Aos 60 anos, Ritchie reflete sobre o pop rock nacional

Raphael Vidigal - Do Hoje em Dia
17/12/2012 às 12:03.
Atualizado em 21/11/2021 às 19:40
 (Cancion Produções/Divulgação)

(Cancion Produções/Divulgação)

"Cansamos de ouvir que o rock jamais decolaria no Brasil", avisa Ritchie. O cantor e compositor britânico, radicado há nada menos que quatro décadas no país, refere-se ao auge do movimento do qual foi um dos expoentes, nos anos 80. Responsável por hits como "Menina Veneno", o artista fecha com chave de ouro um ano pra lá de especial: em março, completou 60 anos de vida.

E foi em 2012 que ele gravou, pela primeira vez, um disco em que utiliza a "língua mãe". "E todos os vocais foram registrados na primeira tomada, sem precisar de segundos takes, isso nunca tinha acontecido antes", orgulha-se.

A celebrada data serviu de mote para que o cantor intitulasse o novo trabalho de "60", não apenas alusivo à particular primavera, mas como especial homenagem à efervescente década que revelou ao mundo Beatles, Rolling Stones, Beach Boys, Animals e outros. Todos estão fora do disco de Ritchie, mas não porque não tenham feito parte de sua adolescência musical. Ao contrário.

Repertório

O músico explica ter optado por um repertório "menos manjado" para não "chover no molhado". O emprego de expressões tipicamente nacionais demonstra a intimidade do cantor com o linguajar brasileiro, mas, acredite, ele ainda esbarra em conjugações e troca, com frequência, o preposto feminino pelo masculino. "Para mim é mais fácil cantar em inglês", admite.

E é dessa forma que o artista apresenta, ao público, canções de Paul Jones, Glen Campbell, The Lemon Pipers e Burt Bacharach, entre outros, priorizando as "de arranjo de cordas, 9 das 15 presentes no CD", afirma.

Origem

Richard David Court, nome de batismo, é natural de Beckenham. "Logo quando cheguei (ao Brasil), percebi que, para fazer sucesso, teria que cantar em português".

O primeiro professor foi o poeta Bernardo Vilhena, parceiro de gente como Lobão ("Vida louca vida"). Foi somente a partir do álbum "Circular", o terceiro da carreira, que Ritchie dispensou o professor a tiracolo e seguiu, sozinho, a estrada.

Além de enfileirar notáveis êxitos nas rádios, como "A Vida Tem Dessas Coisas", "Pelo Interfone", "Casa Nova" e "Voo de Coração", Ritchie trocou o papel de aluno para tornar-se mestre.

Empenhou-se em ensinar, para gente do naipe de Gal Costa, Egberto Gismonti e Paulo Moura, o próprio idioma. "Era bem divertido, porque conversávamos, invariavelmente, sobre música", rememora.

Das aulas de inglês à carreira solo, com escala no Vímana

Ritchie dá prosseguimento às suas lembranças como "teacher". Com os alunos Egberto Gismonti e o saudoso Paulo Moura, as lições acabaram se transmutando em uma espécie de "intercâmbio". "Trocava as aulas de inglês por aulas de música", relembra o artista. Já a cantora Gal Costa foi quem o incentivou a adotar o português para cantar. "Sinceramente, não acreditava que pudesse dar certo", confessa, ele, hoje. "As gravadoras não acreditavam que pudesse agradar".

Mas, contrariando as expectativas do próprio Ritchie (e do mercado), cantar em português deu certo. E não apenas para ele. Ritchie começou tocando flauta na banda de rock progressivo Vímana, onde, entre os parceiros célebres, estavam ninguém menos que os então desconhecidos Lobão (tocando bateria) e Lulu Santos (guitarra e vocais).

Nesse período, em meados dos anos 1970, não havia, segundo ele, um circuito significativo de shows direcionado ao segmento no qual apostavam suas fichas, e as apresentações se restringiam ao eixo Rio-São Paulo. O motivo? "As gravadoras não acreditavam que o gênero pudesse agradar o público brasileiro", diz.

Pop rock

Mas esse mesmo cenário se modificou bruscamente menos de uma década depois, quando no início dos anos 80, começaram a despontar grupos que mesclavam artes cênicas, letras bem-humoradas e bases elétricas.

Na carona da Blitz, comandada por Evandro Mesquita, vieram grupos como Os Paralamas do Sucesso, Titãs, Legião Urbana, Barão Vermelho e Kid Abelha, para citar alguns. Todos muito diferentes entre si, mas o filão estava aberto. "Nesse período totalizamos 139 shows em sete meses, em cidades que jamais haviam recebido um artista antes", salienta Ritchie.

Sinal dos tempos

O pequeno príncipe inglês acomodava-se entre os bardos brasileiros, ancorado na interação entre música pop e os acordes libertários de um insipiente rock. "A cultura pop é a porta de entrada que dá acesso às artes, falando uma língua simples e universal, facilmente compreendida por todos, capaz de mobilizar multidões. É, de certa forma, o sinal dos nossos tempos". Resta saber se o músico refere-se aos anos 60 ou aos 2012.

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