Em 4 mil versos, poeta do Norte de Minas narra glória do 'tri' da Seleção

Elemara Duarte - Hoje em Dia
26/02/2016 às 20:53.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:35
 (Hoje em Dia)

(Hoje em Dia)

 

"Os craques do Brasil que nos gramados De futebol ficaram afamados 'Pós três conquistas eu passo a cantar. Co'a Taça que trouxeram do estrangeiro Aos povos o talento brasileiro Finalmente ajudaram a provar".

(...)

"Éramos nós crianças bem pequenas Quando o Brasil deixou de ser apenas País e se tornou "País da Bola". Mas, 'pós Mil Novecentos e Setenta, O Futebol virou, de forma lenta, Do Mundo do Dinheiro a grande mola..."

 

Com mais de 4 mil versos decassílabos como estes acima, o poeta Ésio Kleber Silvério de Sousa lança “Tríade Brasílica – Epopeia Nacional Brasileira em 10 Cantos” (edição do autor). O livro, que ele define como “a primeira epopeia desportiva da literatura”, narra a conquista da Taça Jules Rimet pela Seleção Brasileira de Futebol, ao garantir o tricampeonato mundial no México, em 1970.

O regulamento da Copa dizia que a taça ficaria com o país que primeiro ganhasse a competição por três vezes. Assim, o Brasil o fez. Com a terceira vitória da Seleção no México, o “caneco” veio para cá de vez. A esta somaram-se as vitórias nas copas da Suécia (1958) e do Chile (1962).

Após cinco anos de intensa revisão, este mineiro de Salinas, graduado em Direito, contou a trajetória do time que emocionou milhões de brasileiros. O livro traz dez cantos e 673 sextilhas, num total de 4.038 versos decassílabos.

Hoje, o autor vive no povoado de São João do Pequi, no município de Novorizonte, a 45 quilômetros de Salinas, no Norte de Minas. Ali, cuida da fazenda da família. “Mas nunca abandonei a literatura erudita, a qual passei a me dedicar desde os 18 anos”, conta. Sousa escreve a mão ou em máquina de datilografar. O irmão, o médico Charles Wanner Silvério de Sousa, ardoroso torcedor da Seleção, foi quem digitalizou tudo. A epopeia tupiniquim é dedicada a ele.

“‘Tríade Brasílica’ tem o gigantesco desafio de ser aceita pelo mundo acadêmico. Por um lado, o projeto redignifica um idioma que vem sendo sistematicamente empobrecido e desvalorizado no nosso tempo”, explica o poeta.

 

CRIATURA E CRIADOR – Capa do livro que levou cinco anos para ser revisado pelo poeta Ésio Kleber Silvério de Sousa. Crédito: Reprodução

 

“Para se escrever uma epopeia clássica, o autor deve ter em mente uma ‘receita’, ditada a mais de 2.800 anos por Homero (poeta épico da Grécia antiga), o inaugurador da literatura ocidental”, explica a professora Associada de Língua e Literatura Latina da UFMG, Heloísa Penna.

A pedido do Hoje em Dia, a professora leu o livro do poeta e o configurou como “ao mesmo tempo, tradicional e moderno: na forma, uma releitura da épica camoniana; no conteúdo uma inovação brasílica”.

Editor de Esportes no Hoje em Dia, Marcelo Machado, avaliou a forma do registro histórico em “Tríade” como “inusitada”. “No momento em que o futebol brasileiro vive uma fase adversa, talvez a pior da história, só mesmo o passado glorioso da Seleção para trazer alguma alegria ou esperança. E é de uma forma curiosa e original que o autor revisita uma trajetória já contada e recontada incontáveis vezes”, apontou.

 

O FAMOSO SOCO NO AR - Tostão, Pelé e Jairzinho na Copa de 1970, num Brasil x Tchecoslováquia. Crédito: Arquivo Hoje em Dia

 

 

"Pede a Torres, Tupã, que fale aos pares - Maxime, aos que têm sido titulares - Pra que na cancha bem tranquilos entrem. O Uruguai nos roubou um Mundial Na nossa própria casa; e é essencial Que os fundamentos da Vingança centrem!...”

 

Assim cantou Sousa, em um das "sextilhas" de sua Tríade. Mas quem viveu esta sede de revanche dentro das “quatro linhas” foi o ex-jogador mineiro Wilson da Silva Piazza, 72 anos.

Campeão em 1970, ele se emocionou ao ouvir trechos da epopeia em que é citado com louvor. Em uma das disputas que jogou, o atleta lembrou de uma preocupação, fato que também é poetizado por Sousa.

