O acidente do trem espanhol há quatro dias, com 80 mortos e 130 feridos, é uma dessas tragédias com grande repercussão na Imprensa. Sua carga emocional ultrapassa em muito aquela provocada pelos acidentes nas rodovias, pois estes, embora matem muito mais, se tornaram corriqueiros. Além disso, no Brasil, o acidente de Santiago de Compostela terá repercussão no projeto do trem-bala.
O trem acidentado pertence à estatal Renfe, da Espanha, cujo governo anunciou que ela e mais duas empresas espanholas entrariam no leilão do trem-bala que vai ligar as cidades do Rio de Janeiro e Campinas, passando pela capital paulista, com investimentos de mais de R$ 35 bilhões.
Ocorre que o edital do leilão obriga o consórcio interessado a ter uma empresa operadora de trens de alta velocidade, e esta não pode ter registrado, nos últimos cinco anos, acidente com vítimas “por causas imputáveis à operação do sistema”. Essa regra afasta a operadora do trem-bala chinês que há dois anos registrou acidente com 33 mortos. O governo contava com a participação dos espanhóis, além de alemães, japoneses e sul-coreanos, embora os três últimos demonstrassem pouco interesse.
É mais uma pedra no caminho do nosso trem-bala. Para removê-la, é preciso comprovar que as causas do acidente não podem ser imputadas à operadora. O trem acidentado na Espanha podia chegar a 250 quilômetros por hora, mas no local a velocidade máxima era limitada a 80. O maquinista sobreviveu e teria admitido que, por erro humano, estava acima dessa velocidade. Cálculos indicam que o trem corria a mais de 140 km/h.
Erros humanos são comuns em acidentes nas ruas e rodovias mineiras. A maioria provocada por imprudência. Como a desses motoristas que avançam sinais vermelhos na capital do Estado. A cidade tem apenas 40 semáforos equipados com detectores de avanço, e só nos primeiros cinco meses deste ano, eles registraram 111 mil avanços. Por dia, 740 motoristas são multados em Belo Horizonte por avançar o sinal vermelho, uma infração gravíssima que prevê multa de R$ 191,54 e perda de sete pontos na carteira.
Do mesmo modo que o número de sinais de trânsito sem registro de avanço é muito maior, é também o de infrações. Numa situação de tanto desrespeito às regras, não é surpresa que no primeiro semestre deste ano 5.946 pessoas tenham morrido em acidentes de trânsito na capital mineira – 74 vezes mais que no acidente do trem espanhol.