Em evento com juristas, Dilma volta a dizer que jamais renunciará

Estadão Conteúdo
Hoje em Dia - Belo Horizonte
Publicado em 22/03/2016 às 15:36.Atualizado em 16/11/2021 às 02:36.
 (Evaristo Sá)
(Evaristo Sá)

A presidente Dilma Rousseff voltou a dizer na tarde desta terça-feira (22) que "jamais renunciará" ao mandato em "hipótese alguma" e chamou de golpe a tentativa de retirá-la do cargo. Dilma disse que há uma busca de "motivos falsos e inconsistentes" para encerrar seu mandato e afirmou não imaginar que precisaria viver uma "nova campanha pela legalidade" depois da ditadura militar. "Eu preferia não viver esse momento, mas me sobram energia, disposição e respeito à democracia para fazer o enfrentamento necessário à conjuração que ameaça a normalidade constitucional e estabilidade democrática do país", disse a presidente.

Dilma falou ainda em "autoritarismo disfarçado" ao tratar dos limites de decisões judiciais no Estado democrático. A presidente disse saber que há uma "ruptura institucional sendo forjada nos baixos porões da baixa política, que precisa ser combatida".

A presidente destacou a necessidade do "martelo da justiça" ser utilizado por "juízes serenos e imparciais" e voltou a reclamar da divulgação de áudios. "Executor da Justiça não pode ter meta de condenar adversários ao invés de fazer justiça", afirmou, ressaltando que a "Justiça brasileira fica enfraquecida e a Constituição é rasgada quando são gravados diálogos da presidente sem autorização do STF (Supremo Tribunal Federal)".

Sem fazer menção explicita ao juiz Sergio Moro, mas ainda no contexto das reclamações dos áudios divulgados, a presidente afirmou que há uma "nítida tentativa de ultrapassar o limite estabelecido pelo Estado democrático de direito". "A tentativa de cruzar a fronteira. Fronteira que separa o Estado
democrático do estado de exceção. Seja esse estado de exceção ditadura militar, regime policial ou autoritarismo disfarçado", disse.

"Confio que a Suprema Corte e as demais instâncias da Justiça de nosso país saberão garantir com imparcialidade e sabedoria todos os direito e garantias que asseguram os princípios democráticos do Estado de Direito", ponderou.

Dilma voltou a dizer que aqueles que pedem sua renúncia "mostram a fragilidade da sua convicção sobre o processo de impeachment porque, sobretudo, tentam ocultar justamente esse golpe contra a democracia". "E eu posso assegurar a vocês que não compactuarei com isso. Por isso não renuncio em hipótese alguma", disse a presidente, em evento com juristas contrários ao impeachment. "Não cabem meias palavras, o que está em curso é um golpe contra a democracia", afirmou a presidente, que terminou sua fala com as palavras de ordem: "Não vai ter golpe".

Segundo ela, a "conjuração" tem vários segmentos. O primeiro segmento, conforme Dilma, é o processo de impeachment instalado no Congresso. "O impeachment só pode se dar por crime de responsabilidade claramente demonstrado. Na ausência de crime com provas inquestionáveis, o afastamento torna-se ele próprio um crime contra a democracia. Esse é o caso do processo em curso contra meu mandato", disse Dilma. Ela voltou a dizer que não cometeu nenhum crime para justificar a interrupção de mandato. "Já fui vítima dessa injustiça uma vez, na ditadura, e lutarei para não ser vítima de novo em plena democracia", afirmou.

Menos de uma semana após a divulgação de áudios, pelo juiz Sérgio Moro, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em conversa com Dilma, juristas fizeram críticas a excessos do Judiciário. Eles sugeriram que um eventual "golpe", nos moldes como o de 1964 protagonizado pelas Forças Armadas, é atualmente ensaiado sob disfarce de "legalidade".

