Domenico de Masi - Para ele, o futuro é verde e "giallo"

Elemara Duarte - Hoje em Dia
23/02/2014 às 09:31.
Atualizado em 20/11/2021 às 16:13
 (Divulgação)

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Nasceu durante uma visita a uma fazenda mineira a ideia para o mais recente livro do sociólogo italiano Domenico de Masi, “O Futuro Chegou – Modelos de Vida Para Uma Sociedade Desorientada” (Casa da Palavra/Quitanda Cultural). Treze anos depois de mostrar para o mundo as vantagens do “ócio criativo”, Domenico aposta na ideia de que o Brasil – sim, a “terra nostra” – é o país que tem a cara da pós-modernidade.   Para justificar uma ideia que muitos há séculos tentam fazer os brasileiros acreditarem, o escritor escreveu mais de 750 páginas. Argumentos, ele tem. E há também uma admiração, que chega ao deslumbre, pela cultura e natureza brasileiras – que ele conheceu pessoalmente, em dezenas de viagens, ao longo de 30 anos, do Rio Grande do Sul até a Amazônia.   Em Minas Gerais, acrescenta ao Hoje em Dia, onde veio quase sempre em conferências, nunca deixou passar a oportunidade de rever obras do amico Oscar Niemeyer em Belo Horizonte ou as igrejas barrocas de Ouro Preto e o diálogo da natureza com a arte em Inhotim.   Por isso, vale pensar se não é mesmo chegada a hora de o Brasil “exercer” o que era promissor. A pontinha de esperança procede: mesmo com o citado deslumbre, Domenico mantém o pé no chão.    Ele prepara terreno ao explicar os modelos socioeconômicos e religiosos que já foram testados pela humanidade, no curso de sua história, na busca, por vezes sofrida, de sentidos de organização e sobrevivência: hebraico, católico, clássico, iluminista, liberal, capitalista ou chinês socialista, entre tantos outros, chegando aos tempos atuais do chamado “pós-industrial”.   E, neste ponto, entra o Brasil, o país dos antagonismos. Segundo ele, com as crises europeia e norte-americana, o Brasil está sem modelos de sucesso e deve passar a olhar para si mesmo. Se é ele quem está falando...   Muito mais que o país do futebol e do samba   Conhecido internacionalmente como o “país do futebol”, ou “do Carnaval”, o Brasil deveria mesmo era encarnar as vestes de “país do futuro”. O sociólogo e escritor italiano (nascido em Rotello, em Campobasso), Domenico de Masi, do alto de seus 76 anos (completados no último dia 1º) assegura que isso é, sim, possível – e até chama o país de “o mais pós-moderno do mundo”.   Aponta, ainda, uma grande capacidade de crescimento, mesmo com o ingresso tão recente na modernidade – pouco mais de cem anos entendidos a partir da Proclamação da República.    E, pelo visto, sob seu ponto de vista, é o país mais querido também, mesmo que o patriotismo verde-amarelo ainda não tenha assumido isso. “A cultura brasileira é amada em todo o mundo: ninguém jamais bombardearia as Torres Gêmeas (referindo-se ao ataque às torres do World Trade Center, perpetrado pela rede Al-Qaeda em Nova York, no 11 de setembro de 2001) se elas estivessem no Brasil!”, garante o italiano, que já residiu em Nápoles, Milão e Roma e, em 2010, tornou-se cidadão honorário do Rio de Janeiro.   Autor, ainda, de títulos como “Desenvolvimento Sem Trabalho” e “A Emoção e a Regra”, além do já citado “Ócio Criativo”, o atualmente professor de sociologia do trabalho na Universidade de Roma “La Sapienza” discorre mais sobre seu pensamento a seguir:   Por que o futuro está aqui? (O pernambucano) Gilberto Freire (1900-1987) reconheceu que “a educação brasileira tem sido um processo de equilíbrio de antagonismos”. Antagonismos de economia e de cultura. A cultura europeia e a africana. O católico e o herege. O grande proprietário e o sem-terra. O doutor e o analfabeto. O senhor e o escravo, entre outros. No entanto, a mentalidade brasileira não se escandaliza com as misturas, este tipo de casamento que seria irreconciliável à primeira vista. A cultura pós-moderna é caracterizada por este patchwork, esta colagem, esta miscigenação.    Qual é o “calcanhar de Aquiles” que faz nosso país não dar certo? Se consultarmos o “The Economist: Pocket World in Figures 2014” (almanaque com levantamentos sobre economia e sociedade), percebemos que, em tão curto espaço de tempo (em que é nação constituída), entre 196 países do mundo, o Brasil já ocupa o sexto lugar em relação ao Produto Interno Bruto (PIB).  Infelizmente, o Brasil ocupa o quarto lugar entre os países com a maior dívida externa. Além disso, não tem sequer uma linha ferroviária eficiente entre Rio de Janeiro e São Paulo, e milhares de pessoas são forçadas, todos os dias, a ir de avião de uma cidade para outra, com uma despesa econômica, perda de tempo e poluição do ar. O Brasil também investe pouco em pesquisa científica, patentes e tem pouco turismo.   ...E o “calcanhar”? Sabemos muito bem que o “calcanhar de Aquiles” é: analfabetismo generalizado, a violência, a corrupção, a burocracia excessiva, a grande injustiça social.   “O Brasil nunca fez guerra de poder com o resto do mundo”, diz as páginas do seu livro, “O Futuro Chegou”. Mas, aqui dentro, o que se vê nas guerras bairristas é o tráfico, o coronelismo, as brigas de torcidas de futebol. Cada um querendo fazer valer o suas razões mesquinhas. Já pensou também sobre essas guerras internas que temos? Os Estados Unidos têm apenas dois países vizinhos, muitas guerras do lado de fora e um monte de violência interna. O Brasil tem dez estados vizinhos, um monte de violência doméstica, mas não a guerra para o exterior, exceto o século 19, com o Paraguai.   Se o senhor fosse presidente do Brasil, qual o primeiro problema que buscaria resolver? A corrupção.

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