No apagar das luzes na Câmara Federal, base aliada e oposição entraram em acordo e os deputados aprovaram, por 296 votos a 12, a renegociação da dívida dos estados, já com a inclusão do regime de recuperação fiscal para os mais endividados. Contrariando a determinação do presidente Michel Temer, os parlamentares retiraram do texto o “pacote de maldades” para quem aderir ao programa, fato que caiu como um presente às vésperas do Natal.
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O governo de Minas Gerais, que não iria aderir ao refinanciamento devido às contrapartidas impostas pelo governo antes das alterações no projeto, pode, agora, adotar o programa. O projeto segue para sanção ou veto de Temer.
De acordo com o novo texto, o regime de recuperação fiscal suspende por três anos o pagamento da dívida de Estados em calamidade fiscal, mas as contrapartidas serão determinadas por meio de projeto específico nas Assembleias Legislativas.
Independência
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu a votação e a independência do Congresso frente ao Executivo. “Não precisamos dizer ‘amém’ ao Ministério da Fazenda. Temos que votar o texto que entendemos que é o melhor para o Brasil. Se o presidente Michel Temer entender que não é o melhor para o Brasil, ele veta. O que não podemos é convocar os deputados e não votar nada”, disse.
O deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), que passou os últimos dias articulando o desmonte do pacote de maldades junto a outros políticos, acredita que Temer sancionará o projeto.
“Acho que o presidente não veta porque ele não iria brigar com a base, principalmente em um momento delicado como este”, disse.
Na noite de segunda-feira, Ramalho se reuniu na casa dele com os governadores do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB), e do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), para discutir o projeto.
Ontem pela manhã, ainda conforme Ramalho, os três se reuniram na casa do presidente da Câmara para dar continuidade à reunião. “Sempre em contato com o governador de Minas, Fernando Pimentel”, afirmou.
Antes das alterações
Um dos principais pontos de conflito entre governo e deputados antes das alterações, o texto previa ainda que, durante a moratória, os Estados ficariam proibidos de conceder reajustes aos servidores, criar cargos, realizar concursos públicos (exceto para suprir vagas), criar despesa obrigatória de caráter continuado e gastar com publicidade oficial (exceto para saúde e segurança). Todos os pontos foram retirados do relatório.
Pouco depois, o relator da matéria, deputado Esperidião Amin (PP-SC) apresentou novo parecer, sem as contrapartidas que foram incluídas pelo Senado. O projeto também aumenta em até 20 anos o prazo para renegociação geral das dívidas de Estados e do Distrito Federal com a União.
Pimentel comemora aprovação e elogia atuação de deputados
O governador Fernando Pimentel comemorou a aprovação do projeto com texto alterado. Ele exaltou a atuação dos deputados federais, que, articulados, conseguiram dar mais atratividade ao programa de refinanciamento das dívidas, sem afetar os servidores públicos.
“Tivemos uma ajuda importante da Câmara Federal aprovando o programa de recuperação fiscal para os estados. Mas a aprovação foi feita limpando o Projeto de Lei que estava lá, dos absurdos e das exigências descabidas que haviam sido colocadas pelo governo federal e que a Câmara, com muita sabedoria, soube tirar”, afirmou o governador.
De acordo com ele, a alteração no projeto assegura os direitos dos servidores. “Nenhum servidor vai ser afetado por mudanças bruscas e (o projeto) garante também a soberania do Estado. Não seremos forçados a privatizar, a vender empresas, a nada do que antes constava no projeto. Houve um esforço grande da bancada mineira, a bancada do PT participou deste esforço para garantir a MG condições de retomar o seu crescimento com hegemonia, com tranquilidade, sem ferir os direitos dos servidores públicos e garantindo um serviço público de qualidade. Esta era a nossa grande preocupação”, disse.
Temer
O líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), afirmou que o presidente Michel Temer vai fazer uma análise do texto da renegociação da dívida dos Estados e do regime de recuperação fiscal que foi aprovado ontem, na Câmara, e segue para sanção presidencial.
“O governo vai fazer uma análise daquilo que foi aprovado. O governo cumpriu sua parte no acordo, mobilizou sua base, trabalhou para trazer socorro ao estados nesse momento de crise, contando com essas contrapartidas. A Câmara modificou essas contrapartidas e o governo vai fazer uma análise disso”, afirmou Moura.
O presidente tem a prerrogativa de vetar artigos, parágrafos ou a íntegra do projeto. Moura não afirmou, nem negou claramente, se Temer irá vetar algum trecho da proposta.
“Não adianta o governo socorrer os Estados se eles não cumprirem com sua parte e não tiverem as ferramentas para poder impor os limites para não gastar mais do que arrecadam”, disse Moura.
Pela manhã, policiais reduziram patrulhamento e foram às ruas
Antes de a Câmara votar o refinanciamento dos Estados e jogar por terra as contrapartidas exigidas pelo governo federal, policiais militares protestaram pelas ruas de Belo Horizonte contra a retirada dos direitos da categoria e fizeram uma “operação tartaruga”, com o postergação de várias ocorrências. O trânsito ficou complicado em toda cidade.
“Na operação, algumas pessoas ficam aquarteladas (dentro do quartel) e outras vão para as ruas. Porém, o patrulhamento não é realizado com o mesmo afinco”, explicou o presidente da Associação dos Praças, Policiais e Bombeiros Militares (Aspra), Marco Antônio Bahia. Segundo ele, cerca de 3 mil policiais participaram da “operação tartaruga”.
Os servidores ocuparam a praça da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e seguiram para a Praça da Liberdade, onde permaneceram por cerca de 5 horas, até a aprovação do projeto. Este foi o segundo protesto dos policiais contra a proposta, que previa, entre outras medidas, o congelamento dos salários dos servidores, a proibição de promoções e recrutamentos e o aumento do desconto para a previdência.
Em entrevista coletiva, o comandante-geral da Polícia Militar, Marco Antônio Badaró Bianchini, antecipou a decisão da Câmara dos Deputados e garantiu que a corporação não entraria em greve.
Bianchini rebateu a informação de que os militares estariam aquartelados, ou seja, sem realizar o serviço de patrulhamento nas ruas, como forma de protesto, como diziam mensagens de áudio e textos enviados à população nos últimos dias.
No final da tarde, após a aprovação do projeto sem a contrapartida dos estados, a corporação comemorou os resultados.
Em mensagem de áudio no WhatsApp, o capitão Santiago, em nome do comandante-geral, afirmou que foi grande conquista. “Gostaria de agradecer a todos que contribuíram para isso”.