(Harper Smith)
Bebel Gilberto mora em Nova York há mais de 20 anos. Mas continua brasileiríssima, com a pronúncia de um português idêntico ao de quem nunca saiu do Rio de Janeiro – terra de sua mãe, a cantora Miúcha. “Nunca parei de falar a minha língua. Tenho a minha turma de brasileiros, alguns deles são amigos desde os tempos de Brasil, outros conheci aqui, nos Estados Unidos. Nas insônias da madrugada, assisto a programas da televisão brasileira. Falar português diariamente mantém forte a minha brasilidade”, diz a intérprete, que volta a mostrar sua bossa nova contemporânea no recém-lançado disco “Tudo” (Sony Music).
A artista poderá se alimentar ainda mais da cultura brasileira agora, por conta da turnê que está passando por várias cidades desse lado de baixo do Equador, inclusive Belo Horizonte – o show acontece nesta sexta-feira, no palco do Cine Theatro Brasil Vallourec, dentro da programação do “Mostra Cine Brasil Teatro e Música”.
A apresentação traz uma mistura de seis faixas do novo álbum com um apanhado de canções de seus outros seis discos de estúdio. Segundo Bebel, na set list, a prioridade não foi dada para os hits, mas, sim, para as músicas que fossem bem conectadas à sua nova fase.
Intenso
Para Bebel, “Tudo” é seu trabalho mais maduro, especialmente por que foi construído mais rapidamente que os anteriores. “Foi um processo muito intenso. Gravei o álbum em pouco mais de um mês. Foi um privilégio gravar no estúdio do Mario, em Los Angeles. Nem acredito que o disco já esteja pronto”, diz Bebel.
O Mario em questão é Mario Caldato Jr, o produtor brasileiro por trás dos mais famosos álbuns dos Beastie Boys, por exemplo. Ele produziu e mixou todo álbum da cantora. “Não sigo nenhuma fórmula e estava aberta a todas as inspirações que viessem. Fiquei impressionada com a rapidez com que o Mario ‘leu’ as minhas ideias. Como ‘Vivo Sonhando’ (de Tom Jobim), que é uma das pérolas da bossa nova e eu não sabia como ficaria. Acabou ficando ótima”, avalia.
Além do maestro Tom Jobim, há ainda uma versão para uma composição do canadense Neil Young (“Harvest Moon”) e uma gravação de “Saudade Vem Correndo”, de Luiz Bonfá e Maria Helena de Toledo. O leque abarca também composições que Bebel Gilberto assina sozinha ou com parceiros – é o caso de “Novas Ideias”, feita com Seu Jorge e Gabriel Moura, e a faixa-título, parceria com a colega Adriana Calcanhotto. Além das línguas portuguesa e inglesa, a cantora também aposta no francês, apresentado em “Tout est Bleu”.
“Normalmente, trabalho com mais de um produtor. Dessa vez, deixei tudo nas mãos de Mario. Se antes fazia uma colcha de retalhos, hoje vejo um trabalho com maior unidade e uma textura diferente. Também sinto que esse disco ficou com um som mais característico de Los Angeles, uma coisa mais limpa”, pondera.
Conexão minas
Bebel Gilberto reconhece não ser muito antenada nas questões do mundo – às vezes, chega a “se sentir o ser mais alienado do mundo”, exagera. Prefere curtir os velhos discos que guarda em casa a ficar pesquisando novidades. “Para se ter uma ideia, acho que o último show a que fui assistir foi o ‘Recanto’, da Gal (Costa)”, admite. Coincidentemente, a baiana também se apresenta na capital mineira, e no mesmo dia que Bebel Gilberto (a bordo do show “Espelho D’Água”, que será levado ao palco do Palácio das Artes).
Mas Bebel Gilberto sabe reconhecer quando há qualidade nas gerações mais novas.
Prova disso é seu primeiro DVD, “Bebel Gilberto in Rio” (Bebelucha/Biscoito Fino), dirigido por Gringo Cardia, gravado na praia do Arpoador, em Ipanema, e lançado no ano passado. Dentre tantas possibilidades de convites, ela optou por chamar o belo-horizontino Flavio Renegado. Melhor ainda: em vez de dividirem as vozes em algum clássico do repertório dela, fizeram dueto em um samba-rap do artista do Alto Vera Cruz, “Na Palma da Mão”.
“Ele é um barato. O conheci entre 2011 e 2012. Soube que ele ia fazer um show no Central Park (Nova York) e fui até lá, convidá-lo para participar do meu DVD. Ele é um cara muito legal e foi uma sorte tê-lo em meu trabalho”, diz Bebel, que também já fez participações em shows de Renegado.
Bebel Gilberto no Cine Theatro Brasil Vallourec (Praça 7). O show acontece nesta sexta, às 21h. R$ 120 e R$ 60; R$ 100 e R$ 50 (duas últimas fileiras do mezanino)
Entre Ipanema e Manhattan
Bebel Gilberto, de 48 anos, é filha de duas celebridades: João Gilberto e Miúcha.
Nascida em Nova York, sua criação foi concentrada no Rio de Janeiro. Começou a cantar na infância, acompanhando sua mãe e seu tio, Chico Buarque.
Sua estreia fonográfica foi em 1986, dividindo o EP “Preciso Dizer Que Te Amo” com Cazuza. Em 1991, ela se mudou para sua cidade natal. O sucesso em território americano veio em 2000, com o álbum “Tanto Tempo”, em que ela mostra ao mundo a bossa nova eletrônica (novidade na época).
Ela se tornou a cantora brasileira mais bem recebida naquele país, com boas vendas para os discos “Bebel Gilberto” (2004), “Momento” (2007), e “All in One” (2009), que foi indicado ao Grammy. Ao todo, seus discos venderam 2,5 milhões de cópias.