CINEMA

Em 'Lilo, Lilo, Crocodilo', história infantil traz reflexão sobre negação dos prazeres da vida

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
29/10/2022 às 07:32.
Atualizado em 29/10/2022 às 09:03
O cantor Shawn Mendes dubla o jacaré Lilo no filme dirigido por Will Speck e Josh Gordon (Sony/Divulgação)

O cantor Shawn Mendes dubla o jacaré Lilo no filme dirigido por Will Speck e Josh Gordon (Sony/Divulgação)

É interessante perceber que, no filme “Lilo, Lilo, Crocodilo”, em cartaz nos cinemas, o jacaré protagonista é adquirido num estranho pet shop por um artista em busca de um lugar ao sol no show business, após descobrir que ele canta muito afinado, mas em nenhum momento se tenta saber a razão de ele ter essa capacidade.

Essa informação sobre as origens de Lilo nunca vêm à tona, o que nos permite debruçar sobre alguns dos principais temas do longa-metragem: o isolamento autoimposto pelas pessoas, das formas mais variadas possíveis, e a negação, em prol de uma funcionalidade (como família ou sociedade), dos prazeres da vida.

Baseada numa série literária de grande sucesso nos Estados Unidos, a história tem como largada o encontro de dois “marginalizados”: o artista Hector Valentim, vivido pelo espanhol Javier Bardem, expulso de um show de talentos depois de mais um número fracassado, e um pequeno réptil jogado num canto qualquer do pet shop.

Não é preciso ir ao passado de Lilo para entender a sua situação de abandono, enquanto o mágico parece um atrapalhado saudosista numa Nova York de entretenimento mais sofisticado. O crocodilo é a saída de Valentim para ter o reconhecimento que tanto espera, um misto de oportunista e sonhador.

O retrato ambíguo dado ao personagem de Bardem, que está muito à vontade no papel, cria uma certa tensão entre os dois mundos abordados pelo filme: a fantasia, entendida como um lugar de bem-estar e felicidade, e a realidade mecânica que encontra no vizinho Senhor Grumps a imagem perfeita da restrição e da fidelidade às normas.

Ao longo da narrativa, há uma transposição sobre o que é incômodo, entre o animal que está fora de seu habitat e o vizinho que quer ter o domínio territorial. O fato de Lilo ser um jacaré cantante vai se tornando uma extravagância cada vez mais aceitável diante da falta de educação e da falta de limite de Grumps.

E aqui retornamos aos dois temas centrais de “Lilo”, na percepção dessa “guerra” entre fantasia e realidade a partir da entrada de uma família normal que, ao se deparar com o crocodilo, sofre uma necessária mudança de rotina, já que todos pareciam conformados com a sua situação de vida, afastados de seus prazeres.

Lilo ganha um espelhamento no filho, tão solitário quanto ele na Big Apple, muito diferente do isolamento de Valentim e de Grumps. Esses dois já estão adultos e se deixaram contaminar por desejos egoístas, mas as duas “crianças” ainda têm chances de entender que o que importa na vida é a afetividade.

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