Quando comprou a ideia de fazer o espetáculo “O Topo da Montanha”, Taís Araújo não imaginava que a história, uma ficção baseada no último dia vivido por Martin Luther King, faria tanto sentido ao Brasil de hoje. “O que é lamentável, já que estamos falando dos Estados Unidos de 1968”, justifica.
Além de integrar o elenco, ela assina a produção ao lado do marido, o ator Lázaro Ramos, também diretor e protagonista da trama em cartaz neste sábado (15) e domingo (16), no Palácio das Artes. A codireção é de Fernando Philbert e o texto da dramaturga norte-americana Katori Hall.
Imortalizado na luta pelos direitos civis dos negros, Luther King repudiava a segregação racial. Taís também repudia. Lastimavelmente, foi vítima de racismo. Enquanto subia ao palco para apresentar a peça no fim do ano passado, a atriz foi alvo de comentários sobre a cor da pele nas redes sociais. Não se calou. Usou a mesma rede para se posicionar. O caso foi levado à Polícia Federal e a artista, à época, incentivou as pessoas a denunciar qualquer situação semelhante.
Ao Hoje em Dia, Taís diz considerar a discriminação “parte do DNA do Brasil” e que, assim como antigamente, continua sendo uma coisa velada. “O que acontece é que, como não há cara nas redes sociais, as pessoas se aproveitam desse anonimato para covardemente agir da maneira que sempre pensaram”, avalia.
Poder de reflexão
Taís acredita, porém, que “O Topo da Montanha” tem contribuído para quebrar tal intolerância. “Por mais que eu tenha falado que o preconceito está no brasileiro, é muito bonito notar que as pessoas identificam isso e querem se livrar desta marca”, pontua. Ela acrescenta ainda que ninguém nasce preconceituoso. “Isso é aprendido. E o espetáculo cumpre o desafio de mostrar que podemos lutar contra o preconceito”, afirma.
Na segunda-feira (16), Lázaro Ramos traz ao Palco Biblioteca, projeto do Sesc Palladium, uma discussão sobre o seu mais recente trabalho, o livro “Caderno de Rimas de João”, às 11h. A entrada é gratuita
Lázaro Ramos também crê no potencial de a obra impactar o público. “De uma maneira afetuosa, o texto fala de uma luta dolorosa, mas, por meio do humor, faz com que todos se sintam parte da discussão e saiam motivados. (...) O texto traz uma reflexão de maneira leve”, frisa.
Um visionário
A história é uma alusão ao discurso do pastor protestante e ativista político Luther King, realizado em 3 de abril de 1968 (um dia antes de sua morte). Nesse contexto, ele conhece a camareira Camae, vivida por Taís. “Ela surge para confrontar as escolhas dele. E eu acredito que há essa coisa da mulher empoderada, que tem a coragem de contestar um símbolo. E, realmente, ela surge para botar ele em xeque. Ela faz com que ele possa fazer uma análise da sua vida. Tudo que eu queria é que, um dia antes de minha morte, tenha alguém para me fazer refletir sobre as minhas escolhas”, diz a atriz, entre risos.
Na trama, Lázaro faz o líder religioso, por quem diz nutrir grande identificação. “Ele tem uma articulação de pensamento que constrange, porque fala de coisas muito simples e de como seria mais fácil se a gente respeitasse os direitos dos outros”, afirma.
“Ler os discursos dele me impressiona muito, porque era visionário em diversas questões. Várias das palavras escritas por ele nos anos 50, 60 parecem que foram escritas ontem. Era um homem que realmente estava à frente de seu tempo”, completa o ator.
Serviço: “O Topo da Montanha”, com Lázaro Ramos e Taís Araújo. Sa´bado (15), às 20h, e domingo (16), às 19h, no Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1537). Ingressos: R$ 25 (meia) a R$ 120.