasse a licitação, contando com o apoio da construtora Waldemar Polizzi (CWP), cujo sócio e administrador, Maurílio Bretas, está preso sob suspeita de corrupção em outra obra do Estado: a Hidroex, em Frutal, no Triângulo Mineiro.

O Hoje em Dia teve acesso, com exclusividade, a três relatórios do Tribunal de Contas do Estado no período em que a obra foi executada (de 2010 a 2012). As constatações são da equipe técnica. 

“Por todo o exposto, concluímos que todos os fatos apontam para a falta de disputa ou concorrência no processo licitatório CO.001/2011 e também pelo direcionamento dessa licitação para que a empresa Andrade Valladares Engenharia e Construção Ltda. fosse a vencedora do certame”, sustentaram os técnicos no documento.

A obra do Independência foi gestada na administração do ex-governador Aécio Neves (PSDB), hoje senador. Conforme adiantou o Hoje em Dia na semana passada, também com exclusividade, o Ministério Público pede a devolução de R$ 120 milhões gastos na reforma do estádio, por parte de ex-servidores do Estado na época, que trabalharam nas gestões de Aécio e do também ex-governador Antonio Anastasia (PSDB).

Segundo os analistas do TCE, a obra do Independência foi concebida para ser realizada em apenas uma etapa. Porém, foi feita em duas. É justamente nesta segunda etapa que foram constatadas as mais graves irregularidades. 

É a primeira vez que surge uma ligação entre a obra do Independência e uma construtora (Waldemar Polizzi) acusada de corrupção

A licitação contou com a participação de apenas três empresas. Na primeira etapa, 10 construtoras se credenciaram. Na segunda fase, duas das três concorrentes, todas de grande porte, não apresentaram documentos básicos que as habilitariam, e sequer entraram com recursos. 

“As outras duas empresas que ‘participaram’ da licitação da CO.001/2011, e que podem ser consideradas de grande porte, foram inabilitadas de forma primária, deixando de apresentar uma série de documentos usualmente exigidos em processos de habilitação, tais como: balanço patrimonial, demonstração contábil, profissional habilitado (R.T.), etc, demonstrando total descaso com o certame ou simplesmente uma participação pro forma, meramente figurativa”, diz trecho do relatório. 

A Waldemar Polizzi é uma delas. Pouco tempo após participar da licitação do Independência, a empresa ganhou um outro certame, de R$ 50 milhões, para construir um hospital em Sete Lagoas, com recursos do Estado. 

“A empresa Waldemar Polizzi foi inabilitada na CO.001/2011 por não ter apresentado cópia do certificado do PMQP-H, nível A, contrariando o subitem 4.2.2, considerado restritivo em decisão do TCE-MG 835.905/2010. Em contrapartida, essa mesma empresa, no mesmo período, foi habilitada e sagrou-se vencedora do certame para a construção do Hospital Municipal de Sete Lagoas, obra orçada em torno de R$50.000.000,00 e que também será executada com recursos do Estado”, pontua o TCE.

O sócio administrador da Waldemar Polizzi, Maurílio Bretas, foi preso no dia 30 de maio na operação Aequalis. Ele é suspeito de ter desviado, junto com outros acusados, cerca de R$ 14 milhões na obra de construção do complexo Hidroex, em Frutal. O ex-secretário Nárcio Rodrigues (PSDB) foi preso como resultado da mesma operação.

Obra pode ter tido pagamento em dobro e superfaturamento 

A obra do Independência teve suspeitas de pagamentos superfaturados. Para os técnicos do TCE, quando pensou-se em licitar mais uma etapa de obras para a conclusão do estádio, a primeira fase começou a ser esvaziada. Ou seja, serviços que constaram no primeiro contrato com a empreiteira foram repassados para o segundo contrato. Alguns deles já haviam sido pagos e até realizados. 

“À medida que a execução da primeira etapa da obra foi avançando, serviços com preços desfavoráveis à empresa contratada foram sendo suprimidos por meio de Termos Aditivos. As supressões, quase que em sua totalidade, foram realizadas nos termos aditivos 4 e 5, ou seja, quando já estava sendo planejada a licitação para a segunda etapa da obra, sendo que serviços suprimidos nos TA’s da primeira etapa foram reinseridos na planilha da segunda etapa, obviamente, com preços favoráveis (sobrepreço) à contratada, caracterizando a trama no seu aspecto mais nefasto”, disseram os técnicos.

O resultado foi que a obra do Independência, orçada em R$ 46 milhões, já alcançava R$ 120 milhões em julho de 2011. A segunda etapa da licitação chegou a ser suspensa, porém, foi retomada. O valor total da obra ficou em R$ 146 milhões. 

A Controladoria Geral do Estado também analisou o caso e constatou um dano de R$ 10 milhões ao erário.

A reportagem entrou em contato com o escritório da Andrade Valladares em Belo Horizonte. Dois funcionários, de nomes Cláudio e Márcia, não quiseram passar a ligação aos diretores. 

A reportagem questionou a Waldemar Polizzi, por email, se houve combinação entre empresas e Estado para licitações de obras públicas. A construtora não respondeu até o fechamento desta edição. 

Na época da obra, o Departamento de Obras Públicas do Estado (Deop) informou ao TCE que não houve irregularidade. 

As assessorias de Aécio e Anastasia informaram que o PSDB responderia os apontamentos. Por meio de nota, o partido informou que “inicialmente, é preciso deixar claro, o PSDB defende a apuração de quaisquer denúncias pelos órgãos competentes. Da parte do Estado, enquanto governado por membros do partido, a probidade e a transparência sempre foram prioridades. Dessa forma, durante as gestões do PSDB e aliados, nunca houve por parte do Estado qualquer direcionamento para que determinada empresa ganhasse a seleção. Importavam, sim, segundo previa o edital, o menor preço e a melhor qualificação técnica”.

 

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