A imagem de um pião em rodopios, da infância pobre e de um tempo que já não existe mais. A câmera capta a vegetação do agreste, da caatinga, em seguida a sanfona, que carregou por toda a vida e com a qual traduziu seus sentimentos para músicas belas e inesquecíveis como “Eu Só Quero um Xodó” e “De Volta pro Aconchego”. O que todos já sabiam – que Dominguinhos (1941-2013) era um sertanejo arretado – foi revelado, com nitidez, no documentário “Dominguinhos”, com estreia nacional nesta quinta-feira (22).
O filme – dirigido por Joaquim Castro, Eduardo Nazarian e Mariana Aydar – conta com depoimentos do próprio compositor e cantor, e de imagens de seus shows com representantes de todas as tribos da Música Popular Brasileira, como Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, João Donato, Gilberto Gil, Djavan, Nara Leão, Nana Caymmi, Gal Costa, Elba Ramalho, Anastácia, sua parceira em mais de 200 canções, e até da ex-mulher Guadalupe.
No longa, com roteiro de Di Moretti, Dominguinhos, com timidez peculiar, mas sabedoria ímpar diz que o baião, é o início, o fim e o meio. “O baião é o começo de tudo. Acaba sempre tudo no baião. Posso tocar o que tocar, mas o ritmo que mais gosto é o Baião”, diz Dominguinhos, num dos trechos do filme, com carreira internacional no Festival de Toulouse, França, e Festival Internacional de Cinema Independente de Buenos Aires, Argentina, além da mostra competitiva do É Tudo Verdade – 19º Festival Internacional de Documentários.
O filme narra desde a infância pobre, o “empurrão” dado pelo mestre Gonzagão, a vinda de Dominguinhos para o Rio de Janeiro com o pai e os irmãos. Como muitos retirantes ele deixou para trás Garanhuns, em Pernambuco, em um caminhão de pau de arara, em 1954, para viver e vencer no “Sul Maravilha” com sua música, feita em notas de uma sanfona, tocada por um autodidata – e um ouvido de um gênio musical.
O documentário – que toca pela emoção, como no encontro com Nana Caymmi e na brincadeira com um neto – se aproxima do fim com imagens tocantes, em que Dominguinhos canta “De Volta pro Aconchego”, acompanhado pela Orquestra Jazz Sinfônica. O encontro aconteceu em abril de 2011, no Auditório Ibirapuera (SP), após longo período de internação. A vida de um nordestino com cara de índio, e de uma música arretada.