“Este jogo está na minha memória até hoje. Foi na semifinal, em Guadalajara. Uruguai contra o Brasil. Ganhamos por 3X1. Tinha aquele fantasma de perder em 50 para o Uruguai. Mas vencemos e fomos para a final. Era um futebol de uma magia...”

O épico “Tríade Brasílica” tem lançamento na base da simplicidade. Nada de coquetéis ou contratação de equipe de mídia para divulgar. Sousa fez um pequeno anúncio em jornal, com breve descrição do trabalho e informou os contatos dele.

Fora o sutil empenho de divulgação, o autor de 47 anos, custeou o envio de parte da edição para várias bibliotecas públicas no Brasil e em Portugal.

Informações sobre a venda do livro: (38) 9-9131-5275 ou (38) 3811-1731

 

 

INSPIRAÇÃO – Primeira edição de “Os Lusíadas”, de Camões, de 1572. Crédito: Real Gabinete Português de Leitura/Arquivo Hoje em Dia

 

Hoje em Dia - O que é epopeia?
Heloísa Penna - Epopeia é um dos três maiores gêneros poéticos da Antiguidade Clássica juntamente com a Lírica e o Drama (tragédia e comédia). Ele se caracteriza por extensas narrativas de guerra, viagens, peripécias heroicas; por possuir personagens humanos e divinos e pelo ideal heroico de se alcançar um objetivo nobre. O passado remoto, em sua dimensão histórico-mítica, é o tempo ideal dos acontecimentos a serem narrados. O autor, ao escolher esse gênero considera seu assunto digno de memória.

O que é “canto”, “sextilha” e “verso decassílabo”?
“Cantos” são cada uma das divisões de um poema. “Sextilhas” são grupos de seis versos, reunidos em estrofes. “Versos decassílabos” são linhas da poesia que constam de palavras que totalizam dez sílabas, contadas até a última sílaba tônica do verso.

A senhora poderia citar as epopeias mais conhecidas?
As três maiores épicas clássicas do Ocidente vêm do mundo greco-romano: A “Ilíada” e a “Odisseia”, no séc. 8, antes de Cristo (a.C.), escritas em grego, atribuídas a Homero e a Eneida (séc. 1 a.C.), em latim, criação do poeta Virgílio. Dessas, todas as outras se originaram.

Por que os textos das epopeias são tão trabalhosos de serem escritos?
Para se escrever uma epopeia, dita clássica, o autor deve ter em mente uma “receita”, ditada há mais de 2.800 anos por Homero, o inaugurador da literatura ocidental. O passo a passo da escritura épica de modelo clássico começa com o tipo de verso a ser usado, o hexâmetro datílico (forma de métrica poética) na Grécia e em Roma e, em português o decassílabo ou verso heroico; segue com o assunto a ser narrado, geralmente um fato histórico de tamanha grandiosidade que só pode ser compreendido a partir da interpretação mítica; completa-se com personagens humanos e divinos além de seres sobrenaturais. A estruturação da matéria épica consta de três partes: Proposição (apresentação do tema a ser narrado); invocação (pedido de inspiração à Musa); narração (trama em episódios, pormenorizada).

Em língua portuguesa, quando se fala em epopeia, um nome que é sempre citado é o de Camões. Este poeta, inclusive, é muito admirado pelo autor de "Tríade Brasílica". Qual é a importância de Camões para a língua portuguesa?
O poeta Camões foi um marco para a língua portuguesa como o foram Dante para o italiano, Milton para o inglês, Cervantes para o espanhol. Camões, ao escrever sua mais conhecida obra épica, “ Os Lusíadas” legou a Portugal e à língua lusa um poema universal, porta voz da grandeza e glória do povo português. Além disso, consolidou o idioma ao ampliar sua capacidade de expressão poética.

Sobre “Tríade Brasílica”, qual é a relevância de um texto como este em pleno século 21?
O texto “Tríade Brasílica: Epopeia Nacional Brasileira em 10 cantos” surpreende-nos pela rigidez formal dos versos (sextilhas em versos decassílabos e rima no estilo corrido – AABCCB), pela obediência estrutural à epopeia clássica e pela escolha do tema: a conquista do tricampeonato mundial de futebol. É, ao mesmo tempo, tradicional e moderno: na forma, uma releitura da épica camoniana; no conteúdo uma inovação brasílica. Embora o futebol brasileiro seja uma paixão nacional e os jogadores tratados como heróis pelos narradores esportivos, o tema está longe de ser matéria épica clássica, mas se encaixa perfeitamente na tradição, tipicamente brasileira e especificamente nordestina, dos cordéis. Assim, a relevância do texto do poeta Ésio Kleber Silvério de Souza está em cantar um tema popular, de acontecimento recente (1970), num formato tradicional, o da épica clássica. É um texto que evoca a miscigenação brasileira por meio dos deuses protetores, “das três raças ancestrais do povo brasileiro”: o africano Oxalá, o lusitano Endovélico e o tupiniquim Tupã. Além disso vê-se o cuidado com que o autor compôs seus dez cantos de linguagem fácil, leitura fluente e organização coerente.