A presidente chegou ao evento denominado "Encontro com juristas pela legalidade em defesa da democracia" acompanhada dos ministros Eugênio Aragão (Justiça), José Eduardo Cardozo (Advocacia-Geral da União), Edinho Silva (Comunicação Social) e do chefe do gabinete pessoal da Presidência, Jaques Wagner, além do governador do Maranhão, Flávio Dino. Ela foi aplaudida por uma plateia de advogados e assessores, que também entoaram: "Não vai ter golpe".

STF e sigilo

Em discurso no evento com juristas, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, afirmou que o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff é "clamorosamente ofensivo" à Constituição, chamou de "golpe" a tentativa de dar prosseguimento ao procedimento e anunciou que o governo vai entrar com uma nova ação no STF para que sejam definidos "limites" para autoridades responsáveis por investigações com relação a sigilo telefônico.

A ação proposta será um processo de controle de constitucionalidade, portanto mais ampla do que mandados de segurança, por exemplo. Esse tipo de ação precisa ser discutido pelo plenário da Corte. Ele voltou a falar da divulgação de áudio interceptado por investigadores da Operação Lava Jato que  registrou conversa entre Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Não é possível que conversas telefônicas que poderiam envolver eventuais situações a serem divulgadas não sejam encaminhadas ao STF", disse Cardozo.

"Desde o dia seguinte da eleição tentam encontrar um pretexto para o impeachment e pretexto para impeachment tem nome: é golpe", disse o advogado-geral. "Jamais imaginaria que teríamos que lutar muito para evitar retrocessos", disse ele.

Cardozo informou que o "processo de impeachment no presidencialismo não passa apenas por uma avaliação política", defendeu ele. É engraçado, as pessoas dizem que impeachment não é golpe porque está na Constituição. A figura jurídica está, mas se ela não corresponde à realidade isso não é impeachment", disse.

Críticas a Moro

Durante falas mais duras de advogados dirigidas a juízes, como Moro, a presidente Dilma conversava com Cardozo. No salão do Planalto, com slogan do governo federal atrás, os juristas tiveram discursos enfáticos de enfrentamento com integrantes do Judiciário e segmentos da imprensa. Moro chegou a ser chamado de "juiz do principado de Curitiba" pelo criminalista Alberto Toron "O que nós vemos é o próprio juiz do processo dando a público coisas que deveriam por força de lei ser mantidas em sigilo. Quando um juiz faz isso () nós temos uma franca impunidade para uma atividade marcadamente ilegal", disse Toron, sobre a divulgação dos áudios por Moro.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), disse que há um crescimento "dramático" de "posições de classe fascista no País" Sob aplausos, ele comparou as forças armadas no passado recente do País à atuação de juízes atualmente, ao dizer que há uma "legalidade inflexível" e disse que "o mundo não está só nos autos (de processos)". "Ontem, as forças armadas, hoje a toga supostamente imparcial e democrática", disse o governador do Maranhão.

A respeito do impeachment, Dino disse que não há crime de responsabilidade por parte da presidente. "É preciso derrotar uma falácia de que o julgamento do impeachment é político. É um julgamento político, mas segundo critérios jurídicos. Ser julgamento político não significa vale-tudo, discricionariedade, arbitrariedade. É preciso conter os abusos judiciais", disse o governador do Maranhão.

Sem citar o nome do juiz Sérgio Moro ou outros magistrados, Flávio Dino disse que o Judiciário "não pode mandar carta para passeata". "E se o juiz quiser fazer passeata, há um caminho, basta pedir demissão do cargo. Não use a toga para fazer política", afirmou. Flávio Dino disse ainda que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) apoiou o golpe militar de 1964. Na última sexta-feira, o plenário do Conselho Federal da entidade resolveu apoiar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

 

 

Não cabem meias palavras: o que está em curso é um golpe contra a democracia. Eu jamais renunciarei.

Publicado por Dilma Rousseff em Terça, 22 de março de 2016
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