"Memórias do Subdesenvolvimento", novo filme de Tomás Gutierrez Alea

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
09/02/2015 às 08:53.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:57

(IMS/divulgação)

A sequência é curiosa por – ao mesmo tempo em que ganha um caráter documental, acompanhando um debate sobre a situação política de Cuba naquela década de 60, pouco depois da Revolução liderada por Fidel Castro e Che Guevara – estampar um dos temas centrais do filme “Memórias do Subdesenvolvimento” (1968): a apatia do personagem Sergio sobre as transformações que o rodeiam.

Lançado em DVD pelo Instituto Moreira Salles, o filme de Tomás Gutierrez Alea, o maior nome da história da cinematografia cubana, tem reforçado agora, mais de 50 anos após a sua primeira exibição, esse lado documental, principalmente quando mostra Edmund Desnoes, autor do livro que inspirou o filme, em cima do palco, como um dos debatedores, e, na plateia, um provocador e sarcástico estrangeiro.

Esses dois elementos – o autor assumindo seu papel dentro da obra e o olhar do que é exterior aos acontecimentos – formam uma espécie de tripé narrativo ao lado do protagonista que tenta se manter alheio ao novo sistema político. Diferentemente do livro, em que Desnoes não vê com maus olhos a indefinição de Sergio, o filme critica, sim, a falta de posicionamento, perdoando até mesmo aqueles que optaram por deixar Cuba.

Alea enxerga nele covardia, a falta de amor ao próximo e a incapacidade de abandonar seu conforto, apesar de o regime dar sinais de que não dará trégua aos mais abastados. É como se ele, indignado, lutasse contra algo que não pediu, exemplo maior de seu egoísmo. A modificada Havana se transforma numa passarela exibe seu ar esnobe e não deixa de lado o jeito playboy, caçando garotas na rua.

O espectador atrevido do debate representa o descrédito do estrangeiro em relação ao sucesso da implantação do socialismo no país americano. Já a presença de Desnoes no filme significa a maneira como o cinema se assume como instrumento político, sem ser panfletário demais, mas botando em xeque a ilusão atribuída à sétima arte, que, na verdade, nunca foi apolítica, mesmo o cinema americano.

Realizado na época da Nouvelle Vague francesa, “Memórias do Subdesenvolvimento” traz ecos do movimento em seus sua direção e montagem muitas vezes desconexas. Como nos filmes de François Truffaut, Alea fala dos desencontros amorosos. Como Jean-Luc Godard, de um personagem em descompasso com o que em seu entorno. Como Alain Resnais, de um tempo particular que dita o ritmo do personagem.

“Memórias do Subdesenvolvimento” (Memorias del Subdesarollo – Cuba, 1968). Direção: Tomás Gutierrez Alea. Com Sergio Corrieri, Daisy Granados. Lançamento: Instituto Moreira Salles.
 

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