Paulo Sacramento leva para a tela os protestos de rua como pano de fundo

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
20/10/2014 às 08:17.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:41

(CALIFÓRNIA)

Mais de um ano após disputar o Festival de Brasília, “Riocorrente” chega aos cinemas de Belo Horizonte, simultaneamente com seu lançamento em DVD pela Califórnia.

O atraso foi cruel com o filme, que, há um ano, estava plenamente sintonizado com os movimentos que tomaram as ruas do país, ainda que sua feitura nada tenha a ver com os protestos. “O filme margeia esse tema, sim, de uma maneira mais poética. Outros trabalhos atacaram diretamente esse assunto”, observa o diretor Paulo Sacramento, estreante na ficção.

UNIVERSAL

A trama acompanha triângulo amoroso que dialoga com uma São Paulo caótica, entre o medo e a segregação e a violência e a realidade, estampados nos amantes da protagonista.

Sacramento concorda que “Riocorrente” se comunica melhor com os paulistanos, mas assinala que ali estão refletidos também os problemas de qualquer metrópole brasileira. “Tem a cara de São Paulo, com certeza. Mas isso está longe de ser um demérito. Os melhores filmes são aqueles que têm uma cor local e um sentimento universal”, afirma.

Sublinha que a identificação se dá, paulistano ou não, por cidades paralisadas por sua grandeza e um espaço individual muito restrito. “Tudo tem uma dimensão opressiva”, analisa.

LÓGICA DO RIO

Sacramento fugiu dos cartões-postais da capital econômica do país, preferindo os lugares que a população renega, como o Tietê, “um rio horroroso e morto que passa no meio da cidade”.

O Tietê é muito simbólico dos problemas de São Paulo e das intenções do filme. “É importante sujar um pouco as mãos. A lógica do rio é interessante porque tudo escoa para algum lugar”, registra.

Os personagens estão psicologicamente doentes como reflexo do estado da cidade. “O que tento capturar é o fim de um ciclo. Não se trata de análises sociais e sim de algo mais sensorial”.

ABSTRATO

Sacramente comenta que buscou trabalhar mais com perguntas do que com respostas. Opção que justifica, segundo ele, o uso de imagens abstratas com animais como ratos e cachorros.

“Existe uma liberdade que o cinema está perdendo, de criar relações que não sejam processadas pelo lado racional. A obra de arte não precisa ser utilitária. Discurso moral não me interessa”, defende.

Esse flerte com as artes plásticas resulta em poucos diálogos. As poucas vozes que se ouvem se transformam em brigas. “O verbo não entra para explicar. É mais um elemento desagregador”, destaca.

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