(Bengt Wanselius)
Apesar de o título apontar para algo mais íntimo, o documentário "Liv & Bergman – Uma História de Amor" não se limita necessariamente ao relato amoroso entre a talentosa atriz norueguesa Liv Ullmann e um dos maiores cineastas da história, o sueco Ingmar Bergman.
Ao refazer os pontos altos (e baixos) de uma relação intensa, o filme, que estreia nesta sexta-feira (22) no Belas Artes, está falando também da rica dobradinha do casal no cinema em 12 títulos, mais extensa que o convívio sob o mesmo teto. O grande tema de Bergman não foi outro que não a vida a dois.
Quando Liv lembra, com muita franqueza, do excesso de controle de Bergman ou da grande carência afetiva dela, é impossível não se lembrar de filmes como "A Hora do Lobo" (1968), "A Paixão de Ana" (1969) e "Cenas de um Casamento" (1973).
Confinamento
Ao mencionar a necessidade de Bergman em se isolar na ilha de Faro, cenário de várias produções do cineasta, sufocando Liv a ponto de proibi-la de levar amigos e familiares ao local, logo vem à mente "A Hora do Lobo", espécie de justificativa para esse confinamento.
No filme, um pintor e sua esposa vão morar numa ilha bastante afastada da sociedade, onde sua paz é abalada por um misterioso grupo que os levam a recordar de fatos desagradáveis. A mensagem contra o "intruso" foi reforçada no mesmo ano, quando lançou "Vergonha", em que soldados invadem a ilha de um casal e compartilham as atrocidades da guerra.
Nessa época, Liv já morava com Bergman, ressentida do fato de seu companheiro nunca estar presente de corpo e alma em sua vida. "Ele estava por perto", afirma a atriz ao registrar o foco do diretor em seu trabalho.
Atrofia
Os dois conviveram de 1966 até 1971. Mesmo após o fim traumático, Liv não deixou de trabalhar com o ex. Dois anos depois participou de "Cenas de um Casamento", que aborda justamente a atrofia das emoções numa relação e deu a Bergman o Oscar de melhor produção estrangeira.
Filme é baseado em depoimentos e cartas
O documentário de Dheeraj Akolkar, carrega muitas semelhanças com outra produção, italiana, sobre relação de diretor e sua atriz. Na verdade, suas atrizes.
"A Guerra dos Vulcões" acompanha o triângulo formado por Roberto Rossellini com Anna Magnani e Ingrid Bergman no momento em que elas filmavam em duas ilhas próximas.
Enquanto esse se atém à polêmica (a disputa entre as atrizes, com clara preferência para Magnani), Akolkar tenta alcançar a dimensão intensa e contraditória com que Ingmar revestiu suas histórias.
Calcado nos depoimentos de Liv (e em cartas do diretor), o filme evidencia o deslumbramento da atriz por um homem inteligente e amigo com quem não podia conviver como casal.
O fracasso da relação ao contrário de diminuir o trabalho do cineasta, engrandece ainda mais uma trajetória marcada pela complexidade do ser humano.