Brasil vive boa fase de bandas psicodélicas

Estadão conteúdo
11/11/2015 às 11:18.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:26

Em uma palestra sobre a psicodelia brasileira no Unibes Cultural, em São Paulo, há duas semanas, o jornalista e pesquisador musical Fernando Rosa surpreendeu os presentes com sua percepção sobre o gênero no Brasil. "Para mim, ela não existiu. Quem 'inventou' a psicodelia brasileira foi a geração dos anos 2000", explicou o também curador do festival El Mapa de Todos. "É claro que existiu a incidência de uma linguagem psicodélica na música brasileira dos anos 1960. Mas ela não se caracterizou como psicodelia conceitualmente, como aconteceu em Londres, com Pink Floyd, e em São Francisco, com Grateful Dead. Existiam conceitos mais fechados."

E é uma geração pós-2000, que está mais perto dos 20 e poucos anos do que dos 30, a responsável por não apenas reviver o gênero e descobrir discos clássicos - basta lembrar dos casos dos anteriormente renegados como Paebiru (de Lula Côrtes e Zé Ramalho) e a fase psicodélica de Ronnie Von -, como por repaginar o estilo, ao som de grupos contemporâneos, como é o caso do Tame Impala. São eles, os australianos, os grandes nomes desse movimento, que já atinge escala global. Transformou-se de projeto caseiro do vocalista e multi-instrumentista Kevin Parker a banda com nome de maior destaque em um festival como o Lollapalooza Brasil. Esse percurso, do quarto ao palco, é um caminho comum por aqui.

Assim como o Bike, grupo paulistano que surgiu como projeto solo do músico Julito Cavalcante e acabou se tornando um quarteto de fato, o My Magical Glowing Lens nasceu das noites insones de Gabriela Deptulski. Enquanto terminava o mestrado, num momento "extremamente racional", como ela diz, a moça decidiu desanuviar. "Lembro que ouvia Tame Impala na época. Quando descobri que o Kevin Parker gravou tudo sozinho no quarto, fiz o mesmo."

O MMGL é mais delicado e gentil que a psicodelia da banda australiana. As canções de Gabriela, lançadas no EP que leva o nome do grupo nos últimos dias de 2013, também soam extremamente pessoais. São como se os sonhos da insone cantora se construíssem no formato de canções, com linhas de bateria programada, enquanto as camadas de vozes e guitarras ecoavam baixinho pelas madrugadas em Vitória.

Diferentemente de outros grupos deste novo berço psicodélico, o My Magical Glowing Lens mantém as letras em inglês. "Ouvi muita MPB quando era mais nova, por causa dos meus pais. Quando componho em português, acaba ficando parecido", ela explica. "Mas nunca paro de tentar." A carioca The Outs tem dois discos cantados em inglês, mas promete um terceiro - o mais viajante deles - na língua mãe. "Está sendo um desafio daqueles", diz Dennis Guedes, baixista e vocalista do quarteto. O Outs bebe diretamente em fontes inglesas, filhos de uma linha genealógica que nasceu em Beatles e chegou a The Verve.

Há ainda o curioso caso da Bombay Groovy, banda instrumental cujo "vocalista" é o sítar, instrumento indiano que conduz a melodia do grupo paulistano. Rodrigo Bourganos, responsável por executar o instrumento, entende que a psicodelia é vantajosa justamente por não precisar se encaixar em outros gêneros. "Sempre me interessei por músicas que não tenham limites."

A última banda brasileira a fazer sucesso no exterior antes do Boogarins foi o Cansei de Ser Sexy, mas os versos em inglês era um facilitador. O que surpreende é o fato de Boogarins e Bike, as duas que caíram recentemente nas graças dos gringos, cantarem em português. Para Pedro Souto, da pesada e ainda psicodélica Almirante Shiva, de Brasília, é uma herança de Os Mutantes. "Eles mostraram como fazer um bom rock com boas letras em português", diz o baixista. "Quando você acha que a psicodelia acabou, ela volta," brinca Rosa. "Por isso, brinco que essa geração inventou a psicodelia. Eles, na verdade, a redescobriram."


As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
http://www.estadao.com.br

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por