O estilo musical dos morros cariocas conquista a elite belo-horizontina

Elemara Duarte * - Hoje em Dia
20/04/2015 às 07:35.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:42
 (Arquivo Pessoal)

(Arquivo Pessoal)

O funk não é som apenas da galera da “perifa”. Ele seduz os baladeiros da zona sul e invade festas regadas a champanhe e com ingressos caros. O ritmo que tomou formato na periferia tem entrada livre no baile da aposentadoria da top model Gisele Bündchen, que na última semana dançou o hit “Eu Quero Tu”, em São Paulo. Já no Baile da Favorita, no Rio de Janeiro, ele faz a elite subir o morro e pagar até R$ 500 em um ingresso. E hoje, este fenômeno cultural se repete, mas na região nobre de Nova Lima, quando o funk vai “dominar geral” uma casa tipicamente sertaneja com o show de MC Leozinho.
Além dos sucessos do funk melody que vem cavando em 23 anos de carreira, Leozinho deve interpretar em BH a música “Patricinha da Favela”. A composição dele, que já tem clipe postado na internet, fala de uma jovem rica que sobe o morro para curtir baile funk.
  “No Rio de Janeiro isso já é normal. A menina mora na zona sul, nos prédios do Leblon e de Ipanema, e vai curtir baile funk no Cantagalo, na Rocinha, no Santa Marta”, conta Leozinho, hoje com 37 anos. Mas chega com chofer particular como mostra o clipe? “Elas chegam com um monte de amigas”.
No Rio de Janeiro, um dos eventos mais disputados nesta adoção do funk pela elite é o “Baile da Favorita”. Inclusive, o clipe de Leozinho foi feito em homenagem à criadora do baile, a promoter Carol Sampaio.
“Fiz pensando nela. A Favorita é bailão mesmo! Vai a galera do melody. Ela é minha contratante neste baile. Ela ficou amarradona”. Mas no clipe, quem faz o papel da moça rica, diz o MC, é uma bailarina do Faustão.
O músico que nasceu no “Morro do Caranguejo”, em Niterói (RJ) diz que a “pegação” rola solta, mesmo que entre gente da periferia e gente do asfalto. “É a troca de olhar e pam! Pode até ter preconceito, mas depois que toma uma cerveja e começa a dançar naquele charme do funk...”. Aí, leitor amigo, não há conta alta no banco que segure.   Leozinho diz que o baile da elite em reduto da comunidade tem gente de todo lado, mas que a maioria é a “playboyzada” e que todo mundo dança junto, mesmo que também haja os camarotes. “O baile da comunidade é de graça”, observa o MC, que prepara mais um disco de inéditas, para ser lançado no final deste ano. “Maior do Brasil” em BH   O sucesso da Favorita é tamanho que a organização já faz turnês pelo país. Belo Horizonte já foi uma destas paradas do baile e pode recebê-lo mais uma vez neste ano. “Estamos em negociação e, já, já, estaremos por aí”, avisa Carol, ao Hoje em Dia.   E a promoter explica: “O público que frequenta o evento é aquele que dança até o chão, sem se preocupar em ser vulgar, fazendo assim nossa festa ficar incrível. Foi este público que fez nosso baile se tornar o maior do Brasil”.   Show MC Leozinho, Roberto Maia e DJ Vitor Sobrinho, hoje, às 22h, na Wood’s (Alameda da Serra, 154, Nova Lima). Ingressos de R$ 30 a R$ 150 (parte bonificado em bebidas). Classificação: 18 anos. www.woodsbar.com.br   Gênero já divide preferência com o sertanejo   Elas nem subiram o morro, mas já dançam “até o chão”. As baladeiras de zona Sul, em BH, também estão descobrindo o funk, mesmo que apenas nas casas de shows e boates da capital mineira. Ela já morou em Paris, fala três idiomas, é designer de moda, empresária e blogueira e mora em uma das regiões que guarda um dos metros quadrados mais caros da capital. Mas, aos 21 anos, Lígia Lapertosa, admite que a paixão dela é o “funk” e o sertanejo.   “No meu aniversário de 21 anos, contratei um DJ só para tocar funk e uma dupla sertaneja”, lembra a empresária que já foi ao Baile da Favorita, na Rocinha, no Rio de Janeiro, com uma amiga também da região “nobre” de lá. Lígia criou a marca de roupas que ela fabrica juntamente com uma equipe de modelistas e costureiras - a “Tyyli”, que quer dizer “estilo”, em finlandês.

