Dívida dramática: um possível governo Temer enfrentará o desafio de desarmar a bomba relógio

Tatiana Moraes e José Antônio Bicalho
tmoraes@hojeemdia.com.br e jleite@hojeemdia.com.br
08/05/2016 às 09:27.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:19

(Arte HD)

Com chances reais de assumir a presidência da república na próxima quinta-feira (12), o peemedebista Michel Temer, caso venha a ser empossado, enfrentará na economia uma série de desafios de curtíssimo prazo, mas não poderá perder foco na bomba relógio representada pela dívida pública. 

Fora de controle, o atual ritmo de crescimento da dívida projeta para um futuro não muito distante a inviabilização econômica do país, o calote, a fuga de capitais e a expulsão do Brasil do mercado internacional de crédito, o que afetaria não apenas o governo, mas também todas as empresas tomadoras de recursos no exterior e, por contágio, a economia como um todo.

Ainda existem tempo, ferramentas e relativa confiança internacional para reverter a marcha da dívida e, principalmente, o crescimento brutal de sua equivalência com o Produto Interno Bruto (PIB). O desafio, no entanto, é colossal e as possíveis políticas a serem empregadas dividem opiniões entre economistas e especialistas. 

Escalada
Em março, a dívida pública ultrapassou os R$ 4 trilhões, atingindo uma equivalência de 67,3% do PIB, uma enormidade para um país em desenvolvimento como o Brasil, que atualmente pratica a mais alta taxa de juro do mundo.

Vale lembrar que o Japão, por exemplo, deve mais de duas vezes o próprio PIB e não enfrenta problemas de administração da dívida. Acontece que os juros pagos pelo país sempre estiveram próximo do zero e recorrentemente são negativos, como acontece agora. Os Estados Unidos também possuem relação entre a dívida e PIB muito superior à brasileira, mas também pagam juros civilizados. 

Já o Brasil, que hoje é classificado em grau especulativo por todas as grandes agências de risco, precisa pagar prêmios altíssimos para conseguir rolar sua dívida (veja infográfico).


Déficits e juros
A bola de neve da dívida brasileira cresce por conta da taxa de juro e também porque o governo não consegue fazer superávit há quase dois anos. Os déficits recorrentes estão sendo financiados com a emissão de mais dívida. Além disso, como não sobra dinheiro para o pagamento dos juros, estes estão sendo progressivamente incorporados ao principal.

Nos últimos doze meses até abril, o déficit nominal, ou seja, o que o país arrecadou menos aquilo ele gastou, já contando o pagamento dos juros, foi de R$ 579,3 bilhões, o equivalente a 9,73% do PIB.

Soma-se a isso a enorme queda do PIB ­ de 3,6% no ano passado e, possivelmente, de mais de 4% neste ano ­, que faz com que a relação entre dívida/PIB exploda (veja a evolução no infográfico).


Regras do salário mínimo e Previdência podem ser alteradas

Os meios são polêmicos, mas é unânime a necessidade de estancar o crescimento da dívida e fazê-la voltar a cair o mais breve possível. Ao reduzir a dívida, o governo recupera a confiança do mercado e dos agentes econômicos, o que é fundamental para que as empresas voltem a investir e a economia, a crescer. 

É neste sentido que apontam os vagos sinais emitidos até agora por Temer e por Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central do primeiro governo Dilma Rousseff, cotado para ministro da Fazenda de um possível novo governo. O desafio é aplicar a fórmula correta. Meirelles tem perfil ortodoxo e é adepto das políticas contracionistas, que focam o reequilíbrio das contas públicas em detrimento do crescimento. Se for fiel ao que sempre defendeu, adotará medidas duras de cortes de gastos e custos da máquina pública e trabalhará pela flexibilização da legislação trabalhista, pela reforma da previdência e por privatizações. 

9,7% é quanto equivale o déficit nominal acumulado pelo governo, em relação ao PIB, em 12 meses até abril

Privatização
O Coordendor do Curso de Administração do Ibmec, Eduardo Coutinho, é um defensor de reformas profundas. Entre as mudanças classificadas como cruciais pelo professor do Ibmec está a privatização de tudo o que for infraestrutura no país. O especialista avalia que ao privatizar ou fazer Parcerias Público Privadas (PPP), o Estado tira das próprias costas o peso de gerenciar obras e serviços essenciais para a população. 

Outro caminho seria a redução da máquina pública. Há duas semanas, Temer sinalizou a redução de sete ministérios caso assuma a presidência.
Na avaliação do coordenador do curso de Economia do Ibmec, Marcio Salvato, cortar ministérios é mais uma medida política do que econômica. “A economia seria pequena. O que tem de ser feito mesmo é cortar todos os cargos comissionados”, afirma. 

Previdência
A possibilidade de achatamento das aposentadorias e pensões também é grande. O recém lançado programa econômico do PMDB, nomeado ‘Uma ponte para o futuro’, prevê a desindexação do salário mínimo e a desvinculação entre este e os benefícios da previdência. 

Hoje, o benefício não pode ser menor do que R$ 880, o que pode mudar. “Quem ganha o mínimo sempre tem um reajuste maior, enquanto quem recebe mais tem um reajuste menor e acaba sendo engolido pelo mínimo”, afirma o coordenador do curso de Economia.


Economista heterodoxo diz que a saída é por outro lado

As saídas para redução da dívida não se restringem a cortes. Promover o crescimento, a arrecadação e, consequentemente, a capacidade de pagamento do governo é o que defende economistas não ortodoxos.

A redução da taxa básica de juros no curto prazo seria uma dessas medidas, segundo o professor da escola do Legislativo e ex-secretário adjunto de Fazenda do governo de Itamar Franco, Fabrício Augusto de Oliveira. Ele afirma que a diminuição radical da Selic, hoje em 14,25%, seria fundamental para reduzir o custo da dívida.

Além disso, defende taxas baixas para incentivar o consumo, o ritmo de produção industrial, o investimento produtivo e a criação de emprego. A arrecadação viria a reboque.

“Privatizar estatais, diminuir o poder do Estado na economia, desobrigar investimentos mínimos em educação e saúde e mexer nos benefícios da previdência ou dos aposentados têm impacto na parte mais fraca da população”, ressalta.

Grandes fortunas

Outra ferramenta para elevar a arrecadação, afirma Fabrício, seria a taxação de grandes fortunas. Hoje, conforme afirma, o grosso da arrecadação vem dos impostos indiretos pagos pela classe média e os mais pobres.

Para as grandes fortunas, os lucros e os dividendos continuam sem taxação adequada. “O problema é que isso certamente não será feito por Temer. Ou seja, quem pagará a conta (do ajuste) serão os mesmos de sempre”, critica.

  

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por