Mostra “A imaginação da Matéria de Minas” abre ao público nesta quinta-feira

Pedro Artur - Hoje em Dia
20/03/2014 às 08:13.
Atualizado em 20/11/2021 às 16:44
 (Carlos Rhienck)

(Carlos Rhienck)

O corpo é miúdo. As mãos, calejadas e ágeis, para trabalhar a argila. Aos 77 anos, 60 dos quais dedicados à escultura, Raimunda de Almeida Martins confessa: já pensou, sim, em largar tudo. “Nesses dois últimos anos, pensei em parar de trabalhar pela falta de apoio, já que praticamente só vendia (suas obras) para os alemães. Era um momento de muita dificuldade, mas vi que não era esse o caminho, mesmo porque o meu trabalho é a minha vida”, resume a artista.

A artesã de Itamarandiba expõe três obras em cerâmica (“Aparição de Fátima”, “Anjo Cangaceiro” e “Caçador”) na mostra “A Imaginação da Matéria de Minas”, que será aberta nesta quinta-feira (20) ao público, no Centro de Arte Popular Cemig (rua Gonçalves Dias, 1.608, Lourdes), permanecendo aberta até 20 de abril. A exposição, aliás, celebra também os dois anos de atividade do Centro. São, ao todo, 60 trabalhos – em madeira, barro, algodão e metal – de 37 artesãos.

Várias Minas

As nuances da arte popular das várias Minas também estão nas carrancas de madeira de Lourdes Barroso. Ela conta que a arte sempre esteve em sua vida, mas a escultura, acrescenta, teria sido um “achado”. Ela diz que era cantora e envolvida com a política, mas, com a ditadura militar, teve que deixar Salvador, para não ser presa.

“Fugi para Juazeiro e peguei o vapor (Benjamin Guimarães) – acabei me casando com o capitão (Francisco Barroso). E como não saía do vapor, ainda com receio de ser detida, ficava ouvindo história, e meu marido trouxe material para trabalhar com madeira. Assim, comecei a fazer carrancas”, diz a artista de 76 anos, que mora em Pirapora há quase 50. A mostra tem, como curadores, Flávio Vignoli e Maza de Palermo – em 40 dias, os dois percorreram quase cinco mil quilômetros, pelo Vale do Jequitinhonha, Rio São Francisco, Campos das Vertentes, Zona da Mata e Triângulo Mineiro. Maza de Palermo exalta o talento do artista mineiro em geral, mas faz uma ressalva: a dificuldade para a comercialização dessas obras.

Arte que resgata, cura e revela as Minas Gerais
 
A arte age como bálsamo, até como um bote salva-vidas. A escultora Iza Matos, de Itaobim, no Jequitinhonha, conhece bem essa faceta. Há sete anos, ela tinha uma vida normal, pacata de dona de casa. Até que foi “pega” pelas armadilhas da depressão. Para tentar amenizar o problema, agravado pela ansiedade, se jogou de corpo e alma no trabalho de cerâmica.

E o que era apenas “terapia” se transformou em arte, com cheiro de povo. “Estava com depressão, ansiedade, e comecei a trabalhar com a cerâmica. Virou minha paixão, não me imagino fazendo outra coisa”, destaca artista, de 53 anos.

Para Nely Rosa, que preside o Centro de Arte Popular Cemig, é necessário resgatar essa cultura. “É importante essa preservação, a continuidade desse trabalho”, observa.

Anatomia

Além dos trabalhos em cerâmica, a madeira tem seu lugar nessa exposição. O escultor Eduardo Lobato coloca à disposição do público “São Sebastião”.

Autodidata, Lobato, 38 anos, destaca, em seus trabalhos, a anatomia do corpo humano. “Faço nus femininos e masculinos”, conta ele, que veio de Papagaios, próximo de Sete Lagoas.

A riqueza e variedade do artesanato mineiro é impressionante. Caso dos trabalhos em cerâmica do Candeal, feitos por Maria do Socorro Leite Durães, 45 anos, e Nilda Muniz Faria, 37 anos.

Elas apresentam belos vasos em diversos tamanhos. “Desde os dez anos trabalho como artesã. Aprendi com minha tia Odília da Conceição”, relata Maria do Socorro, que veio da cidade de Cônego Marinho.

Herança

A história de Rosana Pereira Silva é parecida com a de muitos artesãos. Não fosse, porém, o fato de a moça ser neta do mestre Ulisses, de Caraí.

Na exposição, ela apresenta trabalhos, em cerâmica, com uma inusitada representação: seus bonecos, com corpos humanos, têm cabeças de bichos.

“Tive essa ideia. Achei que ficava legal e também é diferente. Não é como a de outros trabalhos”, explica.

Nesta mostra não poderia faltar o artesanato, produzido em Ouro Preto. Assim, a artesã Maria de Lourdes trouxe seus bordados. Melhor, veio à caráter. Seu vestido tinha uma estampa, bordada, com pássaros de todo o Brasil.

Ela trabalha com o marido Eduardo Espechit e tem um escritório em Ouro Preto, onde ensinam bordado às pessoas da zona rural.

Exposição “A imaginação da matéria de Minas”. Horário de funcionamento: terças, quartas e sextas, das 10h às 19h. Quintas, das 12h às 21h, sábados e domingos, das 12h às 19h.ocal: Centro de Arte Popular Cemig, rua Gonçalves Dias, 1608, Lourdes. Entrada franca.

Carlos Farias e Coral das Lavadeiras de Almenara: novo CD

O Coral das Lavadeiras de Almenara e o maestro Carlos Farias se reinventam com o show e CD “Devoção”, com canções do folclore do Vale Jequitinhonha e Mucuri, e também com a chegada de novos integrantes. É o caso da adolescente e caçulinha do grupo Mariana da Conceição Gonçalves, 17 anos, e neta de dona Isabel (Ana Isabel da Conceição), uma das mais antigas lavadeiras.

“Sempre acompanhei e, além disso, minha avó incentiva. Desde pequena tinha esse sonho, ainda mais porque estudo canto, e também dou aula de canto em Almenara. Além da minha avó, carrego essa influência forte da música”.

A jovem “lavadeira”, o restante do grupo e Farias sobem nesta quinta-feira (20) ao palco do Grande Teatro Sesc Palladium, às 21h, com entrada franca, em apresentação que vai reunir cantigas do CD e dos dois primeiros trabalhos, “Batukim Brasileiro”, de 2002, e “Água – A Música das Lavadeiras do Jequitinhonha”, de 2005.

Essa integração e renovação alcançam as mais antigas das lavadeiras, como Adélia Barbosa, 75 anos. Ela conta que começou a cantar com as outras companheiras nas beiradas do córrego São Francisco e no rio Jequitinhonha. “Depois passamos a cantar na lavanderia comunitária de Almenara, o Carlos (Farias) viu e gostou. Em 1991, a gente começou a trabalhar junto. Nunca pensei que isso fosse sair do Jequitinhonha, mas já andamos muito nesses anos”, destaca. A mais velha do grupo, dona Emília, 80 anos, não pôde vir para essa apresentação.

Piano

Neste novo trabalho e show, o maestro Carlos Farias decidiu inovar com a introdução do piano em duas faixas, e exclusivamente em “Aldeia Real”. “Em ‘Aldeia Real’ só utilizo o piano com as lavadeiras e em “Cheirou Guiné” tem o piano e percussão”, ressalta Farias. As cantigas são adaptadas do folclore.

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