Depois de três anos de dificuldades e centenas de lojas fechadas, o comércio varejista esboça uma retomada. As vendas no Natal superaram as expectativas dos próprios empresários – incremento de 4,51% ante uma estimativa de 1,42% quando comparado com 2016 – e o mês de janeiro registrou uma acréscimo de 1,64% em relação ao mesmo mês de 2017. Os números são da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), cujo presidente, Bruno Falci, mostra-se confiante na constância destes índices positivos ao longo do ano. Ele projeta um crescimento de 3% neste ano, quando comparado a 2017.
Em seu segundo mandato à frente da entidade, Falci tem inserido a CDL-BH em diversas questões e sabe que aspectos da vida cotidiana, como a mobilidade urbana, estão ligados à cidadania e à qualidade de vida, mas têm relação direta com os 12 mil associados que representa. E, mesmo preocupado com os escândalos políticos e a probabilidade de uma eleição acirrada com seus reflexos na economia nacional, Falci aposta na retomada do crescimento econômico, depois de dois anos de recessão. Em 2016, a queda foi de 1,49% e em 2016 a atividade varejista recuou 4,34%
Nesta entrevista, ele detalha o que fez o comércio mostrar sinais de revitalização e fala como a CDL-BH lida com as grandes questões nacionais, mas sem deixar de lado os problemas pontuais da cidade.
O números de crescimento do mês de janeiro sinalizam sustentabilidade ou refletem algum elemento pontual, como a compra de material escolar, típica desta época do ano ou ainda algum reflexo do movimento de Natal?
Nós terminamos o ano bem melhor do que começamos. E esta melhora percebemos que é constante. Você citou o período de volta às aulas, só que no ano passado também tivemos volta às aulas e não registramos os mesmos índices. O mais importante é que este incremento já ocorre em comparação a outro período de crescimento. Por que crescer em cima do ano anterior, que foi ruim, é quase nulo. Mas podemos concluir que os indicadores mostram consistência.
Quais são as estimativas para todo o ano de 2018?
Temos projeções de um crescimento em torno de 3%, em relação ao ano de 2017.
Como o senhor se sente, então: cauteloso ou otimista com relação aos próximos meses?
Evidentemente que a economia ainda está fragilizada. De 2014 até o ano passado houve uma queda muito brusca. Mas começamos um processo consistente de retomada. Mas para voltar aos índices de 2010 a 2013, somente no ano de 2020. No entanto, estou confiante de que o Brasil vai melhorar. Todos os indicadores mostram esta tendência de retomada.
Para o comércio varejista, a próxima data comemorativa é o Dia das Mães (em maio), a segunda data mais importante em vendas em todo o ano. Já podemos arriscar alguma projeção?
Ainda é prematuro falar, mas com certeza também registraremos crescimento. No entanto, o Brasil ainda está muito agarrado aos escândalos. Temos bons indicadores econômicos. Mas aí vem o escândalo que pegou o político tal roubando... E isso infelizmente afeta a economia.
Mas isso afeta o humor e a confiança, não o desempenho da economia.
Mas na hora que afeta o humor, você como consumidor e trabalhador pensa no que iria comprar e desiste, pois não sabe o que vai acontecer com seu emprego ou com sua empresa. Então, muita vezes, você dá um passo para trás e deixa de investir e consumir. E isso impacta na economia.
Ainda temos a questão da inadimplência que está em queda, mas está em patamares muito altos.
Em primeiro lugar a inadimplência é muito cíclica. No início do ano é quando ela volta a crescer por conta das dívidas do final e do início do ano: além das compras de final de ano, temos os impostos na virada, compra de material escolar, viagens de férias e até o Carnaval. Mas quando se aproximam os últimos meses do ano ela cai.
São os consumidores querendo limpar o nome para voltar a ter crédito no Natal?
Querer limpar o nome a pessoa sempre vai querer. Mas no final do ano é quando ela começa a ter mais condições, pois já pagou os impostos e está na expectativa de receber o 13º salário. Assim a inadimplência oscila.
O senhor citou o Carnaval. Este período trouxe que tipo de retorno para os lojistas ou esta época é mais vantajosa para os setores ligados ao entretenimento, como bares, restaurantes e hotéis?
Há uns quatro ou cinco anos todo belo-horizontino viajava no Carnaval e nenhum turista vinha para Belo Horizonte. Então a cidade desidratava. Mas nos últimos anos, as pessoas deixaram de viajar e aumentou o fluxo de turistas com a economia girando aqui, o Carnaval de BH virou um negócio. Num primeiro momento estes setores de entretenimento são os primeiros beneficiados. Mas a coisa se expande. Por exemplo, o setor onde atuo como empresário que é o de material de construção. Não vendi nada durante os dias de Carnaval – mesmo porque a legislação não me deixa funcionar –, mas antes os bares tiveram que passar por alguma reforma para receber clientes, ou o dono ganhou algum dinheiro e decidiu ampliar as instalações depois do Carnaval. Da mesma forma os hotéis que além da reforma tiveram que adquirir novas roupas de cama, por exemplo. Tudo isso, com certeza, movimentou a economia.
Podemos verificar esta movimentação estatisticamente falando?
Ainda não temos os indicadores de fevereiro, mas com muita probabilidade o mês vai ser bom em relação a 2017. No ano passado o Carnaval foi no final do mês de fevereiro e início de março. Este ano foi no meio do mês. A melhor avaliação seria comparar fevereiro e março deste ano com o mesmo período de 2017. Mas ainda não finalizamos as estatísticas relativas ao mês de fevereiro.
Em que sentido os problemas como a segurança e com a mobilidade urbana têm afetado o comércio varejista? E o que a entidade tem feito?
As duas questões são bandeiras nossas. Estamos toda hora discutindo soluções para o trânsito e o transporte coletivo. Sempre vemos alguns governantes com propostas de tirar os carros da ruas. Quem tem prazer em dirigir em BH ou em qualquer grande capital? Acho que ninguém vai achar ruim de tirar os carros desde que se ofereça um transporte público ágil e seguro.
Ultimamente registramos novos problemas com o excesso de camelôs no hipercentro e tentativas de solucionar o problema, que é complexo. Qual é a posição da CDL, já que muitos lojistas se queixam de concorrência desleal?
Sempre participamos de medidas em busca de solução. Mas, o que está atrás de um camelô, de um vendedor ambulante ou de um morador em situação de rua? Pode estar a necessidade de ganhar um dinheiro de uma forma honesta, pode ter o objetivo de desovar um produto roubado, pode ter relação com produtos importados de forma irregular, venda de droga, etc. Isso afeta diretamente tudo o que está ao redor dos camelôs. O Poder Público tem de tomar a melhor atitude possível. Em frente a uma loja, a portaria de um edifício residencial é lugar de ficar um morador de rua ou uma banca de camelô? Ou então a Prefeitura para de cobrar IPTU. Se eu não estou podendo exercer o meu papel de morador ou o meu papel de comerciante ela não pode me cobrar. <EM>
O comércio eletrônico não para de crescer. O Dia do Consumidor, comemorado na última semana, é liderado por empresas deste setor. Ele traz algum tipo de prejuízo ao comércio varejista? Como os lojistas mais tradicionais lidam com isso?
Não adianta remar contra a maré. Ele veio para ficar e o comércio tradicional tem de se adaptar e tirar proveito. Como se diz hoje: tem de estar plugado e antenado. Mas, questiono: também não é um mercado fácil. Quantas redes poderosas embarcaram nas vendas pela internet e não deram conta?