Movimento musical mineiro inspira autores a escrever para crianças

Paulo Henrique Silva/Hoje em Dia
08/09/2014 às 07:36.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:06
 (Cau Gomez/)

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Você já ouviu muitas leituras sobre o universo do Clube da Esquina, movimento musical mineiro que revelou nomes como Milton Nascimento, Beto Guedes e Lô Borges, no início da década de 60. Menos uma: o fato de ser coisa de criança. Mais especificamente de meninos que gostam de passar férias na casa dos avós, no interior, e de compartilhar muitas aventuras com seus amigos.

Pelo menos é assim que o escritor e jornalista Caio Tozzi se sentiu ao apertar a tecla de seu aparelho de som. As músicas do Clube da Esquina o levaram de volta para o tempo em que se divertia no sítio do avô Sebastião, inspirando-o a botar no papel as histórias e as letras do movimento numa narrativa lúdica dirigida ao público infantojuvenil.

“O Segredo do Disco Perdido” (Panda Books), escrito em parceria com Pedro Ferrarini, resume o que Tozzi afirma ser uma das principais virtudes do Clube da Esquina, estampada não só em seus integrantes como também nas canções: o valor da amizade. O ponto de vista é de um garoto, Daniel, que investiga o desaparecimento de um LP autografado por Lô Borges.

“Sou paulista, mas passei minha infância no interior, em Águas de Lindoia, que fica na divisa com Minas Gerais. Como meu avô é mineiro de Itamogi, posso dizer que tenho muito desse sangue em minhas veias. A vida inteira ouvi as histórias de Minas e quando resolvi escutar os discos do Clube da Esquina, na faculdade, a minha sensação foi a de estar revivendo essa experiência”, registra.

Personagens reais de Santa Tereza passeiam pela obra de Caio Tozzi

O que o escritor e jornalista Caio Tozzi identifica como elementos mineiros da memória de infância transportada para a literatura é, além da importância dos amigos, os “causos” e um universo mágico de quem cresceu rodeado pelo carinho dos avôs. “A questão da infância refletida nas músicas do Clube da Esquina me tocou muito, com a figura desse menino curioso e espontâneo sempre presente, personagem mito recorrente entre os escritores mineiros”, destaca o autor de “O Segredo do Disco Perdido” (Editora Panda Books).

Tozzi sabe muito bem do que está falando. Para realizar o documentário “Ele Era um Menino Feliz – O Menino Maluquinho, 30 Anos Depois”, ele se aproximou do cartunista Ziraldo, criador do Menino Maluquinho. Ele ainda cita Fernando Sabino e Carlos Drummond de Andrade entre os escritores que também frequentaram a infância na literatura.

As referências ao Clube da Esquina surgem de diversas maneiras em “O Segredo do Disco Perdido”. Há menções, por exemplo, a situações e personagens descritos nas músicas, como o casal Paula e Bebeto (da canção homônima de Milton Nascimento) e a Velha da Chaleira (retirada de “Chaleira do Alto da Poeira”, de Tavinho Moura e Fernando Brant).

Caixeiro viajante

Outro personagem leva o nome de Vendedor de Sonhos, baseado em uma canção que conta a história de um caixeiro viajante que realiza sonhos das pessoas que encontra pelo caminho. Mas há citações que podem passar despercebidas para quem não conhece o movimento a fundo, como Dona Maricota e Lilia, mães dos garotos Borges e de Milton, respectivamente.

 

Nem ‘Manuel, O Audaz’ escapou da história

Quem também aparece é o jipe Manuel, saído de uma composição de Fernando Brant e Toninho Horta. O patriarca dos Borges, “Seu” Salomão, se transforma no proprietário do Bar da Esquina. Ele é o avô do protagonista Daniel e dono do disco que foi estranhamente furtado de seus pertences.

“Construímos uma narrativa para encaixar todos esses personagens, que resultou na busca pelo resgate de um trabalho musical muito importante. Independentemente da época, dos avanços tecnológicos, precisamos manter vivos os elementos lúdicos. E se você pensar numa música como ‘Bola de Meia, Bola de Gude’, valores como alegria e amor estão presentes”, assinala.

A turma do Clube da Esquina aprovou a ideia. O compositor Fernando Brant assina a orelha do livro. Márcio Borges chorou no primeiro contato com o conteúdo da obra. E Ronaldo Bastos se incumbiu de solicitar a autorização de todos os integrantes para a liberação dos direitos das letras, sem envolver nenhum custo para Tozzi e Ferrarini.

“Não procuramos os artistas só por questões burocráticas. Queríamos ter realmente o apadrinhamento deles. Passaram a ver não um mero livro, mas uma homenagem e uma forma de disseminar o Clube da Esquina para as novas gerações”, sublinha Tozzi, que preferiu não incluir CD com as músicas para não tornar o projeto muito caro.

Observa que a produção de CD implicaria na compra dos direitos dos fonogramas, o que poderia inviabilizar o livro. “As letras estão costuradas à narrativa, muitas vezes aparecendo na íntegra”, avisa o autor, que se valeu de 19 canções do repertório do Clube da Esquina. Entre elas estão ainda “Nos Bailes da Vida”, “Nuvem Cigana”, “Travessia” e “Canção da América”.
 

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