Centro de estudos propõe nova reforma na língua portuguesa

Iêva Tatiana - Hoje em Dia
28/10/2014 às 07:57.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:48

(FREDERICO HAIKAL)

Extinguir o trema, retirar acentos, acrescentar hífen, dobrar consoantes. A reforma ortográfica – fruto de um acordo entre países de língua portuguesa – começou a vigorar há seis anos, mas até esta terça-feira (28) muita gente tem dificuldade de colocar os pingos nos “is”. Para dificultar ainda mais, o que nem foi bem assimilado pode sofrer nova alteração. 

A Comissão de Educação do Senado recebeu, do Centro de Estudos Linguísticos da Língua Portuguesa, a proposta de uma nova reforma. A alegação: a necessidade de “simplificar” a escrita, eliminando, por exemplo, o “h” no início das palavras (em vez de humor, umor). Se aprovada, as divergências tendem a aumentar.

Atualmente, falta consenso entre o que está escrito no Vocabulário Ortográfico de Língua Portuguesa (Volp), elaborado pela Academia Brasileira de Letras (ABL), e no decreto 6.583, de setembro de 2008.

“Por exemplo: devemos escrever ‘co-herdeiro’ ou ‘coerdeiro’? Não há padrão em relação a isso”, diz a professora de comunicação empresarial da Faculdade Business School/Fundação Getúlio Vargas, Eliane Zanforlin.

Segundo ela, apesar de as novas regras afetarem apenas 0,5% do vocabulário brasileiro, não há quem não tropece em algumas letras e símbolos. Caso do hífen, apontado como responsável por dar mais nós na cabeça de quem redige um texto.

“Certamente, foi o ponto mais crítico, a mudança mais profunda e que causou maior estranheza, de maneira geral, mas a dificuldade é natural nas transições. Nossa ortografia estava estruturada de uma determinada maneira e nossa cognição acompanhava aquele sistema, então, tivemos que adaptar o cérebro”, confirma o redator e revisor da Assembleia Legislativa de Minas Gerais Márcio Oliveira.

Acostumado a lidar com o idioma profissionalmente, o revisor revela que não teve dificuldades para se adequar à nova escrita, mas confessa que três letrinhas ainda o desconcertam. “Fico extremamente inseguro quando se trata do uso do ‘pré’”.

Facilidades

Para o professor do curso de Letras da PUC Minas Sérgio de Freitas Oliveira, os dispositivos eletrônicos contribuem na hora de tirar dúvidas. “Pela internet, acessamos dicionários e até o próprio vocabulário da ABL. Antigamente, dependeríamos de procurar um dicionário em formato de livro. Agora, ficou muito mais tranquilo e não vejo muita resistência das pessoas, porque os problemas de acentuação e de grafia sempre existiram”, pondera o professor. “O acordo não interfere nisso”, finaliza.

Lecionando há 45 anos, professor Helinho afirma que, para quem já conhecia bem a língua, algumas mudanças foram para pior. “Acho absurda a retirada do trema. E escrever ideia sem acento até hoje me dói”. Segundo o professor, alunos que não sabiam as regras anteriores têm mais dificuldade. “Creio que a nova mudança não passe”, aposta Helinho.

Mudanças em sequência podem causar mais confusão

A proposta de uma nova reforma ortográfica foi apresentada à Comissão de Educação do Senado pelo professor Ernani Pimentel, presidente do Centro de Estudos Linguísticos da Língua Portuguesa. A ideia prevê a simplificação ortográfica das palavras pelo critério fonético. Assim, “ç”, “ss”, “sc” e “xc” seriam substituídos pelo “s” simples. O dígrafo “ch” seria substituído pelo “x”.

A ideia ainda divide opiniões, mas já desagrada a maioria dos profissionais que trabalham diretamente com o idioma. “O acordo ortográfico (em curso) vem sendo discutido desde 1986. Não vejo nenhum motivo para termos outra alteração porque o pessoal ainda está se adaptando às últimas”, diz o professor de Linguística do Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH) Wagner Vieira de Carvalho.

Professor aposentado da Faculdade de Letras da UFMG, Luiz Carlos de Assis Rocha é favorável à unificação do idioma nos países em que ele é falado, mas desaprova mudanças drásticas. “Fazer um acordo em cima do que já existe eu acho problemático, porque o outro nem começou a figurar oficialmente. Desse jeito, as pessoas vão começar a falar que a ortografia muda todo dia e isso não é legal, pois causa muita confusão”.

As propostas precisariam ser aprovadas pela Comissão de Educação, ir a plenário, passar pela Câmara dos Deputados, receber sanção presidencial e ainda passar pelo crivo de outros países de língua portuguesa antes de entrarem em vigor.

 

Fique por dentro

Entre as mudanças propostas pelo Centro de Estudos Linguísticos para uma nova reforma estão o fim do “u” depois de “q” e “g”. Ex.: qeijo, qero, aqilo, leqe;

O que tem som de “x” passaria a ser escrito com essa letra: xá, flexa, maxo, caxo;

Somente a letra “z” seria usada para representar o som de Za, Ze, Zi, Zo, Zu: bluza, analizar, ezuberante, ezemplo;

Os encontros “ss”, “ç”, “sç” e “xc” seriam eliminados. O som de “s” seria, então, representado apenas pela letra “S”. A atual forma exceção, por exemplo, viraria “eseção”.

O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa atualmente em vigor foi aprovado em 12 de outubro de 1990, pela Academia das Ciências de Lisboa, Academia Brasileira de Letras e delegações de cinco países africanos.

No Brasil, o decreto que promulgou o acordo foi publicado em setembro de 2008. O texto previa um período de transição entre janeiro de 2009 a dezembro de 2012. Nesse intervalo, as normas antigas e as estabelecidas pelo acordo poderiam coexistir. Em dezembro de 2012, o prazo foi ampliado por Dilma Rousseff para até o fim de 2015. 

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