A crise e a disparada do dólar não afastaram os brasileiros das agências de turismo e do avião. Tanto que o setor espera para 2015 crescimento de 5%, na comparação com o ano passado. Porém, o consumidor está mais cauteloso. Seja nas férias, seja no feriadão de fim de ano, a viagem já não é mais para o lugar dos sonhos, mas para o destino que cabe no bolso.
“Com a recessão econômica e a incerteza política, acreditávamos que o ano seria muito ruim. Então crescer 5%, mesmo em um contexto de inflação de quase 10%, é um resultado positivo para o setor”, afirma o vice-presidente Administrativo da Associação Brasileira das Agências de Viagem (Abav), Edmar Bull.
Nada que lembre o ritmo do faturamento nos anos de 2012 e 2013, cujos aumentos chegaram próximos de 20%. Mas o resultado é melhor que o de 2014, período em que o segmento sofreu impacto negativo da Copa do Mundo e das eleições, e fechou no zero a zero.
“Os dados até setembro deste ano são crescentes. E geralmente o segundo semestre é melhor que o primeiro, já que o final do ano é considerado alta temporada”, diz. Segundo o presidente da Abav nacional, o momento é de adequação do tipo de passeio ao orçamento.
Famílias que normalmente ficariam 15 dias viajando reduziram o tempo para 8 ou 9 dias. Também tem muita gente mudando o hotel por um mais em conta. E quem não comprou passagens ou pacote para o exterior acaba optando por um destino dentro do país”, afirma.
Ocupação
Os resorts nas praias do Nordeste, por exemplo, estão com quase 75% de taxa de ocupação para o Natal e o Réveillon. Já o número de viagens para Estados Unidos e Europa só não caiu mais por causa da quantidade de promoções de passagens realizada pelas companhias aéreas.
“Com a oferta maior que a demanda, a saída encontrada pelas empresas foi promover alterações nas rotas e fazer ofertas com preços mais baixos”, diz Edmar Bull.
Presidente da Abav em Minas, José Maurício de Miranda Gomes afirma que a alta do dólar, que chegou a romper a barreira dos R$ 4, mudou o comportamento do turista. Até a bagagem foi afetada.
“Percebemos uma migração do internacional para o nacional. E com a crise instalada, mesmo os consumidores que vão viajar pelo país terão certa dificuldade para manter o mesmo patamar de gastos e compras”, afirma.
Segundo ele, mesmo na última hora, ainda há opções para quem deseja curtir o Natal, Réveillon ou férias escolares no litoral brasileiro ou no Sul do país.
“Os resorts do Nordeste estão com um nível satisfatório de ocupação. Mas ainda há vagas e preços interessantes. Outra opção são as Serras Gaúchas, em especial a cidade de Gramado, onde a festa natalina começa em novembro e só acaba em fevereiro. E Porto Seguro, que já era um destino queridinho e barato, vem batendo todos os recordes”, diz Gomes.
Roteiros nacionais ganham a preferência do consumidor
Uma das maiores operadoras de turismo do país, a CVC diz que, tradicionalmente, as viagens nacionais costumam representar 60% do volume de vendas da empresa ao longo do ano, contra 40% das viagens rumo ao exterior. Mas a escalada da moeda norte-americana em relação ao real mexeu com esses percentuais.
Neste ano, os destinos brasileiros ganharam incremento de 5% no 1º semestre, somando 65% da preferência dos clientes nas vendas de pacotes. Já a fatia das viagens internacionais encolheu para 35%.
“Tendo passado por mais de 20 crises e trocas de planos econômicos, a CVC destaca que o brasileiro já incorporou o hábito da viagem em seu orçamento doméstico e o encara como merecimento. Se antes a viagem era vista como supérflua, hoje os dados da operadora mostram que ninguém deixa de viajar”, destacou a empresa, por meio de nota.
A gerente de Lazer da Master Turismo, Alexandra Peconick, afirma que também percebeu uma “pequena” migração dos destinos internacionais para os nacionais.
“Tem cliente que é mais sensível a preço. Outros não sentem tanto”, diz. Segundo ela, apesar do ano “tenso”, a empresa trabalha para manter o mesmo nível de negócios de 2014.
“Muita gente tem procurado pacotes para o Natal, Réveillon e férias de janeiro. E as praias do Nordeste estão entre as preferidas”, afirma. Alexandra diz que ainda há vagas para todos os destinos, o que muda é o preço.
“Sempre tem lugar, mas quem deixa pra última hora acaba pagando um pouco mais caro”, afirma.
Na Master, u m pacote para Maceió, em janeiro de 2016, com duração de sete noites, aéreo e estadia em hotel 3 estrelas, por exemplo, custa em torno de R$ 1.965 por pessoa.
Pacotes mais curtos viram opção para quem vai ao exterior
O câmbio não espantou todos os turistas. Mas obrigou vários deles a cortar despesas e reprogramar gastos. Também vale trocar um destino fora do país por outro também no exterior, porém com preços mais competitivos ante o real.
Na CVC, os clientes que não abrem mão dos planos de atravessar o continente têm priorizado pacotes mais curtos e econômicos, com opções de hospedagens em hotéis e resorts do Caribe com sistema “all incluse”, que elimina gastos extras com alimentação.
“A mudança no comportamento do consumidor exigiu que a CVC adaptasse os roteiros internacionais”, diz, em nota.
A adaptação também foi necessária em solo tupiniquim. A próxima temporada de cruzeiros no Brasil, cujos pacotes são cotados em dólar, terá mais de 50% dos roteiros em formato de “mini cruzeiros”.
Na Beth Coutinho Viagens, especializada em intercâmbio, a ordem é facilitar o pagamento, parcelar sem juros e até usar câmbio fixo da data de entrada para as demais parcelas. “Temos opções para Canadá e Nova Zelândia, países que têm o câmbio significativamente mais baixo que destinos que trabalham com dólar americano”, diz o gerente de Marketing da agência, Felipe Caputo.
O consultor financeiro Ewerson Moraes afirma que a compra com antecedência é sinônimo de economia. Outra forma de gastar menos é optar por destinos mais em conta, como Chile, Argentina, Portugal e Leste Europeu.
A relações internacionais Paula Calixto e a mãe Maria Helena compraram tudo antes e embarcaram nas férias para Praga, Lisboa e Porto. “Valeu cada centavo”, diz a filha, que fugiu das compras com cartão de crédito.