Defensor ferrenho da memória dos filmes nacionais, Jurandyr Noronha acredita que, mesmo com as facilidades proporcionadas por leis de incentivo, "a longa luta do cinema brasileiro" – título de um de seus livros – está longe de terminar. "Muitos são os holofotes sobre as rendas do mercado exibidor brasileiro", afirma, resignado, ao referir-se ao "olho grande" das distribuidoras internacionais sobre um dos mais rentáveis circuitos de cinema do mundo.
Não é a avaliação de um derrotista. Noronha sempre apostou na cinematografia nacional – um dos motivos que o faz ser um dos homenageados da 8ª Mostra de Cinema de Ouro Preto, que tem início nesta quarta-feira (12). Lá, ele também será nomeado Presidente de Honra da Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA). "Sinto alegria por ser reconhecido o trabalho de um conterrâneo. Não me abandona esse agarramento à terra".
Noronha nasceu em Juiz de Fora, mas foi no Rio que começou a atuar como crítico. Trabalhou também atrás das câmeras, na Pan Filmes e na Cinédia. Durante o Estado Novo, voltou-se para a realização de documentários no Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP).
"Considero o documentário a forma mais avançada de cinema", justifica. Aos 97 anos, segue fazendo anotações sobre os filmes brasileiros a que assiste. Só não sai de casa. "Na minha idade, é mais cômodo o uso de DVDs". Aliás, foram os escritos que ajudaram a preservar muito da nossa história.
Carinho especial
Autor de livros como "No Tempo da Manivela" (1987) e "Pioneiros do Cinema Brasileiro" (1994), Noronha foi definido por Nelson Pereira dos Santos como o descobridor do "DNA do cinema brasileiro". Para o pesquisador, mais do que o Cinema Novo, foram os ciclos regionais que revolucionaram o Brasil. Entre eles, o de Cataguases, de onde saiu Humberto Mauro, a quem dedicou um curta, em 1970.
Noronha tem um carinho especial pelos imigrantes italianos que participaram do desenvolvimento da produção brasileira. Cita Paulo Benedetti, que, na década de 1910, instalou-se em Barbacena para inventar equipamentos. "Pelo laboratório que tanto melhorou o padrão técnico dos filmes e pelas invenções, está a merecer um monumento", diz Noronha, que ressalta a primazia dos italianos na realização do primeiro documentário e da primeira ficção no país.
Mostra exibirá mais de 50 títulos até dia 17
A "CineOP" chega à oitava edição, de hoje ao dia 17, tendo como eixo de sua programação histórica o tema "1964-1969: O Cinema Brasileiro entre o Golpe e o AI-5", antecipando as reflexões sobre os 50 anos do Golpe de 64. Até terça (18), serão exibidos mais de 50 filmes, entre produções antigas e recentes. Representando os cineastas do período citado, a mostra homenageia Walter Lima Jr, um dos mais representativos realizadores do cinema brasileiro.
Ganharão as telas do Cine Vila Rica clássicos como "Terra em Transe", de Glauber Rocha, "El Justicero", de Nelson Pereira dos Santos, "Brasil Ano 2000", de Walter LimaJr., "Anuska Mulher Manequim", de Francisco Ramalho Jr., e "Bebel, Garota Propaganda", de Maurice Capovilla. A Mostra Contemporânea programa cinco longas, quatro médias e 30 curtas, todos em pré-estreia nacional.