"Aliança do Crime" pode render o esperado Oscar a Johnny Depp

Paulo Henrique Silva
11/11/2015 às 20:01.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:26

(Hoje em Dia)

Nas últimas premiações do Oscar para melhor ator, a estatueta geralmente tem se destinado a performances “transformadoras”, relacionadas especialmente a quilos a menos ou a mais, a rostos envelhecidos ou enfeiados e à limitação de movimentos físicos. Aconteceu com Matthew McConaughay (“Clube de Compras Dallas”) e Eddie Redmayne (“ A Teoria de Tudo”). E pode se repetir com Johnny Depp.

O intérprete preferido do diretor Tim Burton nunca ganhou o Oscar, apesar de já merecê-la há algum tempo, e o momento certo para sensibilizar os votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Los Angeles é com “Aliança do Crime”, uma das principais estreias dessa quinta-feira (12) nos cinemas. Embora tenha uma atuação marcante, inspirada num personagem real (e bastante feio), Depp, dessa vez, é apenas um gatilho na trama do filme.

Ele faz um mafioso violento e influente, Whitey Bulger, que, sob a proteção do FBI, dominou o cenário do crime em Boston nas décadas de 70 e 80. Inteligente, ele soube se faz passar por informante da agência e ter carta branca para agir, tornando-se aquilo que desde o início o gângster se mostra radicalmente contra: um delator. Essa contradição, só compartilhada com o espectador, é o principal ponto de conflito de “Aliança do Crime”.

Ao contrário de diversos filmes sobre grupos mafiosos (o próprio Depp já fez dois, em “Donnie Brasco” e “Profissão de Risco”), a história não se concentra na figura ao mesmo tempo sedutora e repugnante do protagonista, tentando enveredar pelo aspecto psicológico para explicar esse comportamento. O diretor Scott Cooper não dá muitas pistas nesse sentido, querendo enxergar algum trauma de infância ou ética naquilo pratica.

Não é um “Poderoso Chefão”, abrindo mão de mostrar uma tradicional família que ajudou a construir a América livre e arrivista. E também não quer fazer uma descida aos infernos de alguém que se achava imbatível, como Martin Scorsese abordou em “Cassino”. Não há possibilidade de se identificar com o universo de Bulger, por qualquer lado que se olhe, e seu desfecho não é sofrido e moralizante para alguém que recebeu prisão perpétua.

O que interessa a Cooper é como reagem a essa figura. É como um espelho invertido das pessoas, artifício que já se estabelece com o irmão mais novo, um senador americano. Um criminoso e o outro político. Eles conhecem a atividade do outro e não se envolvem, respeitando seus territórios, levando o filme a nos perguntar se esse “fechar de olhos” não seria estar conivente com o rastro de mortes deixado por Bulger.

Essa questão é ampliada com a presença de um agente do FBI (Joel Edgerton), que se promove a partir da aliança com seu ex-amigo da época de criança. Com as informações passadas por Bulger, ele desbarata a facção italiana que dominava Boston, situação que leva o delator a subir também na hierarquia criminosa. A partir do ritmo mais cadenciado (não lento) da narrativa, é possível criar relações com a política americana, remetendo ao apoio a Saddam Hussein e Bin Laden.

O que mais nos atrai em “Aliança do Crime” é tentar compreender essa gênese americana do aliar-se de acordo com os interesses, dos resultados mais imediatos, não importando quem. O que fica claro é a mera substituição de uma violência por outra. E Cooper percorre esse caminho com brilho, sem criar heróis ou localizando suas críticas num passado distante. Seu discurso é forte e atual, amparando-se numa atuação coesa de todo elenco.

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