Porque funk é MPB   “Amo música brasileira. O problema é que o brasileiro tem mania de ignorar a própria cultura. O que essas músicas novas passam é o que está acontecendo ao nosso redor. A gente passa a ver o outro lado da coisa. Mas traz alegria”, diz, sobre a distância pode existir entre as realidades da zona sul e zona norte.
Lígia diz que já foi em festa de debutante, em BH, em que no polêmico e “proibidão” MC Catra tocou. “É legal, mas o meu tipo de funk é o tipo mais fofinho, que conta uma história”, conta a moça.
“Quando toca funk a festa para, e todo mundo vai para o meio da pista dançar”. Lígia diz que os amigos dela também gostam de funk. E que nem o namorado escapou de gostar também. “Fiz ele gostar. Deixei ele ouvindo várias vezes. Quando ele entrava no carro, eu mudava o som. Mas de vez em quando, coloco os funks mais pesados. Mas é só para encher a paciência dele”, diverte-se.

No MP3 e no show   Moradora da Pampulha, a estudante Júlia Góes, 18 anos, acaba de chegar de um intercâmbio nos Estados Unidos, e também assume: “Pelo menos 60% do espaço do meu MP3 tem funk”.
A jovem diz que vai apenas aos shows dos MCs que gosta, como é o caso de Naldo, do próprio MC Leozinho, e de Dennis DJ, que começa a despontar nas paradas. E as amigas? “Praticamente todas gostam”. E onde elas moram? “Belvedere, Sion e Buritis”, elenca.
Júlia observa que o poder do funk está tão disseminado na região sul de Belo Horizonte, que há boates que dedicam um dia específico na programação à ele.
A estudante diz que também gosta – mas não tanto – de pagode, sertanejo e música eletrônica. E nisso, ela entra em outra futura temática de funk do MC Leozinho, sobre as garotas “ecléticas”, que gostam de todos os ritmos. Ainda no forno.   Boate de luxo tem dia exclusivo para tocar o ritmo e esgota lotação   O sócio-proprietário do Royal Club BH, André Munaier não tem do que reclamar do sucesso do “Baile Real”, organizado na casa que abriu em janeiro deste ano. “Está dentro das expectativas”, admite, soltando um sorriso discreto. A Royal é adepta da proposta “open format”, com diversos ritmos musicais, com projetos voltados para o sertanejo, a house music e, claro, o funk.   No local, que fica na rodovia MG-030, 8.625, em Nova Lima, toda sexta-feira a programação conta com o baile, às 21h. “Trazemos atrações do Rio: Tati Quebra Barraco, Naldo, Bonde do Tigrão. Chega esgotar a lotação”, informa. Consumo de camarote em baile funk da zona sul pode chegar a R$ 3.500   A faixa etária e classe social dos clientes da Royal Club BH é de jovens de 18 a 24 anos, a maioria moradores da zona Sul, filhos de empresários. As entradas para a pista variam de R$ 35 a R$ 120. Mas o forte do Royal, diz o sócio-proprietário André Munaier, são os seis “lounges” ou camarotes. Para ocupar cada um é preciso desembolsar a partir de R$ 2.200, para receber 15 convidados, todos identificados com pulseirinhas.
Este valor dá direito a R$ 2 mil em bebidas. “Mas depois do consumo, o valor pode chegar a R$ 3.500”, observa o sócio. Cada lounge oferece uma visão melhor do palco e conta com um garçom exclusivo atendendo ao grupo de amigos.
Normalmente, são grupos de cinco amigos que contratam os camarotes. “Eles convidam meninas na pista ou trazem amigos e amigas de fora. Afinal, o funk é um ritmo muito instigante para um clima de azaração”, frisa Munaier.     Na área nobre do Vale do Sereno, na mesma região de Nova Lima, a entrada para uma noite em um baile funk pode chegar a R$ 200 por pessoa que queira “ir de camarote”. Este é o caso da Caribbean Disco Club (rua das Acácias, 549), que no próximo dia 24 de abril traz os MCs Delano e Pocahontas e a dupla de sertanejo universitário João Lucas & Diogo para um destes eventos.   “Fica lotado. No baile funk consomem uísque e vodca”, diz um dos promoters da Caribbean, Thiago Marques. Champangne e espumante também? “Os dois”, resume ele.   (*) Colaborou Alex Bessas

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