Territórios Gastronômicos ganham espaço nas faculdades

Hoje Em Dia
20/11/2015 às 15:37.
Atualizado em 17/11/2021 às 03:01

(Divulgação)

Os saberes tradicionais e a cultura de cada Território Gastronômico de Minas Gerais são cada vez mais valorizados no meio acadêmico. As raízes mineiras, os frutos e ingredientes típicos, as práticas e fundamentos culinários que regem fogões a lenha, fornos de barro e tachos de cobre passaram a ter espaço cativo nos cursos de gastronomia do estado.

A disciplina Cozinha Brasileira já é obrigatória nos cursos de gastronomia do país, mas faculdades que atuam no estado vêm incluindo conteúdo regional de diversas formas ao longo do curso.

No currículo da Una, por exemplo, a disciplina ministrada é Gastronomia Brasileira com ênfase em Comida Mineira. “A riqueza das nossas tradições é muito grande, não dá para passar de forma relâmpago pela cultura e os costumes mineiros”, explica o professor e coordenador do curso, Edson Puiati.

A experiência deu tão certo que virou modelo para os outros quatro centros universitários do Grupo Nima, dono da Una. Hoje, todos têm aulas com ênfase na culinária regional.

“Nos últimos anos, com a valorização da cultura gourmet, a culinária ganhou um brilho artificial. Temos que mostrar para os estudantes que as receitas hereditárias passadas de mãe para filhos em cadernetas rabiscadas, são as melhores fontes de pesquisa que eles podem encontrar”, conclui Puiati.

Em Belo Horizonte, a aula ministrada pela professora Rosilene Campolina perpassa todas as nuances da nossa cultura alimentar. “Não é só comida mineira. São os tabus, os mitos, a religiosidade construída em torno dos alimentos”, diz.

O modo de fazer as receitas, os ingredientes, os utensílios e equipamentos tradicionais são postos à prova nas aulas práticas. “Eles têm que saber que o café era passado no coador de pano, entender por que o feijão tropeiro tinha que ser uma comida seca e de onde saiu o frango com quiabo e angu”, conta Rosilene.

Depois, a lição é criar pratos novos com os mesmos ingredientes. “Os alunos têm que estudar nossa história para criar releituras que façam sentido”, analisa a professora.

Outro desafio nas aulas é a sustentabilidade. A ordem, segundo Rosilene, é aproveitar tudo. “A casca da batata, o restinho do caule da couve, dá pra usar tudo. O que torna um produto glamouroso é o poder do cozinheiro em transformar os alimentos”, diz.

Não é só no contexto da culinária brasileira que os Territórios Gastronômicos são estudados. A professora de Cozinha Contemporânea da Faculdade Promove, Cidinha Lamounier, ensina aos alunos formas de usar ingredientes típicos mineiros em pratos sofisticados e receitas internacionais. “Os estudantes ficam encantados. Aprendem os clássicos enquanto descobrem novidades. Se eu quiser dar aula embaixo de um pé de amora, basta eu levar os meninos para a porta da faculdade. São coisas que eles nem percebem que existem e que precisam ser valorizadas”, conta.

O Território do Cerrado é o mais usado pela professora, que aplica a divisão gastronômica nas aulas. “Não preciso usar ingredientes franceses para fazer um prato francês. O crème brulée de batata doce com crocante de Baru, por exemplo, fica maravilhoso. O mineiro é muito quietinho. Tem estado que faz um estardalhaço por causa de alimentos simples, enquanto a gente tem verdadeiras joias no Território do Cerrado. O estudo dos territórios é legal por isso, chama a atenção para o que temos de mais precioso”, avalia Cidinha.

Já Cláudia Porto Leal, professora do curso de gastronomia da Faculdade de Poços de Caldas, acredita que a divisão de Minas Gerais em cinco territórios gastronômicos é resultado de um trabalho que deve ser encarado como produção científica.

“O mapa dos territórios devia ser usado por todos na academia. Muitos professores ainda não falam das nossas origens. É preciso fazer como na França, que tem todos os seus alimentos tradicionais mapeados e subdivididos”, explica Cláudia.

O estudo de ingredientes e produtos típicos dos territórios também dá aos futuros chefs noções de economia na cozinha. Cláudia ressalta que “um quilo de baunilha custa uma fortuna e, no cerrado, existe a baunilha-banana, que dá naturalmente por aí. É maior e melhor que a outra. Quantas famílias não poderiam viver dessa baunilha se os chefs valorizassem as coisas da nossa terra?”

“Sempre incentivo meus alunos a buscarem ingredientes regionais, testarem frutos, sementes e plantas que estão próximos a eles. Ainda temos muito a fazer na pesquisa dos territórios, mas estamos no caminho certo” completa a professora.

 

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