Poderia falar sobre epopeias lançadas no Brasil?
Há muitas formas atuais de manifestações do épico já que, do período inicial ao momento atual, houve modificação do gênero que pode se expressar em verso e em prosa; em formato de quadrinhos; na literatura de cordel; no cinema e na TV. Mas a maior concentração de escritores brasileiros, nesse gênero, ficou no passado. São poetas que escreveram à maneira da Épica Clássica como Basílio da Gama com seu “Uraguai” (1769), epopeia dos Sete Povos das Missões do Uruguai; Santa Rita Durão com seu “Caramuru” (1781), poema épico do descobrimento da Bahia; Cláudio Manuel da Costa com seu “Vila Rica” (1839), sobre a Inconfidência Mineira; Gonçalves Dias com “I-Juca-Pirama”, um poema épico indianista, dentre outros. Também prosadores como Euclides da Cunha com a obra “Os Sertões” (1902), considerada uma epopeia da seca. Ainda hoje se escrevem muitas epopeias sem, no entanto, se prender totalmente ao modelo clássico, principalmente no que concerne à forma. Considera-se obra épica, por sua extensão e tema, por exemplo, o trabalho de J. R. R. Tolkien, “O Senhor dos Anéis”, transformado, recentemente, em filme.

 

 

Parece ficção, mas é a mais pura verdade. A desejada e cantada em versos e também em prosa Jules Rimet que a Seleção Brasileira levou foi roubada em 1983, no Rio de Janeiro. A condecoração era feita em ouro e, acredita-se que ela tenha sido derretida pelos ladrões. Este enredo está no filme “O Roubo da Taça”. A previsão é de que “O Roubo da Taça” entre em cartaz no circuito comercial brasileiro em agosto deste ano.

Com Taís Araújo, Stepan Nercessian e o funkeiro Mr. Catra no elenco, o filme do cineasta Caíto Ortiz, foi produzido pela Prodigo Films. O cineasta tem 45 anos sabe do passado de vitórias da Seleção por terceiros. “A minha memória é do roubo”, explica ao Hoje em Dia, sobre a origem do seu interesse na jocosa e vergonhosa história do esporte mais popular do país.

“Nessa época, eu tinha 12 para 13 anos, passava as minhas férias no Rio de Janeiro. Acompanhei essa comoção. Foi em 19 de dezembro de 1983. O brasileiro não sabe da história do roubo. É um pedaço da história que ficou meio escondido. Como se fosse vergonhoso demais”, avalia.

O filme mistura fatos e ficção. “Já tinha acabado o Campeonato Brasileiro, a CBF estava em recesso e dois ladrões entraram lá e roubaram a taça”. E o lance do derretimento? “Ninguém tem certeza de que ela foi derretida. Os ladrões disseram. Mas, hoje, morreram todos”.

O filme terá estreia mundial no festival texano South by Southwest (SxSW), em 12 março, como parte da mostra não-competitiva “Visions”. O SxSW acontece nos Estados Unidos e reúne tendências musicais, de cinema e novas tecnologias.

 

A TAÇA DO MUNDO É DELES – O ator Paulo Tiefenthaler faz um dos ladrões. Mas, hoje, cadê a taça? Sumiu! Crédito: Prodigo Films/Divulgação

 

Saiba mais

O Festival Literário de Poços de Caldas (Flipoços 2016) também lembra a literatura clássica neste ano. O evento será realizado entre os dias 30 de abril e 8 de maio e tem como temática “De Camões a Machado de Assis – Uma viagem pela literatura clássica”.

Mais informações e programação completa no site do evento. A troca de ingressos por livros começa em 21 de março e os agendamentos de escolas e para as palestras em geral já começaram. Interessados podem fazer agendamos no site do evento ou pelo telefone (35) 3697-1551.

 

"Comemoram os craques no gramado, Cônscios de terem, sim, proporcionado À Pátria Colossal prazer e entono! E já vai começar o ritual Que fará com que a Taça Mundial, Tão cobiçada, enfim passe a ter dono!"

 

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