CPI do Senado pede indiciamento de ex-presidente da Vale e outros 13 por homicídio em Brumadinho

Daniele Franco (*)
02/07/2019 às 17:50.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:22

(Corpo de Bombeiros/Divulgação)

Se depender da CPI do Senado Federal que investigou o rompimento da barragem em Brumadinho, o ex-presidente Fábio Schvarstman e outros membros da diretoria da Vale devem ser indiciados por homicídio culposo. O relatório apresentado nesta terça-feira (2) foi aprovado no início da tarde e ainda propõe o indiciamento dos engenheiros Makoto Namba e André Jum Yassuda, da empresa de consultoria alemã Tüv Süd, pelo mesmo crime. Reprodução / N/A

Organograma mostra funções de possíveis indiciados na Vale. As sugestões da CPI são os coloridos de laranja

Além das pessoas físicas, o relatório lido pelo relator senador Carlos Viana (PSD-MG) pede o indiciamento da Vale, operadora da mina, e da Tüv Süd, responsável pelo laudo de estabilidade da barragem que se rompeu em 25 de janeiro deste ano.

O relatório propõe que os indicados respondam crimes culposos (sem intenção) de homicídio, lesão corporal e de destruição de flora de preservação permanente e de Mata Atlântica; e de poluição culposa, que provoca a mortandade de fauna e flora, com inviabilização de área para ocupação humana.

O senador Jorge Kajuru (PSB-GO), no entanto, questionou os pedidos de indiciamento por crimes culposos. Para Kajuru, diante da gravidade dos fatos, os indiciados devem responder por prática de dolo eventual, ou seja, quando a pessoa, mesmo sem desejar o resultado delituoso, assume o risco de produzi-lo.

“Todos os diretores, gerentes e técnicos poderiam ter agido para evitar a tragédia, e isso foi confessado aqui expressamente. É de clareza solar que, após a tragédia de Mariana [MG], eram previsíveis os resultados das condutas que levariam ao rompimento de outra barragem de rejeitos. Houve deliberada opção pelo descumprimento de regras mínimas”, disse Kajuru.

Viana concordou em alterar o relatório, trocando crime culposo por dolo eventual, se assim fosse decidido pela comissão. “É um trabalho feito por toda a CPI. Nós apresentaremos conjuntamente, porque é um trabalho nosso. Será aceito com muita humildade”, disse o senador. Ele, no entanto, alertou sobre a importância de se fazer um relatório com base em critérios técnicos. Mesmo aceitando a sugestão, Viana afirmou que ainda não existe embasamento técnico para caracterizar dolo eventual.

Considerado um dos maiores desastres ambientais ocorridos no país, a queda da barragem em Brumadinho causou a morte de centenas de pessoas, deixou dezenas de desaparecidos e poluiu o Rio Paraopeba, afluente do São Francisco, atingido pela lama de rejeitos da estrutura rompida.Corpo de Bombeiros/Divulgação / N/A

Tragédia aconteceu no dia 25 de janeiro e até hoje bombeiros buscam desaparecidos na lama

Defesas

A Vale foi procurada e afirmou discordar da sugestão da CPI. "O relatório recomenda os indiciamentos de forma verticalizada, com base em cargos ocupados em todos os níveis da empresa. A Vale considera fundamental que haja uma conclusão pericial, técnica e científica sobre as causas do rompimento da barragem B1 antes que sejam apontadas responsabilidades", informou, em nota. 

Já a Tüv Süd informou que não vai se pronunciar acerca do relatório e que continua à disposição das autoridades e instituições para esclarecer os fatos. Embora como empresa a Tüv Süd não tenha se pronunciado, o advogado dos engenheiros, Augusto de Arruda Botelho, afirmou que considera a sugestão de indiciamento precipitada e que o relatório apresentado está incompleto e traz afirmações que não condizem com a realidade atual das investigações.

David Rechulski, que assina a defesa de Gerd Poppinga, Luciano Siani, Lúcio Cavalli e Silmar Silva, afirmou que não vai se pronunciar sobre o caso no momento. O advogado Leonardo Salles, que responde por Rodrigo Melo e César Grandchamp também não se manifestou. As defesas dos demais, incluindo a de Schvartsman, foram procuradas, mas não foram encontradas pela reportagem. 

Legislação

O documento, com 398 páginas, sugere ainda três projetos que tratam de crimes ambientais, da segurança de barragens de mineração e da tributação da exploração de minérios no país. No caso da proposta sobre segurança de barragens, a CPI dá prazo de 10 anos para descomissionamento das barragens em operação e de cinco anos para as inativas. Entre outros pontos, a proposta estabelece direito à indenização do imóvel quando o proprietário ficar 30 ou mais dias afastado por risco de rompimento da barragem.

“Todos conhecemos as dificuldades para tramitação de uma proposição no Congresso Nacional até que se transforme em lei. Naturalmente, num tema como esse, que mobiliza poderosos interesses, as dificuldades serão ainda maiores. Será necessário um longo trabalho não apenas dos parlamentares, mas de toda a sociedade brasileira comprometida para que não se repitam os erros do passado”, ressalta Viana no relatório, acrescentando a importância do empenhado em fazer com que essa tramitação seja “tão célere quanto demanda a gravidade do cenário”.

Sobre a tributação de minérios, o projeto cria uma “participação especial” aplicada à receita líquida das mineradoras, com alíquota máxima de 40%, como no modelo de royalties do setor petrolífero.

Já no que diz respeito a crimes ambientais, o relatório propõe a tipificação de dois novos: “dar causa a desastre ecológico de grande proporção ou que produza estado de calamidade pública”. Nesses casos, a pena pode variar de um a dois anos de detenção e multa, se o crime for culposo. Se doloso, além de multa, a pena de reclusão é maior: dois a oito anos.

O outro tipo penal é o de “dar causa a rompimento de barragem”, com penas que variam de um a cinco anos de reclusão mais multa, a depender de ser culposo ou doloso. O projeto prevê ainda agravantes em casos de maior impacto econômico, social ou ambiental com pena de três a oito anos de reclusão.

Com a aprovação do relatório, a CPI encerrou seus trabalhos. Agora, a comissão encaminhará suas conclusões à Polícia Federal, à Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, ao Ministério Público da União, ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais, ao governador de Minas Gerais, ao Ministério das Minas e Energia e ao Ministério do Meio Ambiente.

Com Agência Brasil

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