Belo Horizonte tem trajeto de caos e até “Forlan” destruído

Gazeta Press
24/06/2013 às 10:16.
Atualizado em 20/11/2021 às 19:24

Até Forlan ficou destruído nas imediações do Mineirão por conta dos protestos que ocorreram no sábado, dia da vitória do México sobre o Japão, por 2 a 1. Não se trata do atacante do Uruguai e do Internacional que enfrentará a Seleção Brasileira nesta quarta-feira, pelas semifinais da Copa das Confederações, e sim de um dos muitos estabelecimentos comerciais no trajeto de caos do principal estádio de Belo Horizonte.

Cristiano Henrique percorreu aquele caminho algumas horas depois da guerra travada entre manifestantes e policiais. Porteiro da concessionária de automóveis Forlan,
ele ficou boquiaberto com a destruição que encontrou ao iniciar o seu expediente, por volta de 6h30 do domingo em que a Seleção Brasileira chegou a Minas Gerais.

"Que tristeza. Ninguém quer que isso aconteça com o lugar que trabalha. Olhe só: as vidraças todas quebradas!", exclamou, apontando para os estilhaços.Não eram apenas os espessos vidros da loja homônima do atacante da seleção uruguaia que estavam destruídos ali. Sem eles, era possível observar à distância pequenas mesas de escritório reviradas, como se alguém tivesse vasculhado o local. A porta da frente (ainda bamba) ficou fechada com um trinco, a única proteção do porteiro Cristiano contra outros possíveis protestos violentos - por motivos óbvios, nenhum vendedor de veículos estava trabalhando no lugar até que os estragos fossem reparados.

"O pessoal ainda não sabe de quanto foi o prejuízo. Graças a Deus, eu não estava de plantão na noite da manifestação para dar mais detalhes do vandalismo aqui. E
olhe que sou até a favor de protestos. Desde que não haja violência, claro. O que ocorreu aqui é crime", sentenciou Cristiano Henrique, desconfiado com todos que passavam pela calçada. "Todo o mundo está assustado com a violência. Com ou sem protestos, existem assaltos, sequestros, assassinatos... O mundo está muito perigoso." Metros adiante, um grupo de moradores de rua consumia drogas ao ar livre, a algumas quadras de um posto policial, como se para comprovar o
discurso.

Apesar de todas as lamentações com a violência, o porteiro da concessionária Forlan se permitiu abrir um sorriso para dizer que os prejuízos de seus empregadores foram pequenos se comparados com os de estabelecimentos vizinhos. De fato, nenhum automóvel à venda ali estava avariado - enquanto alguns particulares, estacionados nas ruas no dia das manifestações, foram incendiados. "Desça essa avenida mais um pouquinho para você ver o que é destruição de verdade", aconselhou Cristiano.

Bastava dar alguns passos para perceber que o sujeito não estava exagerando. Os muros que circundavam aquele rastro de violência estavam poluídos com incontáveis pichações. Havia todo o tipo de reivindicações e lemas nas mensagens das paredes, desde os mais tradicionais nos tempos de manifestações (como "o gigante acordou") até aqueles contra o PT ("fora Dilma Rousseff"), contra o PSDB ("fora Aécio Neves") e em nome de causas sociais ("pela revolução agrária") e econômicas ("estabilidade financeira já").

A maioria das pichações, no entanto, criticava a repressão de policiais e os gastos para a realização da Copa do Mundo de 2014. "Fifa go home ("vá para casa")" era o pedido de uma pessoa que usou spray de tinta para se manifestar em um viaduto e pode ter sido repreendida com spray de pimenta no rosto. De acordo com a Polícia Militar (PM), o confronto de sábado resultou em 32 prisões por atos de vandalismo e deixou 37 feridos, sendo dez deles policiais.

A depredação nos nove quilômetros da Avenida Antonio Carlos, que vai da região da Pampulha, próxima do Mineirão, até o bairro de Lagoinha, quase no centro de Belo Horizonte, foi tamanha que se tornou o principal assunto de domingo na capital mineira. Em bares, restaurantes e até dentro de táxis, o tema foi a revolta popular. Havia quem apoiasse os manifestantes, quem achasse que eles conseguiriam espantar a Fifa do Brasil com as suas atitudes, quem pedisse mais truculência dos policiais e quem apenas se surpreendesse. Alguns motoristas deixaram o tráfego lento nas imediações do Mineirão porque tentavam identificar danos causados a agências bancárias ou ler pichações. Se eles acelerassem com os seus carros, não existiria risco de multa por excesso de velocidade em determinado trecho. Um radar foi arrancado do chão em frente ao campus da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que teve o seu cercado muito danificado. A placa de orientação que a Fifa colocou para indicar um acesso ao estacionamento do estádio (o letreiro foi substituído por mais uma pichação contra a polícia) também acabou entortado
no chão.

Belo Horizonte tenta agora levantar não somente seus radares e placas, mas a sua confiança em mais segurança. A PM já avisou que adotará "tolerância zero" em casos de novos protestos, para evitar mais estragos aos patrimônios público e privado - algumas agências bancárias já repuseram as suas vidraças, diferentemente da
concessionária Forlan. Lá dentro, o porteiro Cristiano continua incrédulo com a possibilidade de dias pacíficos, mesmo com a chegada do time do atacante uruguaio à cidade, para enfrentar a Seleção Brasileira. "O Forlan vem aqui, é? Coincidência... Mas as coisas só vão piorar - e muito - com o Brasil no Mineirão", previu, enquanto já usava a sua chave para rodar o trinco e fechar a loja destruída.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por